Correio braziliense, n. 19426, 02/08/2016. Política, p. 3

Pressão pelo caso Cunha

Líderes partidários cobram a votação em plenário, no menor prazo possível, do processo de cassação do ex-presidente da Câmara. Rodrigo Maia diz que a ação será votada em um dia de "quórum alto"

Por: João Valadares e Paulode Tarso Lyra

 

Na volta do recesso parlamentar, líderes partidários pressionaram o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), para que o processo de cassação do deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) seja votado o mais rápido possível em plenário. Integrantes da nova oposição sugeriram obstrução dos trabalhos até que o processo contra o peemedebista fosse concluído. Para isso, Maia precisa fazer a leitura do relatório que pede a perda do mandato de Cunha, acusado de mentir à CPI da Petrobras por ter negado possuir contas secretas no exterior.

Nos bastidores, o Palácio do Planalto atua para que a votação do caso Cunha só ocorra após definição do processo de impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff, no Senado. O receio palaciano é de que, cassado e abandonado, o peemedebista pode se voltar contra o presidente interino, Michel Temer, e “melar” o impedimento da petista.

Ontem, mesmo após a pressão durante reunião de líderes, Maia não realizou a leitura do relatório e, dessa maneira, não marcou uma data para votar a cassação. De maneira genérica, disse apenas que vai trabalhar para que o pedido de cassação do ex-presidente da Casa seja votado em plenário durante o mês de agosto, em uma semana de quórum alto.

“O que disse é que a segunda semana poderia ser uma com quórum mais alto, mas já tem deputado afirmando que é a semana do registro das candidaturas”, alegou. “Então, vamos aguardar, para não dar uma data errada, e não criar nenhum tipo de frustração de nenhum dos lados”, emendou.

À noite, Rodrigo Maia avisou que a prioridade é votar o projeto de lei da renegociação das dívidas dos estados. “Hoje (ontem) e amanhã (hoje), só vou tratar do (projeto) 257. Eu acho que é importante para o Brasil votar essa matéria. Na quarta-feira, me comprometo a tratar da questão do Eduardo Cunha. Vou tratar do Eduardo na hora certa”, disse.

 

Obstrução

“Eu defendo que não votemos nada em plenário enquanto o presidente, Rodrigo Maia, não colocar em votação o processo de cassação do deputado Eduardo Cunha. Acho que PMDB, PSDB e DEM deveriam agir da mesma forma”, disse o vice-líder da minoria, Sílvio Costa.

No momento em que Rodrigo Maia abriu a sessão, Sílvio Costa pediu a palavra e cobrou a leitura. “O senhor precisa ler agora o relatório. O senhor não é do time do Eduardo Cunha. O senhor é sério. O senhor precisa ler para cassarmos na próxima quarta-feira”, ressaltou Costa.

Maia, visivelmente constrangido, não respondeu. O deputado atacou novamente. “O senhor não vai responder?”, indagou. “Isso não é questão de ordem. Vou tratar esse assunto depois que resolvermos o Projeto de Lei nº 257”. Ao ser avisado que não poderia votar porque a oposição obstruiria, Maia afirmou que “era um direito dos deputados”.

O deputado Henrique Fontana (PT-RS) seguiu na mesma linha de Costa. “Nós vamos manter obstrução total aqui no plenário enquanto não for votada a cassação do deputado Eduardo Cunha”, declarou.

O líder do PSol, Ivan Valente (SP), criticou a postura do novo presidente e insinuou uma manobra para protelar a cassação. “Ele não encaminhou a proposta que havia sido sugerida que era marcar o dia da votação”, discursou na tribuna. “Nós do PSol, e depois outros líderes do PT, Rede e PPS, em um primeiro momento, cobramos do presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), que lesse nesta semana o relatório aprovado pelo Conselho de Ética aprovando o pedido de cassação de Eduardo Cunha. Depois, outros líderes, do PSDB, DEM, PDT, e outros, concordaram conosco. Os integrantes do Centrão ficaram calados, com cara de paisagem”, disse.

Ele afirmou que o presidente da Câmara declarou, na reunião de líderes, apenas que estava analisando os procedimentos, os casos anteriores e que poderia fazer a leitura nesta quarta-feira (amanhã) ou na próxima terça-feira. “Queremos que seja lido esta semana e vamos cobrar isso em plenário”, declarou Valente.

O líder da Rede, Alessandro Molon (RJ), defendeu que Maia precisa aproveitar para votar a cassação de Cunha na próxima semana, que é uma janela entre o término das convenções partidárias e o início efetivo da campanha eleitoral. “A Câmara não pode deixar esta crise continuando viva. Quem não aparecer em Brasília para votar que se explique depois perante o eleitorado”, disse.

 

Propina

Após negar ter contas no exterior, os investigadores do Ministério Público localizaram ao menos R$ 32 milhões em depósitos em quatro bancos na Suíça em nome do ex-presidente da Câmara. Os valores foram creditados entre 2007 e abril de 2014.

 

Vizinho de ministros

Réu no Supremo Tribunal Federal em duas ações da Lava-Jato, o ex-presidente da Câmara e deputado afastado, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), terá ministros do STF como vizinhos em sua nova morada em Brasília. O peemedebista entregou as chaves da residência oficial da presidência da Câmara ontem, 25 dias após renunciar ao comando da Casa. Segundo o setor de habitação da Câmara, o parlamentar já se mudou para um apartamento funcional no fim da Asa Sul, em uma quadra onde moram alguns ministros do Supremo. O imóvel é o único apartamento funcional da Câmara na quadra. Conforme o setor de Habitação da Casa, o local estava desocupado há cerca de um ano. O apartamento é antigo e passou por pequenas reformas para receber Cunha: foi pintado, teve os tacos do piso consertados e o tampo de uma mesa, trocado.

 

O processo

Entenda a ação contra Eduardo Cunha

» Inicialmente, o Conselho de Ética acatou a representação formulada pela Rede e o caso começou a tramitar no colegiado

» Depois, relatório preliminar pela continuidade do processo foi aprovado no Conselho de Ética

» Relator concluiu seu parecer recomendando a cassação do deputado por ele ter mentido à CPI da Petrobras, quando negou ter contas na Suíça

» Após manobras protelatórias, o relatório foi aprovado finalmente no Conselho de Ética

» A defesa de Cunha recorreu à Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, mas acabou derrotada

» Agora, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia, precisa fazer a leitura em plenário do relatório aprovado no Conselho de Ética

» Duas sessões depois, o processo que pede a cassação de Eduardo Cunha pode ser votado. A votação eletrônica é aberta

» Para cassar o mandato de Eduardo Cunha, são necessários 257 votos dos 513