Correio braziliense, n. 19427, 03/08/2016. Política, p. 3

As contas esvaziadas de Gim

Em resposta a pedido de habeas corpus, juiz Sérgio Moro diz que soltura de ex-senador aumenta risco de ele "ocultar seu patrimônio da ação da Justiça e de prosseguir em atos de lavagem de dinheiro"

Por: Eduardo Militão

 

Detido desde abril na carceragem da Polícia Federal em Curitiba, o ex-senador Gim Argello tirou todo o dinheiro que tinha no banco e em suas empresas antes de ter a prisão preventiva decretada pela Justiça. A atuação do ex-parlamentar do Distrito Federal é levantada pelo juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba, Sérgio Moro, em resposta a um pedido de habeas corpus apresentado pela defesa de Gim, em tramitação no Supremo Tribunal Federal.

Em ofício enviado ao ministro-relator da Lava-Jato no Supremo Tribunal Federal (STF), Teori Zavascki, Moro sinaliza que Gim “esvaziou suas contas-correntes e de suas empresas antes da efetivação da medida” da prisão e do confisco de bens. Como mostrou o Correio em 15 de abril, só R$ 46 mil foram confiscados das contas do ex-senador, apesar de a ordem ser de R$ 5 milhões. Ele é acusado de pedir R$ 35 milhões de empreiteiras a fim de blindá-las nas CPIs da Petrobras das quais participou em 2014, embora só tenha conseguido arrecadar

R$ 7,2 milhões.

“O bloqueio de ativos decretado por este juízo a pedido do MPF para recuperá-lo teve resultados pífios”, avaliou Moro, no ofício enviado a Teori, em que defendeu a manutenção da prisão do ex-senador. “Remanesce o risco para recuperação do produto do crime, tendo o paciente, em liberdade, melhores condições de ocultar seu patrimônio da ação da Justiça e de prosseguir em atos de lavagem de dinheiro.”

Interlocutores de Gim Argello ouvidos pela reportagem ontem consideraram a avaliação de Moro descabida por não ter nenhuma base em documentos. Segundo eles, há mais de um ano, o saldo da conta do ex-senador permanece o mesmo. Ou seja, não haveria nenhuma possibilidade de terem havido saques com a intenção de se prevenir um confisco futuro ou uma prisão.

 

Histórico criminal

O juiz reafirmou que, diante da “conduta e histórico criminal” de Gim, a detenção era necessária para “prevenir reiteração da prática de crimes contra a administração pública em um contexto de corrupção sistêmica”.

Gim é acusado de corrupção, lavagem e pertinência à organização criminosa. A ação penal está em fase de instrução, com o depoimento de testemunhas. O advogado, Marcelo Bessa, tem negado todas as acusações. Ele alega que Gim sequer teria poderes para, sozinho, proteger qualquer pessoa nas CPIs da Petrobras das quais participou em 2014.

Na resposta ao Supremo, Moro lembrou que outros políticos sem foro privilegiado continuam encarcerados, inclusive por decisões do STF e do Superior Tribunal de Justiça. “Observo que, no âmbito da assim denominada Operação Lava-Jato, outros agentes políticos, mesmo já sem mandato parlamentar, como André Luis Vargas Ilário, Pedro da Silva Correa de Oliveira Andrade Neto e João Luiz Correia Argolo dos Santos, tiveram a prisão cautelar decretada por este juízo, a pedido do Ministério Público Federal, tendo a medida sido mantida por esta egrégia corte de apelações federal, bem como, em julgamentos unânimes, pelo egrégio Superior Tribunal de Justiça”, destacou Moro.

Marcelo Bessa não quis comentar o ofício de Moro. Ele ingressou com habeas corpus pela soltura do ex-senador no Supremo e no STJ. A expectativa é que a decisão de Teori sobre o pedido de soltura só seja tomada a partir de setembro. O recurso ao STJ deve ser analisado este mês.

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Mais dois são presos

 

A 33ª fase da Operação Lava-Jato, apelidada de “Resta Um”, mirou ontem a empreiteira Queiroz Galvão, dona de R$ 20,4 bilhões em contratos com a Petrobras. Foram presos os ex-executivos Idelfonso Colares e Othon Zanoide. O diretor financeiro do consórcio Quipe, Marcos Pereira Reis, não foi localizado pelos policiais, pois estava no exterior. A investigação aprofunda duas frentes de apuração. Numa, levanta provas sobre o pagamento de R$ 10 milhões para o PSDB e para o deputado Eduardo da Fonte (PP-PE) em troca do “enterro” da CPI da Petrobras de 2009. Esse fato já rendeu uma denúncia criminal contra o parlamentar no Supremo Tribunal Federal, em que uma das provas é um vídeo de reunião dos empreiteiros com o então senador Sérgio Guerra (PSDB-PE), ex-presidente da legenda dos tucanos e já falecido.

A outra frente é o pagamento “sistemático” de propinas pela construtora a diversos dirigentes e funcionários da Petrobras, parte delas canalizada para o PP, por meio da Diretoria de Abastecimento, e parte para o PT, por meio da Diretoria de Engenharia.

O procurador Carlos Fernando dos Santos Lima disse que a atuação criminosa da empresa é emblemática. “A Queiroz tem uma peculiaridade: representa todos os pecados e todas as espécies de crimes que verificamos na Operação Lava-Jato”, avaliou. A assessoria da empreiteira não comentou as acusações, limitando-se a confirmar a ação e alegar que “a empresa está cooperando com as autoridades e franqueando acesso às informações solicitadas”. (EM)