Correio braziliense, n. 19430, 06/08/2016. Política, p. 2

Vaias para um Temer discreto na abertura

Em uma maracanã lotado,Cerimônia inaugural das olimpíadas é marcada pelo pedido de intolerância no mundo e respeito pela diversidade

Por: Paulo de Tarso Lyra

 

Ao declarar abertos os Jogos Olímpicos Rio 2016, com um discurso de exatos sete segundos, o presidente em exercício, Michel Temer, foi vaiado pelo público presente no Maracanã, embora alguns aplausos também tenham sido ouvidos. Logo no início da cerimônia, Temer acabou poupado de outro constrangimento: ao contrário do previsto no protocolo, o nome dele não foi anunciado após a citação ao presidente do Comitê Olímpico Brasileiro, Carlos Arthur Nuzman, e do presidente do Comitê Olímpico Internacional, Thomas Bach.

Na Olimpíada “a la Brasil”, a cerimônia de abertura dos Jogos do Rio de Janeiro, que durou três horas e 55 minutos, pediu tolerância no mundo e o respeito pela diversidade. A abertura do evento esportivo foi transmitida para 3 bilhões de pessoas e serviu para mandar ao mundo uma mensagem política. Em seu discurso, Bach citou o presidente do Comitê Rio-2016, Carlos Arthur Nuzman. Mas fez apenas uma referência geral às autoridades brasileiras, sem citar Temer.

“Estamos vivendo em um mundo de crises, de falta de confiança e incerteza”, disse o alemão. A resposta, segundo ele, poderia ser o fato de que 10 mil atletas de todo o mundo estão hoje vivendo “em paz na Vila Olímpica, compartilhando a mesma refeição e emoção”. “Nesse mundo, há uma lei universal para todos. Nesse mundo olímpico, somos todos iguais. Nesse mundo olímpico, vemos o valor da humanidade compartilhada, e que somos mais fortes quando estamos unidos que quando estamos divididos”, insistiu.

 

 

Protestos
Antes da cerimônia de abertura, dois protestos na praia de Copacabana — contra o presidente em exercício, Michel Temer e contra as Olimpíadas — forçaram uma mudança na rota da tocha olímpica, que deveria seguir a orla e acabou usando ruas internas do bairro para seguir seu caminho. Com faixas em português e inglês, cerca de 20 mil manifestantes, segundo os organizadores, pediram um plebiscito sobre a manutenção ou não do governo da presidente afastada, Dilma Rousseff.

Por volta das 12h30, manifestantes fecharam a pista da orla de Copacabana ao lado dos prédios após a passagem de uma comitiva, quando os ativistas intensificaram os gritos de “Fora Temer”. Taxistas, impedidos de seguir, começaram a buzinar e houve princípio de tumulto. O protesto foi convocado por movimentos sociais, sindicatos e partidos reunidos na Frente Brasil Popular, Frente Povo Sem Medo e Frente de Esquerda Socialista.

A 3km do Maracanã, onde, à noite, foi realizada a cerimônia de abertura dos Jogos Olímpicos, manifestantes protestaram contra o evento nesta sexta. A concentração começou às 14h, na Praça Saens Pena, e a dispersão foi às 18h, na Praça Afonso Pena, dois quilômetros e meio depois. Os manifestantes seguiram pela Rua Conde de Bonfim. No fim do ato houve um tumulto, e a polícia usou spray de pimenta para dispersar os manifestantes. Nem a PM nem os organizadores divulgaram estimativa de público. Pelas redes sociais, a presidente afastada, Dilma Rousseff, afirmou: “Fico triste de não assistir à festa ‘ao vivo e a cores’. Mas estarei acompanhando, torcendo pelo Brasil”.

“Estamos vivendo em um mundo de crises, de falta de confiança e incerteza”
Thomas Bach, presidente do Comitê Olímpico Internacional

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Segurança reforçada

 

Os 2,2 mil caçadores da face padrão do atentado — rosto pálido, atitude tensa, traje em desacordo com o clima, olhar fixo, gestos furtivos — ocuparam acessos, arquibancadas, terminais de transporte coletivo, zonas de estacionamento e até áreas onde estão os bebedouros no estádio do Maracanã, no Rio; tudo isso muito antes da chegada do público, a partir das 16h30, para a cerimônia de abertura das Olimpíadas do Rio.


De manhã, militares e agentes civis treinados para a missão ao longo de 100 dias já faziam as primeiras inspeções. As mesmas que outras equipes haviam realizado à noite e durante a madrugada. No total estimado, 3 mil homens e mulheres trabalharam “de várias formas” só nesse procedimento, de acordo com um oficial ligado à Secretaria Extraordinária dos Grandes Eventos (Sesge). Estavam lá infiltrados em meio à multidão e também nos pontos onde havia sensores eletrônicos de identificação facial, capazes de fornecer em segundos, com base em pontos de referência anatômica, identidades de suspeitos.

Um grupo específico, composto por pessoal local e agentes estrangeiros, ficou com a tarefa de cobrir os chefes de Estado e de governo. O secretário de Estado dos Estados Unidos, John Kerry; o presidente da França, François Hollande; e o presidente em exercício do Brasil, Michel Temer, tinham plano especial — incluindo diferentes rotas de fuga, uma delas por via aérea, com helicópteros militares.

O time formou uma rede, visualizada apenas na tela dos computadores das reservadas salas de coordenação, em que cabia a cada indivíduo uma espécie de quadrado de observação. O sistema previa esse contato direto, facilitando uma eventual ação de contenção física e, a distâncias maiores, em posições não reveladas, contava com os olhos de duplas de atiradores de elite. Os fuzis podem atingir alvos a 600 metros.

O esquema adotado, com ajuda de serviços de inteligência de diversos governos, como os dos Estados Unidos, França, Grã-Bretanha e Israel, contemplava duas vertentes: reprimir um atentado — que, se houvesse, seria obra de um “lobo solitário”, o extremista independente, difícil de ser detectado — e conter manifestantes que ultrapassassem os limites da segurança.