Correio braziliense, n. 19429, 05/08/2016. Política, p. 2

A duas votações do fim do impeachment

Com a aprovação do relatório na comissão especial do impeachment, senadores vão decidir agora se a presidente afastada, Dilma Rousseff, será julgada de forma definitiva pelo plenário no fim do mês

Por: João Valadares

 

Em uma sessão marcada pelo embate entre governistas e oposicionistas, integrantes da comissão especial do impeachment aprovaram, por 14 votos favoráveis e cinco contrários, o relatório do senador Antonio Anastasia (PSDB-MG). O documento recomenda que a presidente afastada, Dilma Rousseff, seja levada a julgamento. O presidente do colegiado, Raimundo Lira (PMDB-PB), só votaria em caso de empate. A sessão durou aproximadamente três horas, e 22 senadores discursaram. O senador Wellington Fagundes (PR-MT), por motivos pessoais, foi o único titular que não compareceu.

Agora, na próxima terça-feira, o mesmo relatório será submetido à votação em plenário. Para ser aprovado é necessário maioria simples, o que significa metade dos senadores presentes mais um. A sessão será comandada pelo presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, que ontem esteve no Senado para definir o rito com o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL).

Em caso de o parecer ser aprovado, os senadores vão votar, com data ainda em aberto, o afastamento definitivo da petista. O mais provável é que a sessão de julgamento final tenha início em 25 ou 26 de agosto e se estenda por até cinco dias. Neste caso, para afastar a presidente de maneira definitiva, são necessários 54 votos. A data, no entanto, só será confirmada por Lewandowski após o término da sessão da próxima terça-feira.

Ontem, durante a votação do relatório, Anastasia disse que estava com “a sensação de dever cumprido.” Ele afirmou que há provas robustas da autoria e da materialidade dos crimes de responsabilidade cometidos por Dilma. Senadores defensores da presidente afastada disseram que o relatório era uma “fraude”. O presidente do colegiado, Raimundo Lira, ordenou que o termo “fraude” fosse retirado das notas taquigráficas, o que gerou protesto entre os oposicionistas.

“Acredito na verdade. Não há nada contra a minha pessoa. Reitero o que disse ontem pela natureza técnica e jurídica do nosso relatório”, pontuou Anastasia. Primeiro senador a discursar, Ricardo Ferraço (PSDB-ES) afirmou que Dilma se valeu de farsas para governar. “Ela não atentou apenas contra as leis fiscais e orçamentárias, atentou contra a probidade administrativa, se valendo do dolo, da farsa, da fraude para governar. Permitiu que estatais, bancos, fossem arrombados pra financiar projeto de poder”, declarou. Em seguida, a senadora Ana Amélia (PP-RS) reconheceu que o processo de impedimento é “doloroso” ao país, mas disse que “ninguém está acima da lei” ao cometer ilegalidades e, por isso, Dilma deve ser afastada.

O líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE), bateu na tecla de que o Brasil está vivenciando um golpe. O político ressaltou que o relatório não prova que a presidente Dilma tenha cometido crimes de responsabilidade. Costa disse ainda que a edição dos decretos de créditos suplementares não justifica o impeachment de Dilma e qualificou a eventual decisão do Senado de afastar definitivamente a presidente como uma “pedalada constitucional”.

Último a falar, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ) ressaltou que a história vai tratar de absolver a presidente Dilma. “Quem votar pelo impeachment vai ficar marcado como golpista, como aqueles que ficaram marcados por apoiar a ditadura militar. A presidente Dilma Rousseff vai ser absolvida pela história. Isso é um golpe de classe, comandado pelas elites do país. Apostaram numa figura menor como Michel Temer. Esse governo não vai se sustentar. Eles estão fazendo manobras. Eduardo Cunha cassado e preso, esse governo não aguenta um dia”, disse.

 

“Não sou golpista”

O senador Cristovam Buarque (PPS-DF), que votou pela admissibilidade do impeachment, no entanto, não abre o voto agora, mas evidenciou que vai se posicionar pelo afastamento da petista. “Não sou golpista, como o Senado não é um quartel. Agora, não sou covarde, com medo desse nome, para decidir meu voto por um lado que não traga esse nome. Apesar de tudo, o que a gente tem que fazer aqui é votar pelo país”, declarou.

O senador disse que votaria pelo Brasil, dando a entender que se posicionaria contra a presidente Dilma. “Vou votar pelo Brasil, independentemente das consequências, das consequências eleitorais, de perder voto; sentimentais, de perder amigos; de prestígio internacional, que sei que vou perder muito por essa intriga e essa narrativa.”

Cristovam salientou que, nas últimas semanas, esteve perto de sofrer violência física. O líder do PT no Senado, Humberto Costa, logo em seguida, fustigou o senador do Distrito Federal para ele revelar claramente que era favorável ao impeachment. “Vai chegar a hora de dizer”, respondeu Cristovam.

 

A próxima sessão

Entenda como será a análise da pronúncia do impeachment

 

A sessão será aberta às 9h pelo presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL). Em seguida, ele passará o comando dos trabalhos ao presidente do STF, Ricardo Lewandowski

Pelo rito estabelecido, a sessão terá uma hora de intervalo a cada quatro horas

Cada senador terá, no máximo, cinco minutos para formular questões de ordem. O mesmo tempo será concedido a senadores que queiram se opor a questionamentos levantados por colegas. Não haverá recurso depois que Lewandowski decidir sobre as questões de ordem

Superada esta fase, o relator do processo, senador Antonio Anastasia, terá 30 minutos para apresentar o teor do relatório ao plenário

De acordo com o rito, após a apresentação, cada um dos 81 senadores poderá utilizar até 10 minutos para falar na tribuna

Após a fase de debates, os autores da denúncia contra Dilma podem falar 30 minutos

Em seguida, é a vez da defesa apresentar os argumentos também por 30 minutos

Antes de o processo de votação ser iniciado, dois senadores favoráveis ao julgamento de Dilma e dois contrários terão direito a cinco minutos cada um para encaminhar a votação

 

Frases

“Ela (Dilma) não atentou apenas contra as leis fiscais e orçamentárias, atentou contra a probidade administrativa, se valendo do dolo, da farsa, da fraude para governar. Permitiu que estatais, bancos, fossem arrombados pra financiar projeto de poder”

Ricardo Ferraço (PSDB-ES), senador

 

“Acredito na verdade. Não há nada contra a minha pessoa. Reitero o que disse ontem pela natureza técnica e jurídica do nosso relatório”

Antonio Anastasia (PSDB-MG), senador e relator da comissão especial do impeachment