Correio braziliense, n. 19410, 17/07/2016. Política, p. 4

Sistema partidário à beira do colapso

Para especialistas, a solução para a crise política está atrelada a medidas para diminuir a proliferação de siglas

Por: Julia Chaib

 

O excesso de fragmentação partidária foi um dos motivos que levaram à crise política no país e culminaram no afastamento da presidente Dilma Rousseff. Essa é uma das conclusões a que chegou o criador do termo “presidencialismo de coalização”, o cientista político Sergio Abranches. Além dele, outros especialistas concordam que a heterogeneidade nas alianças não é sustentável para o governo e que a crise de representatividade da população, observada nas manifestações de rua, é um fenômeno global. Embora apontem problemas no sistema, os especialistas discordam, porém, do momento certo para que ocorra uma reforma política e se ela é necessária.

O modelo de presidencialismo adotado no Brasil e sintetizado na expressão criada por Abranches busca justamente representar o sistema eleitoral brasileiro, de um presidencialismo que se baseia em alianças, tanto para a eleição quanto para governar.  “O fato de ser presidencialismo de coalizão não faz a crise ficar mais grave. Tem alguns problemas com o presidencialismo brasileiro que apareceram mais recentemente, sobretudo o excesso de fragmentação partidária. O sistema ficou hiperfragmentado”, avalia o cientista político.

Abranches explica que o Brasil tem vocação para ter muitos partidos e que a fragmentação era esperada, porque essa é, inclusive, uma forma de o sistema ser representativo e acomodar as diferenças regionais e sociais. “Agora, com 35 partidos disputando eleição, 25 com representação na Câmara e 13 com poder de veto, é impossível criar uma situação de manejar. Com a hiperfragmentação, a coalização fica muito grande e heterogênea. E assim, é muito mais difícil de manter a estabilidade governamental e política”, detalha. No caso específico da presidente Dilma Rousseff, estão também a crise econômica e os escândalos de corrupção, que complicaram ainda mais a situação.

 

Coincidência de eleições

A hiperfragmentação fica mais explícita no trabalho apresentado pelo professor do Instituto de Ciência Política da Universidade de Brasília (UnB), André Borges, durante seminário na Câmara dos Deputados no último mês. O estudo mostra que um primeiro aspecto que contribuiu para a fragmentação é o fato de as eleições presidenciais coincidirem com as escolhas para senador, deputados federal e estadual, e governador. “Há um descolamento. O presidente ganha a eleição, só que os partidos que vão formar maioria no Congresso não necessariamente batem com os partidos que ganham a eleição presidencial”, explica.

Para Borges, a falta de traquejo político de Dilma acabou por inviabilizar a conclusão do mandato. “Para lidar com esse sistema complexo, tem que ter alguém que saiba fazer política. Todos os presidentes que tivemos tinham trajetória política. Eram pessoas com liderança. Dilma nunca foi capaz de controlar nem o PT”, afirmou.

O professor do Departamento de Ciência Política da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) Carlos Ranulfo Melo acredita que a crise política vai muito além da dificuldade de Dilma e do PT. “É uma crise que não chega a ameaçar a democracia, mas é sistêmica. Porque ameaça o sistema partidário. Hoje, não há partidos que escapem a esse processo de investigação. Por uma razão simples.  o financiamento sempre foi feito por vias tortas e sempre que se começasse a puxar o novelo, ia puxar de todo mundo”, avalia.

Na avaliação do professor, é necessário estabelecer um teto baixo de doações de empresas. “Quando se estabelece um teto partidário, os partidos ficam com muitos doadores, mas todos doando pouco, dessa forma, tem que pulverizar”, analisa.