Correio braziliense, n. 19402, 09/07/2016. Opinião, p. 12

Mudar o Brasil pela educação

Por: Mozart Neves Ramos

 

Não há como avançar nas políticas públicas, na escala em que o país necessita, sem recuperar a economia e a estabilidade política. Os estados e municípios, em sua larga maioria, estão literalmente “quebrados”. A situação mais grave é a do Estado do Rio de Janeiro. E chegamos aonde chegamos graças aos maus brasileiros, que usurparam e saquearam o país. Enquanto o Judiciário faz sua parte, precisamos agora ajudar o país a se reerguer. Fazer as reformas necessárias e trazer de volta a confiança dos investidores. A queda do Produto Interno Bruto (PIB) e a correspondente redução de recursos para investimentos no campo social, em especial educação, saúde e segurança pública, vão exigir que os gestores dessas áreas façam as escolhas certas e estabeleçam como nunca o que é prioritário e essencial. As chances de sucesso podem ser ampliadas se tais decisões forem construídas de forma articulada com a sociedade, buscando parcerias e sinergias.

Na área da educação, isso significa colocar em prática o regime de colaboração não só entre as três esferas de governo (federal, estadual e municipal), mas identificar instituições que eventualmente já venham contribuindo para melhorar a educação pública brasileira.

Esse alinhamento pode fazer uma enorme diferença, não só na perspectiva da ampliação de recursos, mas também fortalecer a participação social, colocando em prática a Constituição Brasileira. Em seu artigo 205, a Constituição afirma: “A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.

Por isso, o Ministério da Educação (MEC) está ouvindo secretários de Educação, reitores de universidades e diversos setores da sociedade para estruturar uma agenda prioritária para a educação brasileira, levando em conta esse difícil cenário da vida brasileira. Na área da educação básica, os focos podem estar na alfabetização das crianças, no ensino médio e no fortalecimento do regime de colaboração.

A alfabetização das crianças é a pedra angular de toda a educação. Assim, deveria merecer uma atenção especial. O atual programa para isso, o Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa (Pnaic), inspirado na vitoriosa experiência do Ceará, precisa urgentemente ser revisto. A formação dada aos alfabetizadores é completamente descolada da sala de aula; paga-se uma bolsa irrisória ao alfabetizador, e os resultados precisam ser monitorados.

No ensino médio, o país é um desastre. Os alunos — nossos jovens — literalmente abominam o atual modelo, de muito conteúdo e baixa qualidade. Mas existem exceções, felizmente. As experiências de Pernambuco, já com escala, e a do Rio de Janeiro mostram que é possível ter uma escola que faz sentido para o jovem, na qual ele aprende e se desenvolve como pessoa. Ou seja, uma escola que promove a Educação Integral – em tempo integral, preparando nossos jovens para a universidade, para o mundo do trabalho e para a vida. Os recursos podem vir de dois programas governamentais: ensino médio Inovador e Mais Educação. É preciso aprimorá-los, dar mais foco e implantar uma gestão por resultados inspirados nas experiências acima.

O terceiro foco de atuação é simplesmente colocar em prática o que diz o artigo 7º do Plano Nacional de Educação, que se refere ao regime de colaboração. Nesse caso, o foco estaria na implantação dos chamados arranjos de desenvolvimento de educação, em conformidade com o Inciso 7º desse artigo, que já se efetiva em muitos territórios brasileiros com apoio ou não de institutos e fundações de empresas. O mais bem-sucedido deles encontra-se no Noroeste de São Paulo, envolvendo 38 municípios sob a coordenação do município de Votuporanga. Para esse fim específico, o MEC poderia ser o grande articulador desse processo, concentrando-se nos territórios de maior vulnerabilidade social e econômica, onde a escassez de quadros técnicos é um grande impedimento para desenvolver bons projetos. Trata-se de uma atuação colaborativa entre municípios, com foco em ações prioritárias e trabalhando de forma articulada com os estados e o governo federal. Esse mecanismo de atuação dialoga com os consórcios municipais, e pode ser uma experimentação para que isso se efetive mais adiante.

Não há tempo a perder. Não podemos permitir que o futuro de nossas crianças e de nossos jovens fique comprometido por esse grave momento da história brasileira. Esse futuro depende de todos nós, dos verdadeiros brasileiros, que sonham deixar como legado para as futuras gerações um Brasil mais fraterno e de iguais oportunidades para todos. Como dizia o líder sul-africano Nelson Mandela, a quem tive a honra de conceder, como reitor da UFPE, o título de Doutor Honoris Causa, “a Educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo”.

 

Mozart Neves Ramos

Diretor do Instituto Ayrton Senna. Foi reitor da Universidade Federal de Pernambuco e secretário de Educação de Pernambuco