Uma disputa cada vez mais embolada

 

13/07/2016
Naira Trindade
Julia Chaib

 

A Câmara dos Deputados chega hoje loteada à eleição para escolher quem sucederá Eduardo Cunha (PMDB-RJ) no mandato tampão de presidente da Casa, que vai até fevereiro do ano que vem. A entrada do ex-ministro da Saúde Marcelo Castro (PMDB-PI) na disputa, após ser escolhido por 28 votos de seus correligionários, embolou de vez o jogo, roubou votos prometidos a outros candidatos e animou o PT, que escolheu um nome para apoiar e tentar se manter vivo no parlamento após o afastamento de Dilma Rousseff.

“Consegui os votos do meu partido e, agora, estou procurando conversas com as legendas que não têm candidato próprio, como o PT, o PCdoB, o PDT. Acho deselegante procurar quem anunciou algum nome. Estou confiante para chegar ao segundo turno e, de lá, para a vitória”, afirmou Castro. O ex-ministro da Saúde é um azarão que ganhou peso inesperadamente e deve, de cara, arrebanhar boa parte da esquerda, em uma articulação antecipada pelo Correio no último sábado.

Castro disputou internamente com Carlos Marun (PMDB-MS) e Osmar Serraglio (PMDB-PR). Dos 66 deputados da bancada, apenas 46 estavam presentes. Na primeira rodada de votações, o ex-ministro da Saúde de Dilma teve 17 votos, Marun; 11; e Serraglio, 11, e outros sete deputados se abstiveram. Por ser mais antigo, Serraglio foi para o segundo turno e o resultado cristalizou-se: Castro com 28 votos, contra 18 do adversário.

A decisão mexeu com as estruturas da Câmara e do Planalto. Na hora em que o resultado foi confirmado, o presidente em exercício, Michel Temer, almoçava com a Frente em Defesa da Agropecuária. Acabou questionado pelo deputado Nilson Leitão (PSDB-MS). “Como o PMDB deixa vencer um candidato que foi contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff?”, quis saber. Temer, com jeito enigmático, devolveu. “Essa é a maior prova de que eu não estou me envolvendo nessa disputa”, completou o presidente em exercício.

Mais cedo, no entanto, o chefe da Casa Civil, ministro Eliseu Padilha, confirmou o empenho do governo — até o momento, completamente em vão — de encontrar um nome de consenso na base. Questionado se o governo trabalha para que Marcelo Castro desista da candidatura à Presidência da Câmara, Padilha afirmou que “não só o Marcelo Castro, mas queremos que fique um só”, afirmou. “Nós não interferimos na definição de quem seja, mas queremos sim que tenha um candidato da base. Nós queremos a unidade da base, e unidade se constrói sem disputa.”

Padilha defende que sejam costurados acordos para os próximos mandatos da Presidência da Câmara. “Pode haver esse conserto. Nós podemos chegar à conclusão de que pode haver um conserto e nós estamos pensando que de repente possa fazer esse conserto para 2016, 2017, 2018. Não precisa ser só 2016”, afirmou.

 

Agenda

Acompanhado do líder do PMDB, Baleia Rossi (SP), e do deputado José Priante (PA), Marcelo Castro tentou, sem sucesso, se reunir com Temer. Eles conversaram com o ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, que prometeu que haveria um encaixe na agenda dele para atender o ex-ministro da Saúde ainda ontem. Até o fechamento desta edição, o encontro ainda não havia ocorrido.

A entrada de Castro também desequilibrou o jogo nas demais candidaturas internas. “A entrada do Marcelo nessa disputa diluiu muito o voto. Temos de trabalhar pela unidade das candidaturas. Quanto mais candidatos tivermos, menores as chances de vitória. Quanto menos tivermos, maiores as chances”, afirmou o líder do PSD, Rogério Rosso (DF).

No PR, que fechou o apoio a Giacobo (PR) por pressão de Valdemar Costa Neto — condenado no processo do mensalão —, também houve ranger de dentes. “É ruim para a gente, porque o Castro ‘bica’ votos onde o Giacobo também bica”, lamentou um articulador da campanha do candidato paranaense.

Nem o chamado Centrinho ficou imune ao “terremoto” Castro. “Boa parte do PSB pode ir com Castro. Ele é leve, tem bom trânsito no partido. Especialmente depois de o PSDB vetar o nome do Júlio Delgado”, reclamou um parlamentar socialista. Os tucanos negam que tenham vetado o apoio a Delgado, que poderá desistir da candidatura antes de o pleito começar. “Apenas houve uma avaliação interna de que o nome de Rodrigo Maia (DEM-RJ) tem mais chances de vitória”, rebateu um cacique tucano.

Maia não quis polemizar com a entrada de Castro na disputa. “Minha base são os quatro partidos do lado de cá (PSDB-DEM-PPS-PSB). Se compreendermos do lado de cá que podemos estar juntos, essa candidatura será imbatível”, apostou Maia. Mas os tucanos também vêm sendo assediados pelo PP, que lançou ontem o nome de Esperidião Amin (SC). “Ele foi no PSDB, conversou conosco e foi muito bem recebido. É um nome leve, articulado e limpo”, afirmou um deputado do PSDB.

 

Correio braziliense, n. 19406, 13/07/2016. Política, p. 2/3