Correio braziliense, n. 19405, 12/07/2016. Cidades, p. 19

Olimpíada, impeachment e segurança no DF

Às vésperas da maior competição esportiva do planeta, que terá 10 jogos em Brasília, e do processo final de cassação do mandato da presidente afastada Dilma Rousseff, policiais civis e militares do DF anunciam paralisações. PM faz carreata hoje

Por: Renato Alves

 

Os responsáveis pela segurança pública no DF terão uma prova de fogo no próximo mês. Cabe a eles a missão de garantir a tranquilidade da capital da República durante os jogos de futebol das Olimpíadas e no processo final do impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff. As 10 partidas ocorrerão de 4 a 13 de agosto e vão atrair delegações, jornalistas e turistas de países visados por terroristas, como Iraque, Alemanha e Estados Unidos. O Senado começa a votar a cassação de Dilma Rousseff em 9 de agosto, mas o resultado deve sair só duas semanas depois. Em meio a esse cenário, policiais civis e militares de Brasília se mobilizam. As delegacias estão em Operação PCDF Legal, com agentes deixando de ouvir depoimentos. Agentes e escrivães ameaçam uma greve geral. Na PM, praças organizam uma operação tartaruga e hoje promovem uma carreata.

A operação de segurança montada para as competições olímpicas em Brasília começa em 23 de julho, com a chegada das delegações, e termina em 15 de agosto. Ela envolverá 4,5 mil agentes do setor por dia, com o reforço de 4 mil militares das Forças Armadas, que ficarão na rua e de prontidão em quartéis. Diferentemente do que ocorre no Rio de Janeiro, sede oficial da competição, as autoridades de Brasília mantêm segredo sobre números relativos a veículos, helicópteros e outros equipamentos a serem empregados durante o evento na capital. A Secretaria de Segurança do DF deu respostas por meio de nota oficial, sem detalhar o planejamento.

Em Brasília, haverá interdição de vias, como ocorreu na Copa do Mundo de futebol de 2014, mas nada a respeito também é divulgado. Há ainda um plano só para as áreas de hotéis e os quatro centros de treinamento que receberão as seleções. Ele prevê ações específicas para casos de terrorismo, manifestações, violência e até desastre natural. Outra estratégia tem protocolos de atuação para 168 possíveis eventos durante os jogos. Eles vão de acidentes de trânsito a atentados no Estádio Nacional de Brasília Mané Garrincha.

 

 

Neymar e cia.

O GDF estima gastar R$ 25 milhões com as ações. Tradicionalmente, o futebol dá o pontapé inicial na Olimpíada, antes mesmo da cerimônia de abertura, em 5 de agosto. A Seleção Olímpica estreia no Mané Garrincha às 13h, de 4 de agosto, e faz o segundo jogo no mesmo estádio, em 7 de agosto, às 22h. Seis cidades sediarão partidas de futebol da Rio-2016.

Em relação ao esquema para o julgamento do processo de impeachment na comissão do Senado, a Secretaria de Segurança Pública vai colocar em prática, em 9 de agosto, a fase 3 da Operação Esplanada, que começou com a votação do afastamento da presidente em abril, na Câmara dos Deputados. Nesta semana, o GDF fechará com o governo federal e o Senado se 4 e 9 de agosto serão pontos facultativos no serviço público.

Pelo cronograma aprovado pela Comissão do Impeachment, o plenário do Senado fará, em 9 de agosto, a votação do parecer prévio da comissão. Se a maioria simples aprovar o documento, há um prazo de 48 horas para que a acusação apresente o chamado libelo acusatório, e outras 48 horas para que a defesa de Dilma se pronuncie. O julgamento final tem de ocorrer em até 10 dias. Mantido o plano, Dilma deve ser julgada a partir da semana de 22 de agosto.

A Secretaria de Segurança não esclareceu se vai seguir o modelo adotado na votação ocorrida na Câmara. Caso o esquema seja o mesmo, os turistas que virão à capital para as Olimpíadas ficarão impedidos de visitar os principais monumentos de Brasília, com o isolamento da Praça dos Três Poderes e da Câmara dos Deputados, e o fechamento do acesso ao Palácio Itamaraty e ao Palácio da Alvorada. O GDF fala em 300 mil turistas nas Olimpíadas.

 

Metade do necessário

Na prática, o governo pode ter problemas com pessoal. Agentes e escrivães estão instruídos, desde a semana passada, a não desempenharem atividade fora das atribuições pertinentes a cada cargo. Assim, a Polícia Civil promete radicalizar o movimento. “Até agora, a atividade mais atingida é a de produção de prova testemunhal. Colhemos, em média, 30 mil depoimentos por mês. Desde a semana passada, 80% são deixados de serem feitos. Vale lembrar que os depoimentos são essenciais às investigações porque embasam pedidos de prisão de mandados de busca”, ressalta o presidente do Sindicato dos Policiais Civis do DF (Sinpol-DF), Rodrigo Franco. “Agora, vamos organizar uma paralisação de 72 horas. Se não formos atendidos, vamos entrar em greve antes das Olimpíadas”, completa.

Por meio da Operação PCDF Legal, os policiais querem expor o sucateamento da categoria. Faltam equipamentos básicos de segurança para a atuação dos agentes e munição para treinamentos. Delegacias precisam de reforma e há carros inadequados em uso. A corporação tem 4,5 mil integrantes, enquanto o necessário seriam 8,9 mil. A categoria pede a contratação imediata de todos os aprovados no concurso de 2013 — dos 1.000 aprovados, faltam serem chamados 200 —, a regulamentação de auxílios e abertura de novo concurso. Outra reivindicação se arrasta há anos: a equiparação de salário com os policiais federais. Segundo o Sinpol-DF, a defasagem da remuneração é de 2009. O único reajuste concedido foi de 15,3% divididos em três anos.

 

O que diz a lei

Ao participarem de uma greve, os PMs podem ser responsabilizados por crimes de motim e insubordinação, previstos no Código Penal Militar. O artigo 182, que trata do amotinamento, prevê pena de reclusão até 3 anos aos “cabeças” e detenção de até 2 anos para quem participar. Oficiais que se abstiverem de tomar alguma providência também podem ser punidos. Já a desobediência, prevista no artigo 163, leva à detenção de até 2 anos caso não haja implicações maiores.

 

Para saber mais

Sem unidade especializada

Todos os jogos de futebol do torneio olímpico em Brasília serão no Estádio Nacional Mané Garrincha, de onde partirá a carreata da PM na terça-feira. A mais cara arena do país, construída para a Copa de 2014, presenciou uma série de cenas de barbárie em partidas de futebol, expondo falhas no esquema de segurança. Só este ano, torcedores e policiais militares entraram em confronto três vezes. Depois do mais recente episódio, em que PMs intervieram quando palmeirenses tentaram invadir a área reservada a flamenguistas, em jogo da Série A do Campeonato Brasileiro, a Secretaria de Segurança Pública reviu a estratégia, passando, inclusive, a separar adversários por grades, dentro do estádio. Mas o DF continua sendo uma das poucas unidades da Federação sem unidade da PM especializada em eventos esportivos.

_______________________________________________________________________________________________________

PM organizada por paralisação

 

O comando da PMDF descarta uma paralisação dos militares em julho ou agosto. Para desmobilizar a categoria, suspendeu folgas e licenças de 20 de julho a 20 de agosto. A corporação tomou medidas parecidas na Copa de 2014. O DF tem 7,8 mil bombeiros e 13,6 mil PMs. A Associação dos Praças Policiais e Bombeiros Militares (Aspra) prometeu recorrer à Justiça. “Não estamos em uma ditadura nem em um período de escravidão. Militar também é gente, tem família, precisa de descanso”, afirmou o presidente da Aspra, João de Deus.

A PMDF publicou a determinação em 28 de junho, no mesmo dia do vazamento do áudio do deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF) propondo que PMs façam greve “de um ou dois dias” durante as Olimpíadas. Por iniciativa também do parlamentar, PMs anunciam para hoje uma carreata pelo Eixo Monumental. Eles querem reajuste de 27,9%, além da ampliação da abrangência no plano de saúde. O governador Rodrigo Rollemberg (PSB) recebeu representantes da categoria na semana passada e prometeu manter a discussão aberta.