Cunha influencia eleição

 
13/07/2016
João Valadares

 

Mesmo afastado do mandato parlamentar por decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), o deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que renunciou ao cargo de presidente da Câmara na semana passada, tenta influenciar nos bastidores a sua sucessão. O motivo é simples: deseja protelar ao máximo o processo de cassação. No entanto, o peemedebista tem perdido força política a cada dia. Sem poder de barganha e com cada vez menos aliados, tem acumulado derrotas.

Inicialmente, Cunha trabalhou para emplacar o líder do PSD, Rogério Rosso (DF), o candidato mais forte do chamado Centrão (PSD, PP, PP, PR, PTB e outros partidos menores). Este bloco foi turbinado politicamente durante gestão do peemedebista à frente da Câmara. Com a renúncia, o parlamentar do PMDB esperava ter a garantia do governo de que Rosso seria o nome de consenso apoiado pelo Palácio do Planalto.

O plano não deu certo porque o chamado Centrinho (PSDB, DEM, PPS e PSB) se distanciou do Centrão e rachou a base governista. Integrantes do bloco temiam levar o carimbo de que estariam legitimando um candidato chancelado por Cunha. A fatura cobrada poderia ser cara demais.

Diante da mudança de quadro, o peemedebista tentou a última cartada. Ao saber que o PMDB lançaria candidato próprio, Eduardo Cunha esperava que a bancada do PMDB escolhesse o presidente da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), Osmar Serraglio (PR).

Mais uma vez, o ex-presidente da Câmara sofreu um revés. Por 28 votos a 18, Serraglio foi derrotado por Marcelo Castro (PI), ex-ministro da Saúde da presidente afastada Dilma Rousseff. Havia ainda outro candidato de Cunha na disputa interna do PMDB. Carlos Marun (MS), aliado fiel, ficou na quarta colocação. Ontem, durante sessão na CCJ, ele tentou protelar o processo mais uma vez para proteger o correligionário. “Não é justo que só o Cunha seja julgado. Ele está sendo julgado porque foi presidente da Câmara. Não é mais. Portanto, o processo precisa ser revisto”, disse.

Marcelo Castro foi relator da Comissão Especial da Reforma Política na Câmara e se destacou pelo enfrentamento que fez em relação a Eduardo Cunha. O deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que o ex-presidente da Câmara influencia diretamente o pleito. “Ele quer ter o controle de tudo.”

Agora, restou a Cunha tentar aglutinar novamente o Centrão em torno do nome de Rogério Rosso. Ele é tido como um aliado importante do peemedebista e presidiu a Comissão Especial de Impeachment na Casa. Rosso vive uma situação delicada e tenta, pelo menos publicamente, se distanciar de Cunha, acusado de esconder propina do esquema de corrupção da Petrobras em contas secretas na Suíça.

Questionado como votaria no processo de cassação do deputado, o líder do PSD se esquivou. “É preciso aguardar o relatório (na CCJ)”, afirmou Rosso. Em entrevista ao Correio, ele minimizou a influência de Cunha no pleito de hoje. “O deputado Eduardo Cunha não vota. Não fiz parte da aliança que levou Cunha à Presidência. Conheci Cunha nesta legislatura. Como líder, tinha como atribuição ter relação no mínimo respeitosa com o presidente da instituição. Não se pode confundir isso com nenhum tipo de apoio histórico”, declarou.

Provável candidato do PSB, o deputado Julio Delgado disse ontem que, se for para derrotar o nome de Cunha, está disposto a sair da disputa. A ideia é que os blocos lancem nomes e assim diminuam o número de candidatos. O DEM, que vai lançar Rodrigo Maia, tenta receber o apoio do PSB e do PSDB para chegar ao segundo turno.

 

Cunha tratou projeto com empreiteira

A PF encontrou mensagens de celular trocadas entre o ex-presidente da construtora Andrade Gutierrez Otávio Azevedo e o deputado Eduardo Cunha que sugerem que ambos negociaram mudanças em propostas de leis que tramitavam na Câmara. Em uma conversa de 1º de abril de 2014, o executivo cita dois pontos de um projeto de lei: “Eduardo, estas modificações propostas pela CNO estão aceitas pelo Governo e Câmara?”. Cunha responde: “Esse ponto 1 eu acertei mas tem de ser em segredo”. E completa: “O segundo não”. Em outra conversa, de setembro de 2011, eles falam sobre o envio de um “material”. “Você ficou de me mandar um material. Estou no Rio”, diz Azevedo.

 

Correio braziliense, n. 19406, 13/07/2016. Política, p. 4