Estados terão limite para gasto e salários congelados

 

09/08/2016
Simone Kafruni
Hamilton Ferrari

 

Depois de muito vaivém, o governo chegou a um acordo sobre o projeto de renegociação das dívidas dos estados com a União. Ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, anunciou que os termos da reestruturação previstos do Projeto de Lei Complementar (PLP) 257 foram mantidos e confirmou a exigência de duas contrapartidas. Os governadores terão um teto para o aumento dos gastos, limitado à inflação do ano anterior, e, por dois anos, não poderão realizar concursos públicos nem dar reajustes salariais aos servidores estaduais. De acordo com o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), o texto pode ser votado ainda hoje.

“Foi acordado que o parecer do relator, deputado Esperidião Amin (PP-SC) vai, não só manter integralmente todo o acordo de reestruturação da dívida, mas também as duas contrapartidas que foram demandadas pela União e aceitas pelos estados”, disse Meirelles. “Elas são: a limitação do crescimento das despesas à inflação medida pelo IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo); e a suspensão, por dois anos, de aumentos de salário a funcionários estaduais”, anunciou o ministro. Ele também foi taxativo: “Novos concursos serão proibidos”.

Apesar de Meirelles negar que o governo havia recuado, na semana passada, diante da gritaria de governadores e servidores, o Palácio do Planalto fez uma série de concessões que desfigurariam o projeto original, alimentando a desconfiança dos investidores. O ministro refutou a ideia de que a Fazenda tenha baixado a guarda. “O importante, neste momento, é o foco no ajuste fiscal dos estados e uma aprovação não só da repactuação da dívida mas também das contrapartidas”, reiterou.

Com o acordo, o texto do PLP 257 prevê o alongamento do prazo da dívida por 20 anos e o pagamento gradual a partir de janeiro de 2017. De início, as parcelas serão equivalentes a 5,55% da prestação atual. Em fevereiro do ano que vem, a transferência subirá para 11,1%,  e assim por diante, até atingir 100%. O texto que fixa o teto de gastos dos estados deve seguir a mesma linha da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) que o governo federal encaminhou ao Congresso e à qual a União será submetida, se aprovada. Nesse caso, a proposta prevê que o teto vigore por 10 anos.

A expectativa é de que os estados terão um alívio de R$ 50 bilhões até junho de 2018. Os que não honrarem o acordo perderão o benefício da renegociação. “A finalidade é o teto dos gastos, que caracteriza o ajuste fiscal dos estados. A segunda contrapartida viabiliza o cumprimento do teto”, ressaltou Meirelles.

 

Sangria

Para José Matias-Pereira, especialista em contas públicas e professor da Universidade de Brasília (UnB), as contrapartidas são positivas. “Não dá para o país, nas três esferas de governo, continuar gastando no ritmo que vem gastando, sobretudo porque há queda na arrecadação”, avaliou. “A única forma de limitar a sangria é definir a altura da régua, impondo limite para todos. Senão, toda vez que houver uma crise, os estados vêm bater na porta da União”, acrescentou.

O debate em torno da aprovação de medidas para reequilibrar as contas públicas deve ser ampliado, avaliou a economista-chefe da XP Investimentos, Zeina Latif. Ela destacou que o Executivo já sinalizou que o ajuste fiscal é uma prioridade, e não só do ministro do Fazenda, como ocorria na gestão petista. “A sociedade não aceita mais a volta da inflação, o aumento da dívida pública nem da carga tributária”, alertou.

Na opinião de Geraldo Biasoto Jr., professor do Instituto de Economia da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), ex-coordenador de Política Fiscal do Ministério da Fazenda, a proposta provocou um imbróglio monumental. “O governo lança um pacote, diz que tal medida é indispensável, depois sinaliza que não é tão indispensável assim e recua novamente”, afirmou. Para ele, apesar de ser correta a intenção de limitar gastos públicos, não tem cabimento o governo federal determinar as regras dos estados. “Há um pacto federativo. Entrar na política de recursos humanos de estados e municípios é um escândalo”, opinou.

A contrapartida dos estados é inevitável, disse André Perfeito, economista-chefe da Gradual Investimentos. “A frustração de receitas impõe um desafio para restabelecer o equilíbrio fiscal. Renegociar prazos e juros sem abrir mão do teto de gastos poderá manter a trajetória de longo prazo dentro do ponderável.”

 

Previdência

O governo reconhece que apenas as duas contrapartidas não resolvem a questão fiscal e estuda incluir as demandas estaduais na discussão da reforma da Previdência. O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, afirmou que ainda não foi decidido se isso será tratado em um projeto em separado ou na própria proposta que vai alterar as regras da Previdência Social. “O governo vai apresentar, proximamente, um projeto incluindo as reformas estaduais e estará disposto a auxiliar os estados”, destacou. As mudanças foram discutidas ontem, no Palácio do Planalto, pelo presidente interino, Michel Temer, Meirelles e o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha.  “O importante é o foco no ajuste fiscal dos estados e numa aprovação não só da repactuação das dívidas, mas das contrapartidas”

 

Frase

“Novos concursos serão proibidos”

Henrique Meirelles, ministro da Fazenda

 

Correio braziliense, n. 19433, 09/08/2016. Economia, p. 7