Correio braziliense, n. 19407, 14/07/2016. Política, p. 4

Primeiros pepinos a resolver

Nova gestão começa hoje com missões imediatas: aprovar o ajuste fiscal, pacificar a Câmara e melhorar a imagem da Casa no pós-Cunha

Por: Paulo de Tarso Lyra

 

A Presidência da Câmara é um cargo cobiçado. Segundo nome na escala sucessória do Planalto — no caso atual, primeiro, já que o presidente interino, Michel Temer, era vice-presidente da República —, Rodrigo Maia será o dono de um orçamento de R$ 12,3 bilhões aprovados na Lei Orçamentária de 2016 e com poder de ajudar ou atravancar o governante de plantão. Mas o vencedor da disputa, cuja gestão inicia a partir de hoje, tem um passivo gigantesco: limpar a imagem da Casa, que, pela primeira vez, viu um presidente ser afastado, por unanimidade, pelo Supremo Tribunal Federal (STF).

Não que, tradicionalmente, a imagem do parlamento seja positiva. Mas, nos últimos meses, com o desgaste provocado pela novela envolvendo o ex-presidente Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que renunciou na semana passada, essa vala entre o Legislativo e a opinião pública aprofundou-se ainda mais. E tende a continuar aumentando. Enquanto os deputados defendiam a melhoria da imagem da Câmara, os integrantes da Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), remarcavam para as 9h de hoje a sessão para discutir os recursos (leia mais na página 6) contra a cassação de Cunha.

“Precisamos de um nome que devolva a dignidade e a respeitabilidade da Casa, perante os brasileiros e perante nós mesmos”, defendeu o deputado Ricardo Trípoli (PSDB-SP). Por uma questão partidária, ele não quis adiantar em quem votaria. Mas deixou implícito um lamento. “Alguns nomes teriam condições disso. Mas, infelizmente, dificilmente terão chances de chegar lá”, completou, deixando escapar que um desses personagens seria o deputado Esperidião Amin (PP-SC).

Vice-líder do governo, Darcísio Perondi (PMDB-RS) adota um discurso de guerrilha como plataforma para o futuro presidente. “Temos de ter um nome que consiga implementar, de fato, a autonomia e independência entre os Poderes. Não dá mais para que nossa Casa fique sendo atropelada pelo Judiciário, que resolveu legislar no nosso lugar.” Perondi critica, por exemplo, a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que derrubou a cláusula de barreira incluída no Congresso durante o debate da reforma política. “Essa profusão de partidos, no parlamento e na vida dos brasileiros, é culpa do STF”, criticou Perondi.

Ele também espera que o novo presidente destrave as votações da Câmara, aprovando as medidas do ajuste fiscal já encaminhadas — e as que ainda virão — pelo Planalto. “A Câmara precisa estar afinada com a pauta de mudanças cobrada pela sociedade”, completou Perondi. Parte da agenda começou a andar na noite de terça. Os deputados aprovaram a urgência transferindo diretamente para o plenário a votação dos projetos que alteram as regras de participação da Petrobras na exploração do pré-sal e o que define a renegociação da dívida dos estados.

Para o deputado Lelo Coimbra (PMDB-ES), além das pautas levantadas por Perondi, ainda está incluída neste rol a emenda constitucional que limita os gastos da União à inflação do ano anterior. E a mudança do teto constitucional, ampliando de R$ 33 mil para R$ 39 mil, o salário dos ministros do STF. “Isso não passa aqui de jeito nenhum.” Lelo espera que a base esteja um pouco mais afinada após a definição do processo de impeachment no Senado. “Quando os senadores limparem os trilhos, tirando Dilma do caminho, as divergências da base tendem a diminuir”, acredita Lelo.

Para o primeiro-secretário da Câmara, Beto Mansur (PRB-SP), o Planalto terá, ao contrário do que pensa Lelo, dificuldades cada vez maiores para unificar a base. “Eles demoraram demais a defender a unidade. E tem um grupo que sustenta o governo — o chamado Centrinho — que tem um projeto definido para 2018. Eles vão com o governo Michel Temer até determinado ponto”, apostou Mansur.

Interlocutores do mercado têm pouca expectativa quanto a nomes. Em um cenário de recessão ainda profunda e turbulência política, a esperança é que não seja ninguém que atrapalhe. O temor em torno de Marcelo Castro (PMDB-PI) decorria da aliança com o PT e os demais partidos de esquerda. A vitória deste grupo acarretaria aumento do dólar, dos juros futuros e de queda da bolsa. “O mercado quer um nome que não atrapalhe. Porque tem poucas esperanças de aprovação de matérias importantes ainda este ano, como as reformas que o país precisa”, resumiu um analista de investimento.

 

Frase

"Não dá mais para que nossa Casa fique sendo atropelada pelo Judiciário, que resolveu legislar no nosso lugar”

Darcísio Perondi (PMDB-RS), vice-líder do governo

 

Os desafios

As medidas que devem ser tomadas pelo novo comando da Câmara

 

Resgate da imagem

Normalmente desgastada, a imagem da Câmara dos Deputados afundou de vez no descrédito após a Presidência de Eduardo Cunha. O peemedebista é réu no Supremo Tribunal Federal (STF) por conta das investigações da Operação Lava-Jato

 

Pacificação da Casa

A atual disputa pela Presidência rachou a base aliada entre Centrão e Centrinho, grupos partidários com visões ideológicas diferentes. Além disso, a atual oposição reclama que era tratorada nos tempos de Cunha, sem voz nos debates internos

 

Ajuste fiscal

O país segue afundado em uma recessão crônica. É necessária a aprovação de medidas de ajuste para que o Brasil possar virar a página da crise econômica e retome o crescimento e a geração de empregos