Título: Cartão amarelo
Autor: Sabadini, Tatiana
Fonte: Correio Braziliense, 03/11/2011, Mundo, p. 24

Após retaliar a admissão da Autoridade Palestina na Unesco, Israel é criticado por três países europeus cujo voto pode ser decisivo para o ingresso da AP como membro pleno da ONU

Nas vésperas de uma semana decisiva no Conselho de Segurança das Nações Unidas (ONU), que se encaminha para examinar o pedido de reconhecimento da Palestina como Estado soberano, a decisão de construir mais 2 mil casas em território palestino valeu a Israel uma dura advertência de três importantes governos europeus. França, Reino Unido e Alemanha, que podem definir o resultado da votação sobre o futuro palestino, criticaram a ampliação de colônias judaicas em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia e pediram a revisão da medida. Até mesmo os Estados Unidos, que prometem vetar a admissão dos palestinos na ONU, manifestaram "profunda decepção" com a resolução do aliado israelense, adotada em represália à entrada da Autoridade Palestina (AP) na Unesco.

No próximo dia 11, o Conselho de Segurança deve se reunir para analisar o relatório do painel que examina o pedido palestino, formalizado em setembro pelo presidente da AP, Mahmud Abbas. O representante de Portugal, que preside o órgão neste mês, poderá então marcar a votação. Para serem admitidos na ONU, os palestinos precisam do voto de nove dos 15 países-membros do conselho. Estão garantidos os dos cinco Brics, inclusive o Brasil, e o do Líbano. EUA, Colômbia e Alemanha já se declararam contra. França, Reino Unido e mais seis países ainda não se pronunciaram (veja quadro). Diplomatas palestinos, israelenses e americanos trabalham intensamente nos bastidores pelos últimos votos.

A França, que se equilibra entre a simpatia histórica pela causa palestina e os laços com Israel, subiu o tom de sua intervenção. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Bernard Valero, afirmou que a expansão dos assentamentos judaicos "é ilegal e constitui uma ameaça à solução de dois Estados", como é chamada a fórmula que prevê a soberania palestina. O representante francês na Unesco votou a favor do ingresso da AP na agência cultural e educacional da ONU. Em setembro, o presidente Nicolas Sarkozy defendeu na Assembleia Geral das Nações Unidas que a Palestina ganhe o status de Estado-observador, como o do Vaticano, e propôs um roteiro para que um acordo de paz com Israel seja fechado no prazo de um ano.

Também o Reino Unido advertiu o premiê israelense, Benjamin Netanyahu, que, além da expansão das colônias, anunciou o congelamento do repasse de recursos para a AP. "Isso não condiz com as leis internacionais", condenou o chanceler William Hague. A Alemanha, que votou contra o ingresso da Palestina na Unesco, acompanhou o coro. O porta-voz da chanceler (chefe de governo) Angela Merkel declarou que a retaliação israelense "atrapalha o objetivo comum de promover a solução de dois Estados e é injustificável".

A chefe da diplomacia da União Europeia (UE), Catherine Ashton, pediu que Israel repense a decisão de construir mais casas nos territórios palestinos e defendeu a retomada das negociações de paz. "A atividade israelense de fazer assentamentos é ilegal de acordo com leis internacionais, inclusive na Jerusalém Oriental, e um obstáculo para a paz", disse Ashton. Os Estados Unidos, que suspenderam a contribuição financeira para a Unesco em resposta à admissão da Palestina , também não ficaram satisfeitos com a resposta do governo israelense. A Casa Branca afirmou que a medida não faz o processo de paz avançar.

Fogo cruzado Netanyahu afirmou diante do parlamento israelense que seu governo não recuará e sustentou que o plano de construir mais 2 mil residências em Jerusalém Oriental e na Cisjordânia não foi uma "punição" à Palestina, mas apenas o exercício de um direito. "Construiremos em Jerusalém porque é nosso direito e nossa obrigação, não um castigo. Jerusalém nunca vai voltar para as fronteiras de 1967", garantiu. O premiê se referia à Guerra dos Seis Dias, quando Israel ocupou o setor oriental da cidade, de maioria árabe, hoje reivindicado pela AP para ser a capital palestina.

Às voltas com problemas internos, Israel corre o risco de se isolar ainda mais no cenário internacional, alerta a oposição. A líder do partido oposicionista Kadima, Tzipi Livni, criticou a expansão dos assentamentos e defendeu a busca de acordo com os palestinos. "A ideia de que agora temos de construir mais, para punir os palestinos (pela ofensiva diplomática na ONU) é algo que eu não entendo", afirmou. O chefe da equipe de negociadores da AP, Saeb Erekat, aproveitou uma conferência na cidade israelense de Telavive para reafirmar a estratégia de buscar o reconhecimento pleno pela ONU. Depois, desafiou Netanyahu a romper o impasse: "Israel deve escolher entre colonização e paz, entre negociações e imposições, entre passado e futuro. Este governo escolheu a colonização, a imposição e o passado".

Voto a voto

Como se colocam os 15 países-membros do Conselho de Segurança em relação ao ingresso da Palestina na ONU

Votam a favor Rússia, China, Índia, Brasil*, África do Sul e Líbano* Votam contra ou se abstêm Estados Unidos, Alemanha e Colômbia Não definiram posição França, Reino Unido, Portugal, Bósnia*, Nigéria* e Gabão*

* encerram o mandato no fim deste ano