Com ânimo desfavorável, Cunha diz ser vítima de uma covardia do STF

Raphael Di Cunto, Thiago Resende, Fabio Murakawa, Letícia Casado e Carolina Oms

13/09/2016

 

 

Com a maioria dos deputados declarando-se a favor de sua cassação, o ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) afirmou ontem que foi vítima de uma covardia do Supremo Tribunal Federal (STF), ao afastá-lo do mandato e impedi-lo de conversar com os parlamentares para fazer sua defesa, e que enfrenta adversidades por aceitar o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff.

"Estou pagando o preço por ter dado a continuidade ao processo de impeachment", afirmou. "O que quer o PT é um troféu para poder dizer que é golpe", emendou. 367 deputados votaram a favor da abertura do processo por crime de responsabilidade. O PT acusa Cunha de fazer aceitar o pedido quando o partido decidiu votar contra ele no Conselho de Ética.

O pemedebista, que chegou ao plenário já no meio da sessão e falou com poucos parlamentares, tentou ao longo do dia as últimas articulações para adiar a votação. Sem citar nominalmente o ex-aliado, acusou o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), de querer armar um "circo" ao marcar o julgamento às vésperas das eleições municipais - aliados de Cunha relataram pressão das bases para votar a favor da cassação.

"A gente vive processo de natureza política. Não adianta falar, eu poderia falar 30 horas, mostrar documentos, estou preparado. Mas não adianta, vocês não vão querer ouvir", afirmou. Pediu ainda que fosse julgado com isenção, sem que os parlamentares levassem em conta divergências políticas, apenas a peça de acusação ou a opinião pública.

Nos dias anteriores, Cunha ligou para deputados, enviou um documento padronizado para os gabinetes e cartas pessoais. Em algumas, fez ameaças, segundo relatos. O efeito, contudo, foi reduzido: seus principais aliados não registraram presença em plenário nas primeiras horas, mas o quórum registrava mais de 400 deputados uma hora depois do horário previsto para a sessão.

A cassação do mandato como deputado federal, e consequente perda do foro privilegiado, levará os processos a que o pemedebista responde no STF à primeira instância. Enviar o inquérito para outra instância não é automático após a perda do mandato. Existe um trâmite burocrático que demora pelo menos três semanas e inclui a notificação da Câmara ao STF.

Cunha é alvo de 11 procedimentos decorrentes da investigação na Petrobras e réu em duas ações penais. Nem todas terão como destino o juiz Sergio Moro, responsável pela Lava-Jato na 1ª instância (ver abaixo). Uma das que chegarão ao juiz é a acusação de que o pemedebista mantinha na Suíça contas secretas com dinheiro desviado da Petrobras - sua mulher, Cláudia Cruz, já virou ré no Paraná.

Apesar do esforço para manter o foro privilegiado, Cunha reclamou do tratamento diferenciado do Supremo contra ele - um dos dois únicos parlamentares que já viraram réus pelas denúncias do petrolão, embora a Corte demore em média mais de dois anos para julgar esse tipo de processo - e chamou de covardia a decisão de afastá-lo do cargo - tomada por 10 votos a zero pelo STF - e impedi-lo até mesmo de entrar na Câmara e conversar com outros deputados. "Ex-deputado pode entrar no plenário, mas eu não podia. Era uma covardia para não permitir me defender."

Relator do processo no Conselho de Ética, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO) defendeu que Cunha praticou evasão de divisas e sonegação fiscal e usou até a esposa como "laranja". "A pena de perda do mandato revela-se adequada necessária e proporcional", afirmou. Com a voz embargada, o pemedebista protestou contra o uso de sua família.