Cresce articulação contra reajuste no STF

Vandson Lima e Carolina Oms

09/09/2016

 

 

Cresce no Legislativo e no próprio Judiciário a resistência ao projeto de reajuste do teto do funcionalismo público, que tem como referência os salários dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF).

Aliado do governo do presidente Michel Temer, o PSDB articulou a obstrução dos trabalhos no Senado caso se tentasse votar um requerimento de urgência, apresentado pelo líder do PMDB, Eunício Oliveira (CE), que abriria caminho para a aprovação da proposta. Sem condições de prosseguir, o presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL) acabou adiando a votação.

O ministro Gilmar Mendes relatou que o Supremo está sendo usado como "alavanca" para resolver pretensões salariais de outras categorias. E a ministra Cármen Lúcia, que assumirá a presidência da Corte na segunda-feira, tem sido veemente ao expor suas preocupações com as contas públicas, indício de que não defenderá o reajuste com a mesma tenacidade do atual presidente do STF, Ricardo Lewandowski.

No discurso de posse, diante dos chefes dos três Poderes, a quem entregou pessoalmente ontem convites para a solenidade, há expectativa de abordagem de Cármen Lúcia à questão da sangria das contas públicas, que a preocupa. Ela dificilmente trabalhará por reajustes salariais em tempos de crise econômica e fiscal. A ministra, por exemplo, é contra o pagamento de auxílio-moradia e outros benefícios que ultrapassem o teto constitucional para juízes. Como servidora, Cármen Lúcia busca dar o exemplo, passar uma imagem de sobriedade. Dispensa a presença de muitos seguranças e do carro oficial. Ela recusou também a festa que tradicionalmente as associações de classe da magistratura oferecem após a posse do novo presidente do STF. Para a ministra, o Supremo precisa estar em sintonia com a sociedade e, não sendo este momento para festas.

Gilmar Mendes foi aos microfones alertar que a pressão pelo reajuste não vem dos ministros. "Nós devemos ter pelo menos essa consciência de que nós estamos sendo usados como interessados numa gratificação, numa vantagem que nós necessariamente não pedimos, mas que está sendo forçada para atender a outros pleitos", disse o ministro.

Gilmar disse considerar "justo" o pedido de revisão da remuneração dos juízes, mas que a situação exige "meditação". Se aprovado, o subsídio mensal passará de R$ 33,7 mil para R$ 36,8 mil ainda neste ano e para R$ 39,2 mil a partir de janeiro.

O reajuste já passou pela Câmara dos Deputados e está pendente apenas do aval do Senado para seguir para sanção presidencial. Mas o "efeito cascata" sobre outras carreiras, cujo impacto anual alcança R$ 4,5 bilhões para União, Estados e municípios, faz com quem surjam cada vez mais adeptos à sua rejeição em tempos de restrição fiscal.

Presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), que tem atuado para votar o quanto antes o reajuste - a bancada do PMDB é majoritariamente a favor - admitiu haver grande resistência. Ele chegou a propor uma revisão da regra que vincula a remuneração dos ministros a outras carreiras. "Acho até que, em função da divisão, talvez seja o caso de observarmos a separação dos subsídios do Supremo com os demais cargos da administração pública. Essa vinculação prejudica, deturpa a administração como um todo. É o caso de discutirmos a separação", defendeu.

Renan falou após receber em seu gabinete a ministra Cármen Lúcia. Ele garantiu não terem falado a respeito do aumento. "Ela não comentou. Fez questão de dizer que essa tarefa cabe ao então presidente do STF. A ministra veio nos convidar para a posse. Iremos com muita satisfação".

Sem conseguir avançar na proposta do reajuste, o Senado se debruçou ontem sobre a apreciação de medidas provisórias. Até o fechamento desta edição, haviam sido aprovadas as MPs 726 e 727. A primeira reduziu de 31 para 26 o número de ministérios, uma reforma do Executivo proposta pelo presidente Michel Temer, quando ainda era interino. Os ministérios de Portos e Aviação Civil foram incorporados a Transportes. Comunicações foi incorporado à Ciência e Tecnologia. A Fazenda incorporou a Previdência Social, e a Controladoria-Geral da União (CGU) virou Ministério da Transparência, Fiscalização e Controle.

Já a 727 é a que cria, no âmbito da Presidência da República, o Programa de Parcerias de Investimentos (PPI). O texto foi chancelado nos mesmos termos da Câmara dos Deputados e agora segue para sanção presidencial. O PPI será comandado por Moreira Franco, que terá poderes para, por exemplo, escolher quais empreendimentos serão incluídos no PPI. O programa é composto por todos os empreendimentos públicos de infraestrutura que serão executados pela iniciativa privada. Além da criação do PPI, a medida provisória autoriza o BNDES a constituir e participar de um fundo privado de apoio à estruturação de projetos.