Correio braziliense, n. 19442, 18/08/2016. Economia, p. 8
Desemprego se alastra e pune mulheres e jovens
Taxa de desocupação aumenta em todas as regiões do país e supera a média nacional entre pessoas do sexo feminino e trabalhadores com idade entre 18 e 24 anos. Um em cada quatro jovens que procuram trabalho não encontra vaga no mercado
Por: Vera Batista
O desemprego está disseminado por todas as regiões do país e afeta sobretudo mulheres e jovens, revelou detalhamento da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua), divulgada ontem pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Enquanto na média nacional a desocupação chegou a 11,3% no segundo trimestre, a maior da série histórica, a proporção foi bem maior naqueles dois segmentos.
De acordo com o levantamento, a taxa de desemprego ficou em 9,9% entre os homens e em 13,2% entre as mulheres. Também houve forte penalização da população de 18 a 24 anos, faixa em que o índice de desocupação passou de 18,6% para 24,5%, ou seja, um em cada quatro jovens que desejam trabalhar não consegue colocação no mercado. E as perspectivas são de piora, assinalou Cimar Azeredo, coordenador de Trabalho e Rendimento do IBGE. Ele alertou ainda para um dado preocupante. O índice de desemprego no grupo de idade de 40 a 49 anos, que estava em 4,4% no segundo trimestre de 2015, subiu para 6,3% neste ano.
“Essas pessoas mais experientes são arrimo de família. Dependendo da classe de renda, se média ou baixa, quando os pais perdem o emprego, os filhos são retirados da faculdade para trabalhar. Esses jovens sem experiência procurando trabalho pressionam ainda mais o desemprego”, assinalou Azeredo. O coordenador destacou que a alta no segundo trimestre é preocupante. Nos primeiros três meses do ano, na maioria das vezes, a desocupação se eleva devido a efeitos sazonais. “Nunca se espera que piore entre abril e junho. Quando isso acontece, é sinal de que a recessão está forte”, assinalou.
Mercado machista
No fim do mês passado, o IBGE havia anunciado nível recorde de desemprego de 11,3%, deixando 11,6 milhões de brasileiros sem trabalho. Os dados divulgados ontem mostram que nenhuma região do país foi poupada da crise no mercado de trabalho. Em comparação ao segundo trimestre de 2015, a taxa de desocupação subiu de 8,5% para 11,2% no Norte; de 10,3% para 13,2% no Nordeste; de 8,3% para 11,7% no Sudeste; de 5,5% para 8% no Sul; e de 7,4% para 9,7% no Centro-Oeste.
Ivanilde Santana de Carvalho, 35 anos, está na lista de desempregados há mais de um ano e perdeu a conta de quantos cursos profissionalizantes fez para conseguir uma vaga de administradora ou de vendedora. “Vou todas as semanas à agência do trabalhador. Acredito que não tenho sucesso por causa da crise e também pelo fato de ser mulher”, lamentou. Nesse período, ela se endividou no cartão de crédito e está com o aluguel atrasado. Para driblar a crise, vende dindins e produtos de beleza. “Lá em casa, todos estão correndo atrás. Meus dois filhos adolescentes procuram emprego e a gente vende esses artigos, que trazem um dinheiro essencial à família”, contou. Por mês, Ivanilde consegue em torno de R$ 680.
Patrícia Pereira, 32, busca um emprego de vigilante há quatro anos e se revolta com os índices crescentes desemprego de mulheres. Para ela, a pesquisa do IBGE evidencia que o mercado é machista. “Fui ao sindicato dos vigilantes em Brasília. Eles me disseram que as empresas precisavam demitir. O problema é que dispensaram 14 mulheres e nenhum homem. Se eles demitem sem pudor, não vão contratar mulheres. É muito difícil”, criticou.
Retrovisor
Eduardo Velho, economista-chefe A2A Asset INVX, concordou que alguns pontos dessa Pnad têm que ser olhados com cautela. “O aumento da desocupação das pessoas com mais idade exerce forte impacto em termos de consumo e atrapalha ainda mais a retomada do crescimento”, observou Velho. No entanto, ele comparou o dado a uma imagem no retrovisor, pois acredita que a economia está saindo do fundo do poço. “Houve uma alta no nível de confiança dos empresários. Mas melhora, mesmo, nas contratações, só a partir do segundo trimestre de 2017”, destacou.
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A taxa de desemprego medida pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) subiu significativamente em 24 das 27 unidades da Federação no segundo trimestre de 2016. Em 20 estados, o desemprego bateu recorde, apontam dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua), divulgada ontem. O rendimento médio habitual dos brasileiros também caiu, no período, de R$ 2.058, para R$ 1.972.
No Distrito Federal, no entanto, o quadro foi diferente. A taxa de desemprego ficou estável no confronto com o ano passado. E baixou de 11,2% para 10,9% na comparação com o trimestre anterior. O rendimento médio teve incremento: de R$ 3.548 para R$ 3.613. O fato, de acordo com Cimar Azeredo, do IBGE, se deve às características da capital do país, onde os ganhos médios dos empregados do setor privado é de R$ 3.679 e, no setor público, de R$ 8 mil. No caso do funcionalismo nos estados, é de R$ 3.137.
No DF, 557 mil pessoas têm carteira de trabalho assinada. E 89 mil não têm vínculo empregatício. O desemprego total no Brasil, que ficou em 11,3% na comparação entre os trimestres, pegou alguns economistas de surpresa. Cesar Bergo, sócio-consultor da Corretora OpenInvest, esperava no máximo 10%. “Os empresários ainda não viram sinais claros de que o presidente interino, Michel Temer, vai cumprir suas metas”, explicou.
Para o economista, 2016 será um ano perdido. “É possível que novembro e dezembro sejam melhores. Crescimento sustentável, só mesmo a partir de março de 2017, dependendo das medidas da equipe econômica, que só deverão vigorar após as eleições. Depois de outubro, o povo pode preparar o bolso para mais um impostos”, ironizou.
O fato de Brasília estar melhor do que a média do país não significa que não existam problemas aqui. Daniel Anjos, 18, já teve experiência como garçom na Bahia. Há seis meses, porém, só conseguiu bicos na profissão, sem carteira assinada. Recebe em torno de R$ 700 mensais. Apesar de morar sozinho, com poucas despesas, a falta de uma renda fixa o atrapalha. “Tenho ensino médio completo. Quero fazer faculdade de direito. Mas, enquanto não conseguir o emprego, não dá para pagar”, lamentou.
Douglas Nery, 24, tem esposa e dois filhos para sustentar. “Faço bicos de tudo que me sugerem: marceneiro, pedreiro, instalador de pisos”, disse. Douglas foi demitido de uma loja de pneus há quatro meses. Desde então, as dívidas se acumularam. “Com R$ 600 por mês, é complicado”, comentou. (VB)
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Duas das mais importantes empresas industriais do país vão sofrer cortes a partir do próximo mês: a Embraer e a Mercedes Benz. Ontem em São Bernardo, na Grande São Paulo, saíram em passeata 7 mil trabalhadores da subsidiária brasileira da companhia alemã, que protestam contra as demissões.
A Mercedes interrompeu a produção de caminhões em São Bernardo, na região paulista do ABC, na última segunda-feira. Devido a incentivos recebidos pelo governo até o ano passado, a empresa não pode demitir antes do fim deste mês. Em setembro, já estará livre para isso.
A Embraer anunciou, na semana passada, um Plano de Demissões Voluntárias (PDV). Será possível aderir entre a próxima próxima terça-feira e14 de setembro. As inscrições serão analisadas e, nos casos em que a empresa aprovar o benefício, o desligamento ocorrerá na primeira semana de outubro. Segundo a empresa, o programa será aberto a empregados de todas as unidades do Brasil.
O pacote inclui indenização, além do que é exigido por lei, de 40% do salário nominal por ano de casa e seis meses de plano de saúde e odontológico. O Sindicato dos Metalúrgicos de São José dos Campos (SP) afirma que é contra qualquer tipo de corte. “A Embraer foi amplamente beneficiada por financiamentos e incentivos fiscais do governo federal e, agora, quer realizar demissão em massa”, crtiticou o sindicato.
Uma das dificuldades que a Embraer enfrenta é o provisionamento de US$ 200 milhões para pagamentos de indenização nos Estados Unidos em processo que investiga corrupção.