Regulação de lobby avança no congresso

Vandson Lima, Raphael Di Cunto, Eduardo Campos e Carolina Oms

26/09/2016

 

 

A regulamentação da "representação de interesses perante o Poder Público", conhecida como lobby, ganhou velocidade em duas frentes do Congresso Nacional e outras duas no governo do presidente Michel Temer.

Presidente do PMDB e espécie de "ministro informal" da gestão, o senador Romero Jucá (RR) protocolou, com apoio de outros 29 senadores de siglas que vão do PT ao PSDB, uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para legalizar a atividade de lobby de governos e empresas. Já o Ministério da Transparência (CGU) apresentou conclusões e sugestões de seu grupo de trabalho sobre o tema.

Na Câmara dos Deputados, a deputada Cristiane Brasil (PTB-RJ) apresentou parecer favorável a projeto de lei que está na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ). Por fim, o Ministério do Trabalho está em vias de reconhecer e incluir a atividade de Relações Institucionais e Governamentais na Classificação Brasileira de Ocupações (CBO).

Alvo de discussão há décadas no Congresso Nacional, por causa da intensa atuação de grupos junto a governos e casas legislativas, a legalização é tratada como aceitação de uma realidade inevitável: "O lobby ocorrerá sempre, independentemente de regulamentação. Os diferentes grupos de interesse, enquanto representação não eletiva, sempre tentarão influenciar o processo", anota o relatório da CGU.

Em sua justificativa à PEC, Jucá alega que "não escapa a percepção das sombras e suspeitas que o imaginário popular e o noticiário policial e judicial lançam sobre a atividade de lobby", mas, ressalva, "não podemos ignorar que a vertente séria dessa ação detém importância. Que se puna o lobby ilegal e criminoso e seus agentes, mas que isso não impeça o lobby institucional, legal".

Na proposta, Jucá abre a possibilidade de representações terem "direito a voz no âmbito de reunião de comissão (...) e direito à apresentação formal de emendas a proposições". Ou seja, lobistas poderiam atuar ativamente na tramitação de medidas, inclusive apresentando sugestões de alteração a projetos.

O uso de uma PEC para a mudança, observa o senador, ocorre porque "desde a década de 70, todas as tentativas tomaram forma de projetos de lei e, por isso, esbarraram em incontornáveis obstáculos de ordem constitucional, por conta das reservas de competência de cada poder". Os poderes locais regulamentarão depois, pelas normas próprias, os procedimentos relativos ao tratamento dos agentes.

O parecer da deputada do PTB, ao contrário da proposta de Jucá e da orientação do Ministério da Transparência, não prevê a obrigatoriedade de um credenciamento dos profissionais do setor. Os lobistas poderão requerer, no Legislativo e Executivo, um credenciamento para exercerem a atividade de "defesa de interesse", o que garantirá o direito de apresentarem estudos, notas técnicas, sugestões de emendas e projetos de lei. Mas não seria obrigatório o cadastro para exercer a atividade, nem a informação sobre quais interesses que o lobista representa.

O Ministério da Transparência sugere a elaboração de um regulamento que exija credenciamento dos lobistas, mas que essa regulação estabeleça "regras simples e pouco burocráticas para concessão de audiências - o objetivo não é travar o relacionamento público-privado -, mas que demandem dos interessados a prestação de informações básicas sobre o que deseje tratar e sobre quem representa".

O ministro Celso de Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), afirmou que a regulamentação do lobby é "extremamente legítima e necessária". "Permite que o desempenho desse ofício se faça de maneira transparente. Vários países, em particular os Estados Unidos, já regulamentaram".

Consultor legislativo do Senado e doutor em ciências sociais com um trabalho sobre lobby, Luiz Alberto dos Santos critica as propostas do governo Temer e de Jucá. Para ele, é preciso aumentar o controle para garantir a transparência e igualdade de oportunidades a todos os atores do processo, não apenas os lobistas com mais recursos e influência.

Na avaliação de Santos, não basta o credenciamento, é preciso regras mínimas de prestação de contas. "Não precisa ser os Estados Unidos, com detalhamento minucioso de todos os gastos e ações, mas o mínimo de transparência é necessário", afirma. A proposta do governo, "além de tímida", peca por se restringir ao Executivo e deixar de fora os demais poderes. E a de Jucá, por ampliar demais as prerrogativas dos grupos de pressão, diz.

Coordenador do MBA de Relações Governamentais da FGV e um dos diretores da Associação Brasileira de Relações Institucionais e Governamentais (Abrig), Rodrigo Navarro defende que a regulação não pode ser excessiva, ou provocará efeito contrário. "Nos Estados Unidos as regras se tornaram tão burocráticas que houve uma fuga, ninguém quer se credenciar como lobista", diz.

Para o coordenador do MBA em Relações Institucionais do Ibmec Brasília, Márcio Coimbra, uma emenda à Constituição não é a forma mais adequada de tratar o tema, pois não há outra profissão regulamentada pela Constituição, diz. A exigência de registro dos lobistas, sejam pessoas físicas ou jurídicas, é por ele bem vista. "Todas as empresas que querem fazer lobby à luz do sol devem se registrar e abrir em seus balanços quanto gastam para influenciar parlamentares", disse. Nos EUA, as empresas mostram o quanto gastam com jantares, passagens, estudos e outros mimos que dão a políticos que buscam influenciar.