Valor econômico, v. 17, n. 4099, 27/09/2016. Política, p. A8

Depois de declarações de ministro, Temer alinha discurso

Por: Andrea Jubé e Vandson Lima

 

O presidente Michel Temer vai reunir todos os ministros para alinhar o discurso do governo e ajustar a comunicação na Esplanada. A crise deflagrada ontem após as declarações do ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, sobre a Operação Lava-Jato irritou Temer e o obrigou a tomar ações mais eficazes para evitar a repetição de episódios que constrangem o governo e dão munição aos adversários na campanha eleitoral.

Valor apurou que Temer ficou "muito nervoso" com o episódio envolvendo Alexandre de Moraes, principalmente depois que ele autorizou a divulgação do vídeo no grupo oficial de informações do Ministério da Justiça. Auxiliares de Temer negam, contudo, que a demissão de Moraes tenha sido considerada pelo presidente.

Ontem, no fim do dia, a palavra de ordem no Planalto era "botar água na fervura" para debelar a crise. Assessores de Temer diziam que o presidente não considerava o episódio "incontornável" e que eram "satisfatórias" as explicações de Moraes.

Temer, contudo, ficou "muito nervoso", segundo um assessor, em especial porque Moraes deu as declarações em pleno comício de um candidato do PSDB, de sua base aliada, à Prefeitura de Ribeirão Preto (SP). A cidade é base eleitoral do ex-ministro Antonio Palocci, que foi preso na Lava-Jato. A avaliação é que Moraes passou a impressão de que o Planalto "monitora" a investigação.

"O presidente quer pedir aos ministros que tenham cuidado com as declarações, sobretudo na campanha eleitoral, quando tudo vira munição para a oposição, e até mesmo para os adversários locais", explicou um auxiliar presidencial.

Temer chamou o ministro ontem ao Planalto, mas como Moraes estava em São Paulo, eles se falaram por telefone. Segundo um interlocutor de Temer, o ministro justificou as declarações ressalvando que não se referia a um episódio específico da operação - no caso, a prisão de Palocci -, mas ao conjunto da investigação.

Outro sinal de que o palácio não quer estender o assunto foi o fato de o ministro ter sido incluído no jantar que será realizado hoje entre os líderes dos partidos aliados ao governo e a equipe ministerial para preparar o encaminhamento da reforma da Previdência e da votação da proposta de emenda constitucional (PEC) que trata de limites ao gasto público.

Fontes do palácio reconhecem que a declaração de Moraes intensificou a crise de comunicação que Temer tenta resolver internamente - uma das medidas é a contratação de um porta-voz, a fim de concentrar as principais informações de governo na Presidência.

A oposição explorou o episódio. O líder da minoria no Senado, Lindbergh Farias (PT-RJ) e outros senadores encaminharam uma representação à Procuradoria-Geral da República (PGR) contra o ministro.

"É um escândalo o que aconteceu. Um absurdo. Quem fez o pedido de prisão, desta vez, foi a Polícia Federal, e parece que o ministro sabia antes", disse Lindbergh. "Parece claro que há uma interferência política nas investigações e temos que saber o que de fato está acontecendo", criticou o senador.

O objetivo da representação é que a PGR apure os fatos ligados à declaração do ministro, pois ele teria, acusam os senadores oposicionistas, violado o sigilo de sua função por razões políticas e eleitorais.

Em outra frente, a bancada do PT na Câmara dos Deputados protocolou na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara um requerimento para convocar o ministro a dar explicações.

O líder do PT na Câmara, Afonso Florence (BA), acusou o ministro da Justiça de usar a Polícia Federal com fins eleitorais ao antecipar a ação que levaria Palocci à prisão. "A operação contra Palocci foi antecipada em discurso eleitoral pelo ministro da Justiça, em Ribeirão Preto), justamente o domicílio eleitoral de Palocci", criticou. "É mais uma ação nitidamente eleitoral da Lava-Jato, ocorrida a uma semana das eleições municipais. A Lava-Jato cala-se e nada faz contra os políticos dessas agremiações", questionou, citando denúncias contra políticos do PSDB e DEM. (Colaborou Raphael Di Cunto)

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Moraes nega ter sido avisado na véspera

Moraes: ministro disse que fez "afirmação genérica" ao prever operação

Por: Felipe Marques e Estevão Taiar

 

O ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, garantiu que foi informado apenas na manhã de ontem sobre a Omertá, a 35ª fase da Operação Lava-Jato, deflagrada pela Polícia Federal, que levou à prisão temporária do ex-ministro da Casa Civil e da Fazenda Antonio Palocci.

"Temos uma praxe já montada no ministério de que as operações que são realizadas no dia são informadas entre 6h e 6h15 da manhã", disse, em evento promovido pela Federação Brasileira de Bancos (Febraban) em São Paulo.

Em evento no domingo em Ribeirão Preto (SP), cidade natal do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci, Moraes sugeriu que novas fases da Lava Jato seriam deflagradas nesta semana. "Pode ficar sossegado. É apoio total à Lava-Jato. Tanto que falam, falam, e você vê: sexta teve, quinta teve uma, sexta tem outra, teve outra, nesta semana vai ter mais. Vocês vão ver. Pode ver nesta semana. Quanto vocês virem esta semana, vão lembrar de mim", afirmou, em evento de campanha do deputado Duarte Nogueira, candidato a prefeito pelo PSDB.

Ontem, o ministro disse que fez "uma afirmação genérica". "Da mesma forma que nos quase cinco meses em que estou à frente do Ministério da Justiça todas as semanas houve operações, iria haver nesta semana, na próxima e elas vão continuar", disse Moraes, enfatizando a autonomia da Polícia Federal nas investigações.

Segundo Moraes, a Operação Lava-Jato não deve ser paralisada por conta da proximidade das eleições municipais. "Não há porque parar uma investigação em qualquer período", disse, na Febraban.

Ele desmentiu que a Lava-Jato tenha viés antipetista. "Não houve nenhuma operação em relação a partido X ou Y", afirmou. O ministro afirmou que o governo não tem intenção de diminuir o ritmo das investigações tocadas de Curitiba. "A Operação Lava-Jato vem sendo realizada de forma absolutamente eficaz e eficiente. Quebrou paradigmas da forma de investigar, mas do ponto de vista legal, a operação está sendo realizada de maneira absolutamente normal", disse.

Segundo Moraes, o momento em que a Lava-Jato vai acabar depende dos investigadores. Na avaliação dele, o grande legado da Lava-Jato e das demais operações de investigação de corrupção em curso no país, como a Zelotes e a Acrônimo devem ser regras mais rígidas de "compliance" que possam prevenir novos casos.

"Não adianta apenas aumentar a pena, temos que prevenir o dreno de dinheiro público", disse. Na visão dele, há duas medidas cruciais a ser adotadas para esse fim: diminuir a circulação de dinheiro vivo e dar mais "elasticidade" ao conceito de sigilo bancário.

"Não é possivel que quem receba dinheiro público possa alegar sigilo bancário em relação ao Ministério Público", disse. "Não é terminar com sigilo bancário de quem recebe dinheiro público, mas devem ser ampliadas as autoridades com pleno acesso a essas contas." Segundo ele, há um trabalho em curso no governo para propor alterações legais nesse sentido.

Moraes afirmou que há um anteprojeto de lei segundo o qual quem assina um contrato com serviço público - não só a empresa, mas também os sócios - abre mão do sigilo bancário para os órgãos de controle.