Valor econômico, v. 17, n. 4100, 28/09/2016. Política, p. A6

Prisão de Palocci aprofunda divisão entre PF e MP

Por: André Guilherme Vieira

 

As divergências entre a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) se intensificaram em Curitiba, desde a deflagração da 35ª fase da Operação Lava-Jato, a Omertà, que mirou o ex-ministro da Casa Civil e da Fazenda Antonio Palocci, preso temporariamente na segunda-feira.

A investigação que teve Palocci como alvo foi majoritariamente conduzida pela PF, com base em documentos obtidos no Setor de Operações Estruturadas da Odebrecht, uma espécie de divisão da empresa destinada ao controle e custeio de pagamentos de vantagens indevidas, segundo a Lava-Jato. A divisão de propinas foi revelada na delação premiada da ex-secretária de Marcelo Odebrecht, Maria Lúcia Tavares.

Os desentendimentos entre MPF e PF não são recentes. Há meses delegados foram alijados das reuniões para depoimentos de delatores e candidatos à delação premiada. Mesmo quando ocorrem na sede da PF, em Curitiba, essas oitivas não contam mais com a presença dos policiais, diferentemente do que acontecia até o final do ano passado.

Outro ponto de constante discórdia é a maneira como os procuradores têm utilizado o instrumento da delação premiada. Na avaliação de policiais ouvidos pelo Valor, em condição de anonimato, a PF dispõe de outras formas de investigar, como quebras de sigilos bancários, fiscal e telefônico, além de cruzamentos de dados, que tornam a delação premiada menos necessária. A Lava-Jato já conta com 72 delatores, número que poderá saltar para até 130, caso o herdeiro do Grupo Odebrecht, Marcelo Odebrecht, e dezenas de executivos e ex-executivos ligados à empresa firmem acordo de colaboração premiada.

Mesmo na força-tarefa do MPF, em Curitiba, existem dúvidas sobre a necessidade de Marcelo Odebrecht tornar-se delator. Muito do que ele tem a revelar já é de conhecimento dos investigadores, que têm acesso às provas do Setor de Operações Estruturadas e à uma quantidade gigantesca de dados e informações obtidos em ações de busca e apreensão autorizadas pela Justiça.

Os fatos novos a serem revelados por Marcelo Odebrecht implicariam políticos do PT, PMDB e PSDB, que seriam beneficiários finais de depósitos originados em desvios da Petrobras e viabilizados pela Odebrecht no exterior. A defesa de Odebrecht reuniu diversos desses documentos e os apresentou durante as negociações de pré-delação premiada, conforme apurou o Valor PRO.

O fato de a PF não estar participando especificamente dos depoimentos da pré-delação dos investigados ligados à Odebrecht foi um fator de ampliação da discórdia entre procuradores e delegados.

Com o acordo de confidencialidade assinado pela Odebrecht com o MPF, representantes do jurídico da empresa ficaram preocupados com a exposição da empresa causada pela operação Omertà. O grupo passa por um momento delicado de venda de parte de seus ativos e de recuperação de imagem, desgastada pelo envolvimento em corrupção revelado pela Lava-Jato.

Amanhã Antonio Palocci prestará depoimento ao delegado Filipe Pacce, que conduziu quase toda a investigação da 35ª fase quase sem a participação do MPF.

O depoimento de Palocci está marcado para o período da tarde. O advogado dele, José Roberto Batochio, disse que o ex-ministro vai refutar as suspeitas que recaem sobre si e que são "meras ilações baseadas em apelidos", segundo o criminalista.

Também amanhã, às 10h, será ouvido o ex-assessor de Palocci, Branislaw Kontic. Ele é apontado como responsável por marcar reuniões do ex-ministro em que se discutiria os supostos pagamentos de propinas.