Valor econômico, v. 17, n. 4091, 15/09/2016. Brasil, p. A6

Receita preocupa relator do Orçamento

Por: Fabio Graner

 

O relator do projeto de lei orçamentária para 2017, senador Eduardo Braga (PMDB-AM), demonstrou preocupação com a projeção de receitas que o governo colocou na proposta em tramitação no Congresso.

Em entrevista ao Valor, ele indicou que, se a projeção estiver mesmo superestimada em alguns aspectos e não haja melhora em outras previsões de receitas, será necessário cortar despesas.

Primeiro relator de um Orçamento sob o novo regime fiscal, que limita o crescimento do gasto público à inflação, Braga considera relatar e aprovar o projeto um "grande desafio", pelo fato da regra rompe com a cultura de elevação de despesas pelos parlamentares, normalmente compensada com alta na estimativa de receitas.

"Nós temos que ter um realismo orçamentário, seja de receita, seja de despesa, muito grande", explica.

A Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) definiu a meta fiscal para 2017 em déficit de R$ 139 bilhões para o Governo Central (Tesouro, Previdência Social e BC) e incorporou o conceito da PEC do gasto, que está em tramitação na Câmara dos Deputados.

Dessa forma, a margem de manobra do relator é relativamente pequena, pois não pode ampliar despesas e precisa entregar uma peça que seja compatível com essa meta sem elevar impostos.

"Efetivamente, o governo trabalha com algumas hipóteses no Orçamento que precisam ser bastante discutidas. Por exemplo, a expansão da massa salarial que impacta na receita", explica. "Isto precisa ser muito bem avaliado porque partem de uma premissa de ganho salarial de 7,8% no ano que vem, contra 2,4% previsto para este ano. Acho um ganho muito expressivo para um PIB que está em uma base reduzida e que terá crescimento moderado no ano que vem", alertou Braga, lembrando que isto impacta, por exemplo, na estimativa de déficit da Previdência. "Se a massa salarial crescer menos do que o previsto, significa que o déficit da Previdência pode ser maior", diz.

De acordo com uma fonte da equipe econômica, a estimativa sobre a massa salarial contempla estabilização e ligeira melhora do mercado de trabalho em 2017 e, principalmente, o impacto da inflação. Neste ano, o crescimento é bem mais baixo por conta da trajetória de alta do desemprego, mitigando o impacto inflacionário no indicador.

Braga também demonstra preocupação com a projeção de alta de das receitas administradas para o ano que vem, cuja expectativa é de expansão de 11,8%, o que daria mais de 5% de alta em termos reais.

Por outro lado, o senador avalia que a expectativa de arrecadação com concessões e vendas de ativos pode estar sendo conservadora. "Por isso que o relatório de receita será fundamental", afirma.

O senador avalia que a queda nos investimentos em relação ao Orçamento de 2016 é um dos pontos delicados da proposta, pois sempre há grande pressão dos parlamentares por expansão nessa rubrica.

Autor de uma emenda que proibia contingenciar recursos de fundos setoriais, como o da aviação, que acabou sendo excluído da LDO, Braga diz que tentará uma alternativa no projeto de Orçamento para que pelo menos o fluxo de receitas deles seja utilizado para os investimentos nas áreas para as quais foram criados e não para outras áreas, como cobertura do déficit da Previdência.

"Estou conversando com o governo para que a gente crie um mecanismo para que sejam mais seguros os investimentos dos fundos, para que, se for gastar, que se faça na finalidade deles", afirma. O senador destacou ainda que os gastos com saúde e educação estão no limite, dado que o governo já inclui as emendas de bancadas na conta. Assim, para elevar mais essas despesas, outras rubricas terão que sofrer cortes.

O Orçamento de 2017 ainda está na fase inicial de tramitação na Comissão Mista. Braga acredita em avanços significativos no debate só por volta de novembro, depois das eleições e com melhores informações sobre o andamento da economia e das medidas que o governo encaminhou ao Congresso.

Ele também defende que o governo discuta o que fazer com as receitas que entrarão por conta da regularização (repatriação) de ativos no exterior. Esses recursos, que ainda não têm uma estimativa oficial de ingressos no caixa federal, não estão nem no Orçamento deste ano nem no do próximo.

Segundo o senador, o dinheiro poderia ser utilizado, por exemplo, para financiar uma reforma no ICMS e no PIS/Cofins, compensando perdas de arrecadação e fazendo investimentos nas regiões menos desenvolvidas. Ele lembra que essa era a ideia original do programa de repatriação. "Uma das formas de se reduzir custo e alavancar a economia é mexer com ICMS e PIS/Cofins", diz.

Apesar de tornar mais complexo o seu trabalho, Braga se mostra favorável à limitação do gasto definida pela LDO e pela PEC. E diz que a peça orçamentária é "o mais importante instrumento de ajuste de curto prazo" e que o Brasil precisa fazer um trabalho para melhorar a qualidade e eficiência do gasto público, o que não é tarefa do Orçamento, embora neste projeto seja possível analisar a eficácia de alguns programas e a necessidade de eles serem mantidos.

"Se o Orçamento não pode tratar de eficiência e qualidade do gasto, ele pode discutir os programas que existem e ver se eles estão trazendo resultados", afirmou.