Depois de autorizar, na semana passada, abertura de representação contra o PT por suspeita de beneficiamento a partir de recursos desviados da Petrobras, o que pode resultar na cassação de registro do partido, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, determinou ontem o andamento das investigações contra o PMDB e o PP. Os dois partidos também estão no centro das investigações da Operação Lava-Jato e podem ser banidos. Ainda não foram analisadas pela Corte as denúncias oriundas de delações premiadas que atingem o PSDB.
O sinal verde de Mendes para investigar o PMDB e o PP atende a um pedido, feito na terça-feira, pela corregedora-geral da Justiça Eleitoral, a ministra Maria Thereza de Assis, com base em tudo que tinha sido apurado até o momento no âmbito da Lava-Jato. A operação desvendou um esquema bilionário de corrupção para financiamento de campanhas políticas. “Constato, nesta análise preliminar da documentação, indícios de práticas ilegais tanto por parte do PT, quanto pelo PP e pelo PMDB”, atesta a corregedora.
Em depoimento à 13ª Vara Federal, em Curitiba, o ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, um dos primeiros a colaborar com a Justiça em troca de benefícios e redução da pena, acusou políticos do PT, PMDB e PP de receberem recursos de propina para campanhas políticas em 2010, disse também que o Partido dos Trabalhadores ficava com 2% a 3% dos valores dos contratos superfaturados na empresa. Num dos primeiros depoimentos, afirmou que o PT era o partido que tinha mais diretorias na estatal e, por isso, o que recebia mais recursos ilegais em contratos com as maiores empreiteiras do país.
Segundo a ministra do TSE Maria Thereza de Assis, os fatos apurados pela Lava-Jato são graves e demonstram completa distorção no sistema da democracia representativa. “Uma vez comprovadas tais condutas, estaríamos diante da prática de crimes visando à conquista do poder ou sua manutenção, nada muito diferente, portanto, dos períodos bárbaros em que crimes também eram praticados para se atingir o poder. A mera mudança da espécie criminosa não altera a barbaridade da situação”, enfatizou.
Divisão
Em depoimento de delação premiada, Paulo Roberto Costa assegurou que a margem de lucro das grandes obras deveria ser de 10% a 20%, mas as construtoras acrescentavam 3% a título de “ajuste político”, em licitações que eram acertadas antes entre as empresas de um cartel. Nas diretorias de Gás e de Exploração, por exemplo, a comissão, segundo ele, era integral para os petistas. Na de Serviços, responsável por organizar a licitação das outras áreas da empresa, o PT, partido de Lula e Dilma, ficava com 2%. O PP, que comandava a Diretoria de Abastecimento, ficava com 1%. Os outros 2% eram “para atender ao PT”. No esquema pepista, a atividade era conduzida pelo ex-líder do partido na Câmara José Janene (PR), morto em 2010, e, depois, pelo doleiro Alberto Youssef.
No PMDB, que comandava a Diretoria Internacional, partido do presidente interino, Michel Temer, o mesmo procedimento se repetia. Os pagamentos eram operados pelo lobista Fernando Soares, o “Fernando Baiano”. Na subsidiária da estatal Transpetro, comandada à época pelo ex-senador Sérgio Machado (PMDB-CE), a mesma coisa. Paulo Roberto disse ter recebido R$ 500 mil das mãos de Machado entre 2009 e 2010 no apartamento do ex-parlamentar no Rio de Janeiro. O motivo seria a contratação de “alguns navios”, negócio que passou pela Diretoria de Abastecimento. “Foi entregue diretamente por ele”, confirmou o réu.
Antes e depois que saiu da estatal, o próprio Paulo Roberto afirmou que recebia propinas. Do valor de 1% destinado ao PP, em média 60% iam para o partido e 20% se destinavam a despesas operacionais. Nos 20% restantes, Paulo Roberto ficava com 70% e o restante, com Janene ou o doleiro Alberto Youssef. Em uma das ocasiões, o ex-diretor ganhou um carro de luxo de Youssef como pagamento.
Relator
O Tribunal Superior Eleitoral ainda não definiu quem será o relator dos processos. O plenário da Corte vai debater o assunto no próximo dia 23. Ao fim da sessão, Gilmar Mendes disse que o pedido de Maria Thereza é importante para analisar as descobertas da Lava-Jato no âmbito eleitoral.
“É um pedido de investigação para uma análise. Nós estamos fazendo um levantamento de todo esse quadro, para que a Justiça Eleitoral tenha uma consciência mais adequada do que se passou. Essa iniciativa é de se saudar também nesse sentido”, afirmou.
Ontem, o TSE determinou que os técnicos do tribunal apurem as contas da campanha eleitoral do senador Aécio Neves (PSDB-MG) à Presidência da República em 2014. Em abril, o PT denunciou o tucano por ter contratado empresas que seriam de fachada, que não teriam condições de prestar os serviços oferecidos. Todos os partidos políticos citados nas delações e denúncias no âmbito da Lava-Jato afirmam que as doações eleitorais recebidas foram registradas e homologadas pela Justiça Eleitoral.
Depoimento do padre Moacir
As imagens do depoimento do padre Moacir Anastácio de Carvalho, citado na Operação Lava-Jato por ligação com o ex-senador Gim Argello, ao juiz Sérgio Moro foram divulgadas ontem. Conforme adiantou a coluna Eixo Capital na edição desta quinta-feira, a audiência foi realizada na semana passada como parte do processo contra Gim, Valério Neves e Paulo Roxo. No depoimento, o padre que recebeu uma doação da OAS para custear a festa de Pentecostes da Paróquia São Pedro, que fica em Taguatinga. Gim Argello, que frequentou pelo menos oito edições da festa, intermediou o repasse, segundo o religioso. O evento, segundo ele, custa pelo menos R$ 600 mil.
Correio braziliense, n. 19436, 12/08/2016. Política, p. 2