Empreiteiro quer contar tudo sobre Gim

 
07/09/2016
Eduardo Militão

 

Duas semanas depois de perder o pré-acordo de delação premiada e um dia após ser preso novamente, o ex-presidente da OAS José Adelmário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro, resolveu falar. Ontem pela manhã, os advogados conversaram com o juiz da Lava-Jato no Paraná, Sérgio Moro, e formalizaram um pedido para ele ser ouvido no processo em que é acusado de pagar propina ao ex-senador Gim Argello (ex-PTB-DF). À tarde, o magistrado marcou a data do novo interrogatório: terça-feira da semana que vem, às 13h30, em Curitiba.

Ele vai ser ouvido para colaborar com “o esclarecimento dos fatos”. De acordo com o Ministério Público, o ex-executivo liderou um grupo de empreiteiros que queriam se blindar em duas CPIs da Petrobras realizadas em 2014, a fim de evitar depoimentos, apurações e constrangimentos. Gim era o vice-presidente de uma das comissões.

Há pouco menos de duas semanas, em 24 de agosto, Léo Pinheiro negou-se a falar na ação penal de Gim. Fazia dois dias que ele tinha perdido sua negociação de delação premiada com a Procuradoria-Geral da República. Segundo apurou o Correio, o objetivo era evitar passar informações sem ter nenhum benefício em troca.

Na segunda-feira, Pinheiro foi preso por ordem de Sérgio Moro, tendo em vista pedido do Ministério Público Federal de março. A petição integra a investigação da Operação “Vitória de Pirro”, fase da Lava-Jato que prendeu Gim em 12 de abril. Léo Pinheiro é acusado de ser um risco para obstruir as apurações, a exemplo do que fez nas CPIs da Petrobras.

Ontem, o advogado do ex-executivo, Edward de Carvalho, pediu novo interrogatório, “a fim de que (o réu) colabore com os esclarecimentos dos fatos” do caso relacionado à comissão de inquérito e ao ex-senador. De acordo com Edward, a defesa fez “uma avaliação nova” da situação do cliente. “A intenção é colaborar com a instrução”, afirmou. O defensor não quis adiantar quais temas específicos serão explicados por Léo Pinheiro, como e-mails em que ele acerta com outros executivos de construtoras a aproximação a parlamentares das CPIs da Petrobras e o andamento de requerimentos de convocação de representantes de empresas. Para a Polícia Federal e o Ministério Público, Léo Pinheiro era o líder dos empresários que corromperam parlamentares na comissão.

De acordo com o artigo 196 do Código de Processo Penal, “a todo tempo o juiz poderá proceder a novo interrogatório” dos réus em ações criminais. Sérgio Moro concordou em ouvi-lo, mas demonstrou contrariedade no despacho em que marcou a data do novo depoimento. O magistrado fez questão de dizer que o pedido tinha sido feito fora do prazo, depois que todo o processo estava praticamente concluído, restando apenas as alegações finais da acusação e das defesas antes da sentença. “Rigorosamente, não caberia realizar o ato, pois ele já foi interrogado em juízo, embora tenha preferido ficar em silêncio”, relembrou. “Não obstante, a bem da ampla defesa e considerando que é possível que ele esclareça aspectos relevantes do caso penal, resolvo deferir o requerido.”

 

Pedido

O advogado de Gim, Marcelo Bessa, disse que não comentaria o pedido de Léo Pinheiro. “Vou me manifestar nos autos, assim que o juiz oficiar as partes”, afirmou. Gim garantiu a Sérgio Moro, em depoimento, que não recebeu propinas, mas apenas solicitou doações eleitorais de maneira oficial para a sua campanha e de aliados. O ex-senador assegurou que nunca colocou em negociação nenhum tipo de proteção aos empreiteiros que seriam investigados nas CPIs da Petrobras das quais participou. Em uma delas, ele foi vice-presidente.

Segundo a investigação, Gim pediu R$ 35 milhões em dinheiro a sete empreiteiras em troca de blindagem nas comissões de inquérito. O senador obteve R$ 7,2 milhões, pelo apurado até agora. Parte do dinheiro, R$ 350 mil, foi pago à Paróquia São Pedro, em Taguatinga, pela OAS, a pedido do ex-parlamentar. O restante abasteceu o caixa oficial das campanhas do ex-governador José Roberto Arruda (PR); do deputado federal Alberto Fraga (DEM-DF); da deputada distrital Liliane Roriz (ex-PRTB, hoje no PTB); e do ex-candidato a deputado distrital Joaquim Neto (PMN).

 

Lava-Jato prorrogada

O Conselho Superior do Ministério Público Federal prorrogou por mais um ano o funcionamento da força-tarefa da Operação Lava-Jato que atua em Curitiba, no Paraná. O colegiado, presidido pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, estendeu até 8 de setembro de 2017 os trabalhos dos promotores e procuradores que atuam na investigação do esquema de corrupção na Petrobras. Atualmente, a força-tarefa em Curitiba conta com 11 profissionais do Ministério Público dedicados exclusivamente à Lava-Jato e mais três colaboradores que auxiliam nas investigações, coordenadas pelo procurador Deltan Dallagnol. Também foi prorrogado o funcionamento da força-tarefa que atua no Rio de Janeiro com desdobramentos da Lava-Jato ligados a esquema de corrupção na Eletronuclear e em obras da usina de Angra 3.

 

Empresários denunciados

O Ministério Público Federal denunciou Ildefonso Colares Filho, ex-executivo do grupo Queiroz Galvão, e Erton Medeiros, empresário ligado à Galvão Engenharia, alvos da 33ª fase da operação deflagrada em agosto deste ano na Lava-Jato. Segundo a Procuradoria da República, os dois empresários são acusados pelo crime de corrupção ativa pelo oferecimento de R$ 10 milhões em propina, no segundo semestre de 2009, ao então senador Sérgio Guerra (presidente do PSDB-SP, falecido em 2014) e ao deputado federal Eduardo da Fonte (PP-PE) para que a CPI da Petrobras, instalada no mesmo ano, não tivesse resultado efetivo. A CPI tinha o objetivo de apurar, no prazo de 180 dias, irregularidades envolvendo a Petrobras e a Agência Nacional de Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP), o que não ocorreu.

 

Correio braziliense, n. 19462, 07/09/2016. Política, p. 2