Investigação liga PT a desvios em fundos

 
07/09/2016
Eduardo Militão
Antonio Temóteo

 

Relatórios da Polícia Federal e do Ministério Público na Operação Greenfield, que apura investimentos que causaram prejuízos a quatro fundos de pensão de estatais, ligam o Partido do Trabalhadores a irregularidades na escolha das aplicações. De acordo com os investigadores, havia um “núcleo político” com “clara ascendência” sobre diretores dos fundos. Na segunda-feira, a 10ª Vara Federal de Brasília ordenou a prisão de cinco ex-dirigentes de fundos, além de ordens de busca e apreensão e condução coercitiva de empresários e executivos que mantinham negócios com a Previ, a Petros, a Funcef e o Postalis, que pagam aposentadorias complementares para empregados do Banco do Brasil, da Petrobras, da Caixa Econômica Federal e dos Correios, respectivamente. Os investigadores devem aprofundar, em novas fases da operação, a participação de políticos no esquema.

Segundo a polícia e o Ministério Público, o núcleo empresarial de uma organização criminosa fazia reuniões com diretores e presidentes das entidades de previdência “em conjunto — suspeita-se — com autoridades políticas que tinham clara ascendência sobre os diretores dos fundos de pensão que são indicados pelas entidades patrocinadoras”.

O Partido dos Trabalhadores, que comandou o país de 2003 até maio passado, é mencionado abertamente no relatório. Num dos trechos, os policiais e procuradores colocam em dúvidas doações eleitorais feitas pelo grupo J&F, ligado à JBS Friboi, e o investimento em um empreendimento da holding, a Eldorado Celulose. “Há suspeitas ainda sobre os motivos que levaram a Funcef (assim como a Petros) a investir, por meio do FIP Florestal, na Eldorado Brasil Celulose S.A., bem como a aceitar a superavaliação de seus ativos”, destaca um dos relatórios. “Sabe-se que a mencionada empresa é controlada pelo grupo J&F (que detém 47,2% de seu capital), grupo este que é um dos principais doadores de campanha do Partido dos Trabalhadores. Logo, investimento de fundos de pensão federais na Eldorado Brasil Celulose S.A. pode ser resultado da pressão de grupo econômico politicamente dominante.”

 

Pressões

Os relatórios não mencionam nominalmente o PMDB, que comandou o Postalis por determinado período. No entanto, o ex-presidente do fundo Alexej Predtechensky, ligado ao partido, foi alvo de mandado de busca e apreensão e condução coercitiva em seus endereços em Brasília na segunda-feira. Na Funcef, os ex-presidentes Guilherme Lacerda e Carlos Caser são da cota do PT, assim como os ex-dirigentes da Previ Sérgio Rosa, e da Petros Wagner Pinheiro. Os dois partidos não prestaram esclarecimentos ao Correio ontem.

Em vários trechos dos pedidos de prisão, condução coercitiva e buscas, a polícia e a procuradoria mencionam a existência de pressões e lobbies para a realização de determinados investimentos que não produziram o resultado esperado. “Assim como nos casos dos investimentos antes narrados, nesse caso concreto, também se suspeita de que pressões políticas e lobbies realizados por grupos econômicos próximos ao governo federal tenham pressionado a diretoria e os conselhos deliberativos dos fundos de pensão para a realização desse investimento”, insistem.

A proximidade com o ex-ministro José Dirceu e o ex-tesoureiro do PT João Vaccari Neto é apontada como suspeita para Guilherme Lacerda, ex-dirigente da Funcef detido pela PF: “É importante verificar as relações desse investigado com o possível núcleo político da organização criminosa que deve ser investigada na Operação Greenfield”. Para os investigadores, Vaccari “possivelmente” intercedeu para que o fundo ligado à Caixa investisse em empreendimentos da empreiteira OAS.

 

Arbitrariedade

O advogado de Dirceu, Roberto Podval, disse que as avaliações sobre o ex-ministro são “muito prematuras” e destacou que ele é pessoa importante dentro do PT. “Agora, daí ligá-lo a qualquer fato criminoso… é uma distância enorme”, afirmou Anteontem, o presidente do partido, Rui Falcão, criticou o mandado de busca e apreensão contra Vaccari, preso no Paraná, assim como Dirceu. “A operação (…) representa mais uma entre tantas arbitrariedades de que têm sido vítimas Vaccari e seus familiares”, reclamou Falcão, em nota. A defesa de Vaccari não comentou o caso.

A Postalis disse que a atual diretoria, ligada ao PSD, “nunca recebeu qualquer pressão política relacionada aos investimentos do instituto”. A J&F, controladora da Eldorado, afirmou que “sua relação com os fundos de pensão sempre se pautou pela ética e pela impessoalidade”. OAS, Sete Brasil, Previ, Petros, Funcef e Engevix (ligada à RG) não comentaram o caso. A reportagem não localizou representantes da Gradiente, Guilherme Lacerda, Sérgio Rosa e Carlos Caser.

 

Meirelles

Em nota divulgada ontem à noite, o Ministério da Fazenda, afirma que, apesar de ter sido membro do Conselho Consultivo da J&F, o ministro Henrique Meirelles nunca dirigiu a empresa ou a Eldorado Brasil Celulose. A nota diz que Meirelles se limitava a prestar consultoria ao grupo, cujos serviços foram concentrados na montagem do Banco Original. O comunicado relata ainda que, no final do período de prestação da consultoria, o ministro assumiu transitoriamente a presidência do Conselho de Administração da J&F, mas, em nenhum momento, exerceu quaisquer funções executivas na empresa.

 

Correio braziliense, n. 19462, 07/09/2016. Economia, p. 7