Maratona de discursos na véspera do veredito

 

31/08/2016
Julia Chaib
Antonio Temóteo

 

No quinto e penúltimo dia de julgamento da presidente afastada, Dilma Rousseff, senadores debateram, ao longo de mais de 10 horas, as acusações que pairam sobre a petista. O início da sessão foi destinado às falas de uma hora e meia da defesa e da acusação. Depois, cada parlamentar teve direito a 10 minutos de fala na tribuna. O debate, que entrou pela madrugada, antecede o veredito sobre o futuro político de Dilma, que será definido na manhã de hoje.

O Palácio do Planalto trabalha para encerrar cedo o processo, por causa da viagem do presidente interino Michel Temer à China. O peemedebista quer viajar como efetivo e, para isso, precisa tomar posse, o que deve ocorrer nesta tarde. Para isso, havia solicitado medidas para agilizar o julgamento. Senadores, porém, não abriram mão de suas falas na sessão histórica.

O líder do PSDB no Senado, Cássio Cunha Lima (PB), afirmou que a Casa fará justiça com a condenação da presidente afastada, Dilma Rousseff. Segundo ele, toda fraude fiscal feita tem semelhanças com as mentiras da campanha. “As pedaladas e decretos se resumem na maior fraude desse país”, disse. O líder usou ainda seu tempo para rebater a fala do senador Humberto Costa (PT-PE) e afirmou que tanto as Avenidas Paulista quanto a Nossa Senhora de Copacabana são do povo e não só da elite. Líder do PT, Humberto Costa afirmou que o Congresso “nunca engoliu” Dilma. O senador reforçou que a oposição não aceitou a eleição de Dilma e trabalhou para atrapalhar o governo da petista. “Eduardo Cunha operou para destruir Dilma. As propostas do ajuste fiscal foram todas rejeitadas. Quem sabe, se tivessem sido aceitas, hoje nós não precisaríamos estar falando ainda em ajuste fiscal. Bancaram as pautas bomba e apostaram na bancarrota do Brasil”, afirmou.

Protagonista do embate mais duro com a presidente Dilma na segunda-feira, durante o depoimento da petista, o senador Aécio Neves (PSDB-MG) lembrou novamente da campanha às eleições de 2014, da qual saiu derrotado. O tucano afirmou ter alertado Dilma que a economia ia mal. “Disse à presidente, em 20 de outubro, a uma semana da eleição, que as pedaladas fiscais que ela estava patrocinando eram um crime de responsabilidade e que ela ainda iria responder por aquilo. Ela desdenhou, porque existia algo que prevalecia, existia no grupo que governava o país uma prioridade acima de qualquer outra: vencer as eleições”, continuou.

Indo contra a orientação do seu partido, o senador Roberto Requião (PMDB-PR) saiu em defesa da presidente ao dizer que a petista não praticou crime de responsabilidade e criticou o relator do impeachment, Antonio Anastaia (PSDB-MG), ex-governador de Minas Gerais. “Não são as pedaladas ou a tal irresponsabilidade fiscal que a excomungam. O próprio relator da peça acusatória praticou-as, à larga, só que lá, em Minas, não havia um providencial e desfrutável Eduardo Cunha nem um centrão querendo sangue, salivando por sinecuras e pixulecos”, afirmou.

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Collor critica governo e entidades

 

31/08/2016
Antonio Temóteo

 

Em nove minutos e 51 segundos de discurso, durante a sessão de julgamento da presidente afastada, Dilma Rousseff, o senador Fernando Collor de Mello (PTC-AL) não poupou críticas à gestão da petista. Disse que não há um golpe em curso e sinalizou que votará favoravelmente ao impeachment. O primeiro chefe do Executivo Federal cassado na história afirmou que foi vítima de um golpe político “a tramas e ardis de uma aliança de vários vértices”. Após deixar o plenário, o ex-presidente não deu declarações e deixou o Senado Federal pela garagem. Antes de entrar no carro, afirmou a assessores que só voltaria ao Congresso Nacional para participar da votação de hoje, que deve interromper o mandato de Dilma.

Collor aproveitou o pronunciamento para alfinetar os petistas que, em 1992, eram os principais defensores do impeachment. Ele detalhou, sem citar nomes ou siglas, que tentaram culpá-lo por crimes que não cometeu e foi absolvido posteriormente pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “A partir de ocorrências pessoais — e não institucionais —, forças conjugadas simularam uma crise política de governabilidade, forjaram uma instabilidade econômica que não existia e, mais, transformaram hipotética infração comum de um agente privado em crime de responsabilidade do presidente”, disse. O senador ainda relembrou que mesmo eleito pelo povo no primeiro pleito após a redemocratização, foi condenado politicamente.

Apesar das semelhanças com o processo em curso no Senado, Collor avaliou que atualmente a situação é completamente diversa. “Além de infração às normas orçamentárias e fiscais, com textual previsão na Constituição como crime de responsabilidade, o governo afastado transformou sua gestão numa tragédia anunciada”, criticou. Ele ainda destacou que o impedimento de Dilma é o desfecho “de um governo que faz, da cegueira econômica, o seu calvário, e da surdez política, o seu cadafalso”.

 

Entidades

Além das críticas ao governo petista, Collor atacou os movimentos sociais e estudantis que em 1992 apoiavam o impeachment e hoje dizem que o processo em curso no Congresso é um golpe. Primeiro usou um trecho de uma nota assinada por várias entidades, entre elas a Central Única dos Trabalhadores (CUT), o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e a União Nacional dos Estudantes (UNE). Ele detalhou que a crise não é fantasiosa nem orquestrada, mas originada do próprio Poder Executivo, único responsável pela ingovernabilidade que ele mesmo criou e que tenta transferir para outros setores da sociedade, segundo o parlamentar.

Outra entidade criticada por Collor foi a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), que, em 1992, defendeu seu impedimento. Ele parafraseou uma nota pública da OAB em 7 de agosto daquele ano e disse que o país não vive qualquer clima de golpe. “Até porque a nação não suporta mais tal prática. O que o povo brasileiro deseja, e tem manifestado seguidamente, é a decência e a firmeza, traduzidas na transparência e probidade no trato da coisa pública”, disse, antes de deixar o púlpito.

 

Correio braziliense, n. 19455, 31/08/2016. Política, p. 4