Gilmar considera decisão “bizarra”

 
02/09/2016

 

Um dia depois de o Senado decidir pela cassação de Dilma Rousseff, mas manter o seu direito de exercer funções públicas, o presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes, disse que a votação fatiada do processo de impeachment é, “no mínimo, bizarra” e “não passa na prova dos noves do jardim de infância do direito constitucional”. Para o presidente da Corte Eleitoral, o resultado do julgamento de Dilma abre precedente “que preocupa” e pode repercutir “negativamente” nas cassações de mandatos de deputados, senadores e vereadores.

“Há uma singularidade que eu acho que a gente tem de discutir. O que se fez lá (no Senado) foi um DVS (destaque para votação em separado), não em relação à proposição que estava sendo votada, mas em relação à Constituição. O que é, no mínimo, pra ser bastante delicado, bizarro... Fazer um DVS em relação à própria norma constitucional”, comentou Gilmar Mendes a jornalistas.

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Ricardo Lewandowski, responsável por conduzir o julgamento do impeachment, decidiu aceitar o destaque apresentado pela bancada do PT, que pediu que a votação do impeachment fosse dividida em duas partes, e não de maneira conjunta. Dessa forma, Dilma manteve os direitos políticos, embora tenha tido o seu mandato cassado.

“Então, veja, (essa votação fatiada) não passa na prova dos noves do jardim de infância do direito constitucional. É, realmente, do ponto de vista da solução jurídica, parece realmente extravagante, mas certamente há razões políticas e tudo mais que justificam, talvez aí o cordialismo da alma brasileira e tudo isso”, ponderou o presidente do TSE.

“Eu não sei também se os beneficiados dessa decisão ou por essa decisão teriam a mesma contemplação com os seus adversários”, completou Gilmar Mendes. Na avaliação do presidente do TSE, a votação dessa forma é “ilógica”, já que, ao decidir pela aplicação de penas autônomas, o Senado poderia ter eventualmente decidido manter Dilma Rousseff no cargo, mas ter se posicionado favorável à inabilitação dela para exercer funções públicas.

 

Cancelamento

O presidente do TSE disse também não acreditar que a sessão do Senado Federal que decidiu pela cassação do mandato de Dilma seja cancelada. “O tribunal tem sido muito cauteloso com relação a isso, até vocês já estão exaustos sobre esse tema”, afirmou, dirigindo-se aos repórteres.

Já o ex-presidente do Supremo Tribunal Federal Joaquim Barbosa fez uma previsão sobre o destino da votação de quarta-feira. “Acho dificílimo o STF reverter a decisão do Senado de não declarar Dilma inabilitada para o exercício de funções públicas.” Segundo o ministro aposentado, “o raciocínio é simples: se o próprio Senado que a tirou brutalmente do cargo, num segundo momento ‘tirou o pé do acelerador’... irá o STF cassar-lhe um direito que os senadores entenderam por bem preservar? Claro que não. O STF não tem poder para isso. Se tivesse, teria também o poder de reverter a decisão de afastamento. E não tem.”

 

Frase

“O raciocínio é simples: se o próprio Senado que a tirou brutalmente do cargo, num segundo momento ‘tirou o pé do acelerador’... irá o STF cassar-lhe um direito que os senadores entenderam por bem preservar? Claro que não”

Joaquim Barbosa, ex-presidente do STF

 

Correio braziliense, n. 19457, 02/09/2016. Política, p. 3