Delcídio pede "igualdade"

 
03/09/2016
Eduardo Militão
Patrícia Rodrigues

 

Cassado após delatar senadores e confessar crimes na Operação Lava-Jato, o ex-senador Delcídio do Amaral (ex-PT-MS) foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) pedir uma espécie de “drible” na Lei da Ficha Limpa, para que recupere o direito de ser eleito para cargos públicos. Os advogados dele ingressaram com mandado de segurança, alegando que a ex-presidente Dilma Rousseff perdeu o mandato, mas manteve seus direitos políticos. Portanto, a regra deveria valer para Delcídio também. O caso é relatado pelo ministro Celso de Mello.O próximo a recorrer à Justiça deve ser o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), à beira da cassação do mandato por mentir sobre a existência de contas na Suíça, em que se suspeita que o dinheiro tenha origem em propinas desviadas da Petrobras.No recurso apresentado na sexta-feira, os advogados do ex-senador dizem que não pode admitir soluções diferentes no impeachment da petista e do delator. “O que não se pode admitir é que, de um lado, para a ex-presidente valha uma regra (cassação não signifique necessariamente perda dos direitos políticos) e para Delcídio do Amaral valha outra (cassação signifique necessariamente perda dos direitos políticos)”, argumentam Antônio Figueiredo Basto, Tracy Benedelt, Adriano Bretas, Raul Amaral e Matteus Beresa. “Assim, de duas, uma: ou Delcídio foi cassado sem a perda dos direitos políticos, ou o impeachment da ex-presidente é nulo.”

A defesa pede que o Supremo declare nulos todos os atos do processo de cassação do ex-petista desde 9 de maio. Assim, o caso seria reiniciado na Comissão de Constituição e Justiça do Senado. Caso o STF mantenha a cassação de Delcídio, a defesa quer, ao menos, que ele recupere os direitos políticos. Conforme o advogado Márlon Reis, idealizador da Lei da Ficha Limpa, o ex-senador tem quase todos os seus direitos políticos, menos o de ser votado porque o encerramento abrupto do mandato o torna inelegível.

Julgamento
O presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou que a decisão do Senado sobre Dilma também influencia outros julgamentos. Mesmo sem citar Eduardo Cunha, a declaração alertou aliados e opositores do peemedebista para uma ajuda ao deputado no processo de cassação. O julgamento está marcado para 12 de setembro.Apesar de considerar o fatiamento inconstitucional, o deputado Carlos Marun (PMDB-MS) afirma que, uma vez admitido pelo Senado, pode ser considerado no julgamento do aliado. “Não pode ter isso de o pau que der em Chico não dar em Francisco”, afirmou. Ele garante não ter conversado com Cunha para saber a estratégia para o julgamento, mas revela ser “óbvio que a defesa vai se ater a esse fato”.  “O Senado criou algumas jurisprudências para serem acompanhadas na Câmara.”O deputado Júlio Delgado (PSB-MG) concorda com Rodrigo Maia ao dizer que a decisão do Senado abre precedentes. Para ele, os senadores votaram “um arranjo em causa própria”. O deputado argumenta que vários senadores estão envolvidos na Operação Lava-Jato e decidiram pelo fatiamento para se salvaguardar. Delgado acredita, no entanto, que o julgamento de Eduardo Cunha será diferente. “No dia 12, nós votaremos o parecer do Conselho de Ética que já pede a cassação”, informou.Além do processo do Conselho de Ética, Cunha responde a 12 procedimentos criminais e cíveis no Supremo Tribunal Federal e Justiça Federal do Paraná. São duas ações penais, uma ação de improbidade administrativa, cinco inquéritos, dois pedidos de investigação e dois pedidos de medidas cautelares — inclusive a prisão do parlamentar. O deputado; a mulher, Cláudia Cordeiro Cruz; e outros acusados estão com os bens bloqueados. Acusado por quebra de decoro parlamentar, por omitir contas no exterior, Cunha está afastado do cargo desde 5 de maio.

Nomeação “sem efeito” na EBC
Depois de nomear Laerte de Lima Rimoli para exercer o cargo de diretor-presidente da Empresa Brasil de Comunicação S.A. (EBC), o governo publicou uma edição extra do Diário Oficial da União na tarde desta sexta-feira para “tornar sem efeito” a nomeação. Em outro decreto, também publicado ontem, o Executivo suspende a exoneração de Ricardo Pereira de Melo, que ocupa o cargo de diretor-presidente da EBC. Segundo fontes do Planalto, a suspensão dos atos ocorreu porque houve um erro na nomeação e exoneração feitas mais cedo. É que ontem o governo editou uma medida provisória que altera os princípios e os objetivos da EBC, inclusive permitindo a troca de comando da estatal. A avaliação é que a exoneração de Melo e a nomeação de Rimoli não deveriam sair no mesmo dia da MP. O Planalto deve aguardar ainda um posicionamento do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre o caso.

 

Correio braziliense, n. 19458, 03/09/2016. Política, p. 3