O dia D da cassação de Cunha

 

12/09/2016
Julia Chaib

 

Menos de dois anos depois de ser alavancado à Presidência da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ) chega a esta segunda-feira afastado do mandato e em desvantagem no processo de cassação do mandato que enfrenta. Em 1º de fevereiro de 2015, o peemedebista tornou-se presidente com uma força que o fez ditar ritmo próprio às votações e deflagrar o processo de impeachment de Dilma Rousseff. Hoje, 12 de setembro de 2016, a partir das 19h, os colegas que o elegeram vão definir se o peemedebista deve deixar de ser deputado. E na véspera da votação, o parlamentar sofreu mais uma derrota no Supremo Tribunal Federal. No fim da noite de ontem, o ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal, negou o sexto mandado de segurança apresentado pela defesa do deputado pedindo a votação de um projeto de resolução, passível de emendas, no lugar do parecer aprovado no Conselho de Ética por 11 a 9.

Fachin rejeitou a liminar e pediu informações à Câmara sobre os procedimentos adotados no processo de cassação. Cunha argumentou que não deveria ser apresentado em plenário o parecer aprovado no Conselho de Ética, mas sim um projeto de resolução, que permitiria emenda e destaques e uma punição mais branda. Dessa forma, resta ao deputado apenas manobras em plenário. Não há certeza nem mesmo se uma renúncia do mandato antes da sessão teria força o suficiente para livrá-lo da cassação.

A estratégia de Cunha tem sido tentar ao máximo postergar a sessão e conseguir uma pena mais branda, como suspensão do mandato, para que não perca os direitos políticos. A inabilitação é uma consequência de ficar sem o cargo. Em uma tentativa para salvá-lo, aliados vão tentar colocar em votação um projeto de resolução que abre a possibilidade de emenda com a sugestão da pena mais branda, mas a expectativa é de que o processo se encerre hoje. Somente a aprovação de um recurso com efeito suspensivo seria capaz de reiniciar a matéria.

“Não há nenhum fundamento jurídico para justificar a suspensão do processo neste momento. Todas as oportunidades à defesa foram dadas. A tendência, eu penso, é que o relatório seja aprovado”, comentou o relator do processo no Conselho de Ética, Marcos Rogério (DEM-RO), que disse ter sido procurado há duas semanas por deputados que queriam saber quais os efeitos que uma renúncia teria no processo. “Não muda nada. Creio que a esta altura do campeonato, não deve interferir na cassação”, afirmou o relator. Aliados de Cunha ouvidos pelo Correio têm a mesma opinião.

São necessários 257 votos de 512 — Eduardo Cunha não vota —, maioria absoluta, para cassá-lo. Nem os antigos aliados, como integrantes do centrão, grupo de 13 partidos pequenos e médios que tradicionalmente o apoiam, estão unidos para ajudá-lo. Deputado a cinco mandatos, reconhecido por seus aliados e adversários por ser um distinto estrategista, Cunha conseguiu impor uma série das chamadas pautas-bomba, e tornou-se um exímio intérprete do regimento interno da Casa, ao passo que conseguia encontrar brechas no documento para justificar suas ações. Em julho do ano passado, Cunha antecipou-se à decisão do PMDB, e declarou-se opositor ao governo da então presidente, Dilma Rousseff.

 

Almoço

No Conselho de Ética da Câmara, o processo por quebra de decoro parlamentar foi instaurado em novembro de 2015 e demorou mais de oito meses para ser concluído — o mais longo do colegiado. Entre os motivos para a demora, estão as manobras que o deputado aplicou. Foram diversas as medidas protelatórias. Com o passar do tempo (veja Cronologia abaixo), as denúncias contra Cunha foram ganhando força e suas alianças, tornando-se mais frágeis, ainda mais depois de ter sido suspenso do mandato em maio. Afastado da Presidência, assumiu em seu lugar o primeiro vice-presidente, Waldir Maranhão, rejeitado pela maioria dos parlamentares. O desgaste foi tamanho que Cunha lançou mão de mais uma estratégia para tentar se livrar da cassação e ver seu recurso na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) e renunciou à presidência da Casa, em 7 de julho, após pedidos de aliados. O peemedebista anunciou a decisão na Câmara, em um discurso no qual tentou se vitimizar e chorou.

Na véspera da votação que decidirá o seu destino político, Cunha almoçou com a mulher em um restaurante italiano no Lago Sul. Ao chegar no local por volta das 16h, Cunha foi cumprimentado por amigos. Ele bebeu um vinho Sasarolo, que custa cerca de R$ 240.

 

Cronologia

2015

Março

Após ter o nome envolvido em delações premiadas, o então presidente da Câmara, Eduardo Cunha, presta depoimento voluntário à CPI da Petrobras para se defender.

 

13 de outubro

PSol e Rede pedem o afastamento de Cunha no Conselho de Ética por quebra de decoro parlamentar.

 

3 de novembro

O processo por quebra de decoro parlamentar contra Eduardo Cunha é instaurado no Conselho de Ética. Cunha responde pela acusação de ter mentido à CPI da Petrobras ao negar ter contas no exterior.

 

16 de novembro

Deputado Fausto Pinato (PRB-SP) apresenta relatório pela admissibilidade do processo contra Eduardo Cunha. Ele foi criticado por se posicionar antes do prazo máximo, em 19 de novembro.

 

9 de dezembro

O primeiro vice-presidente da Câmara, deputado Waldir Maranhão (PP-MA), decide que Fausto Pinato deve ser afastado da relatoria por ser do mesmo bloco de Cunha no Conselho de Ética. Depois de novo sorteio, o deputado Marcos Rogério (PDT-RO) é escolhido para assumir a função.

 

10 de dezembro

Rogério anuncia que apresentará o relatório em uma semana. Deputados Zé Geraldo (PT-PA) e Wellington Roberto (PR-PB), aliado de Cunha, trocam tapas na sessão.

 

15 de dezembro

O relator apresenta o parecer, que é aprovado por 11 a 9 no colegiado.

 

16 de dezembro

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pede o afastamento de Cunha por usar o cargo para obter vantagens ilícitas.

 

2016

2 de fevereiro

Em resposta a questão de ordem proposta pelo deputado Carlos Marun (PMDB-MS), um dos integrantes da tropa de choque de Cunha, Waldir Maranhão anula a votação do parecer de Marcos Rogério.

 

17 de fevereiro

Marcos Rogério lê novo parecer também pela continuidade do processo e inclui novos elementos apresentados pelo PSol.

 

23 de fevereiro

A defesa do peemedebista entra com mandato de segurança no Supremo para que o conselho seja obrigado a responder sobre um pedido de afastamento do presidente do colegiado José Carlos Araújo (PR-BA) antes da retomada dos trabalhos.

 

2 de março

O STF decide tornar Eduardo Cunha réu em uma das investigações da Lava-Jato. É o primeiro político a ficar nessa condição no âmbito da operação.

 

5 de março

Eduardo Cunha é afastado do mandato de deputado federal e da Presidência da Câmara após o STF julgar procedente, por 11 votos a zero, o pedido de afastamento feito pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, no ano anterior.

 

7 de junho

Aliado de Cunha, o deputado João Carlos Bacelar (PR-BA) apresenta um voto em separado — relatório alternativo ao de Marcos Rogério, com uma punição mais branda. O parlamentar propõe a suspensão do mandato por três meses no lugar da cassação.

 

14 de junho

O Conselho de Ética aprova, por 11 votos a 9, o parecer do deputado Marcos Rogério, pela cassação do deputado Eduardo Cunha por quebra de decoro parlamentar.

 

23 de junho

Cunha recorre à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), apontando 16 argumentos que pedem a nulidade do processo.

 

14 de julho

Por 48 votos a 12, a CCJ rejeita o parecer do relator Ronaldo Fonseca (SD-DF) que acatou um dos argumentos apresentados por Cunha no recurso e pedia que o processo retornasse ao Conselho de Ética. O processo segue para o plenário.

 

Hoje

Data em que está marcada a votação do parecer em plenário.

 

Correio braziliense, n. 19467, 12/09/2016. Política, p. 2