Valor econômico, v. 17, n. 4119, 26/10/2016. Brasil, p. A4

União deve assumir dívida com Petrobras

Por: André Ramalho e Rodrigo Polito

 

O governo já está avaliando alternativas de como irá pagar a Petrobras ao final da revisão do contrato da cessão onerosa, assinado em 2010 e pelo qual a estatal obteve o direito de produzir 5 bilhões de barris de petróleo no pré-sal. O secretário de Petróleo e Gás Natural do Ministério de Minas e Energia, Márcio Félix, disse ontem que "tudo leva a crer" que a petroleira sairá como credora ao final das negociações e que alternativas de pagamento estão sendo avaliadas pela União.

A questão é que, por lei, a União não pode pagar a Petrobras com óleo, mas a crise fiscal pela qual passa o país também dificulta o pagamento em dinheiro. Uma possibilidade, segundo exemplo citado por Félix, seria leiloar os volumes dos excedentes da cessão onerosa para outras petroleiras.

Nesse caso, os recursos oriundos nessas licitações seriam utilizados para pagamento à estatal. "Pode ser uma solução desse tipo", disse Félix a jornalistas, destacando, contudo, que não existe qualquer definição sobre o assunto dentro do governo.

"Tudo leva a crer que a Petrobras tenha algo a receber. Agora esse valor é que está em discussão", disse o secretário, que considera "difícil" que qualquer eventual remuneração à petroleira ocorra ainda no primeiro semestre do ano que vem.

Félix disse que o governo está concentrado, hoje, em "fechar o entendimento com a Petrobras" de "quanto um deve para o outro". "Até o fim do ano pretendemos ter as duas contas [da Agência Nacional de Petróleo e da Petrobras] e tentar chegar a um acordo de quanto é o valor [da renegociação do contrato]. Aí depois vamos discutir como paga", afirmou o secretário.

A Petrobras adquiriu em 2010 o direito de produzir até 5 bilhões de barris, por US$ 42 bilhões. A revisão dos parâmetros do negócio está prevista no contrato original e tem potencial para gerar perdas bilionárias, tanto para a Petrobras quanto para a União.

O contrato previa uma rodada de renegociação desses parâmetros após a declaração de comercialidade das áreas envolvidas, que esbarrou na grande volatilidade dos preços do petróleo. Isso porque, na época da assinatura do contrato, o preço de referência de venda do barril estava próximo dos US$ 80, mas desde 2014 os preços da commodity caíram de forma acentuada e, atualmente, giram em torno dos US$ 50 o barril.

O problema é que o acordo firmado entre a Petrobras e a ANP em 2010 não é claro sobre qual a "data de referência" a ser considerada para a fixação do preço de petróleo utilizado na renegociação. Segundo Félix, no entanto, "aparentemente a União tem que pagar a Petrobras". "O valor eu não sei", disse.

O secretário esteve presente, ontem, na Rio Oil & Gas, um dos principais eventos do setor petrolífero no país. Para uma plateia de executivos da indústria de óleo e gás, Félix deu uma nova sinalização de alinhamento do discurso do governo federal com a agenda do setor, ao anunciar que espera adotar um calendário de rodadas de licitações de blocos exploratórios anuais.

A criação de um calendário de leilões é um dos principais pleitos das empresas de petróleo e deve ser um dos principais pontos da nova política de exploração e produção que o governo prepara para lançar no ano que vem, segundo Félix.

"Uma das coisas que imagino que saia dessa política é o ritmo que vamos ter de leilões, de ofertas de áreas no país, se vamos explorar recursos não convencionais ou não. Um dos produtos que a gente espera, fruto dessa análise, é um calendário. Espero que a gente tenha um leilão por ano, pelo menos", disse.

Para o ano que vem estão previstas a "rodadinha" de áreas com acumulações marginais, a 14ª rodada de blocos exploratórios e o leilão de áreas unitizáveis do pré-sal. O principal ativo dessa licitação será a área da União adjacente a Carcará

(BM-S-8). A parte da descoberta que será licitada em 2017 tem cerca de 2,2 bilhões de barris de petróleo "in situ" (total de óleo, ainda não aprovado, contido em um reservatório e não necessariamente recuperável), segundo estimativas da ANP.

Félix apresentou outras medidas que prometem destravar os investimentos no setor. Entre outros pontos, disse que novas diretrizes da política de conteúdo local devem ser discutidas na próxima reunião do Conselho Nacional de Política Energética (CNPE), em dezembro, e que o governo prepara mudanças também na regulação do setor de downstream (refino e distribuição de combustíveis). Segundo ele, as diretrizes já estão sendo discutidas com o mercado e devem ser divulgadas no primeiro trimestre de 2017.

A ideia é tratar de pontos como o acesso à infraestrutura logística e regras de comercialização. "O objetivo é atrair investimentos, fazer com que mercado seja mais competitivo", afirmou.