O governo não é "tão idiota"

 
15/09/2016
Naira Trindade

 

Reconhecido por ser polido com as palavras, o presidente Michel Temer resolveu endurecer o discurso para reforçar o posicionamento em relação às medidas que pretende implantar no seu governo a partir de agora. Em defesa das reformas trabalhistas e da Previdência, Temer afirmou não ser “tão idiota” a ponto de restringir direitos dos trabalhadores e para acabar com saúde e educação. O tom mais agressivo, segundo especialistas, ganha força com a saída da interinidade e após a definição da cassação do ex-deputado aliado Eduardo Cunha (PMDB-RJ).

“É muito desagradável imaginar que um governo seja tão, se me permite a expressão um pouco mais forte, tão estupidificado, tão idiota, que chega ao poder para restringir direitos dos trabalhadores, para acabar com saúde, para acabar com educação. Estou tomando a liberdade de pedir, ouvir, dizer essas coisas, porque isso vai pegando, vai passando de um para outro, e as redes sociais hoje têm um poder extraordinário. Então é preciso combatê-los e vou combatê-los, porque não vamos permitir que se faça de outra maneira”, enfatizou Michel Temer.

O presidente aproveitou a cerimônia no Palácio do Planalto para divulgação do repasse de R$ 1 bilhão para oferta de 1.401 novos serviços em santas casas e hospitais filantrópicos, custeio de 99 unidades de pronto atendimento (UPAs) e expansão da oferta de medicamentos para explicar os desencontros de informações em relação à jornada de 12 horas de trabalho. “Isso tudo resultou do encontro do ministro do Trabalho (Ronaldo Nogueira) com alguns sindicatos”, disse. “Portanto, não é um projeto definitivo, acabado, é uma mera alocução discursiva”, justificou.

Ao subir o tom no discurso, segundo especialistas, Temer adotou a nova postura que pretende seguir como representante efetivo do país. “Era necessário que o presidente deixasse a postura mais passiva e mais paciente e contraditasse para que os defensores do governo tivessem um pouco mais de tranquilidade para trabalhar e se posicionar”, analisou o cientista político e presidente do Instituto Brasileiro de Pesquisa Social (IBPS), Geraldo Tadeu Moreira Monteiro.

Para o cientista político Murillo de Aragão, presidente da Arko Advice Análise Política e Pesquisas, Temer reafirma a posição mencionada na posse. “O discurso reafirma essa postura em relação à contra-informação que a oposição faz em relação às reformas”, disse. “É natural que o discurso precisa enquadrar sua postura dentro da situação do governo. A postura dele mudou na primeira reunião, ao dizer que era presidente e pronto”, avaliou Aragão.

 

Sacrifícios

No discurso, Temer reconheceu que serão necessários “sacrifícios”. “Quero mais uma vez dizer que nós temos que, naturalmente, ter sacrifícios, mas não vamos tirar direito de ninguém, porque essas vozes todas desconhecem que a responsabilidade fiscal é pressuposto de qualquer sistema público de saúde ou de educação. Não há a menor dúvida disso. Por isso, desconhecem que a proposta de teto não obriga, reitero, qualquer redução de gastos em saúde e educação”, alegou.

Mais cedo, o peemedebista havia divulgado um vídeo nas redes sociais, em que reafirmava que o governo não impedirá que o trabalhador saque o saldo do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) em caso de demissão. “De vez em quando, se divulgou que quem tivesse perdido seu emprego por despedida injusta não poderia sacar os valores do FGTS. Não é verdade. Este é o primeiro esclarecimento que quero fazer. Não há nenhum pensamento a respeito dessa matéria no governo, ou seja, o fundo de garantia continuará a exercer seu papel, como vem exercendo ao longo do tempo”.

 

Frase

"É muito desagradável imaginar que um governo seja tão idiota que chega ao poder para restringir direitos dos trabalhadores, para acabar com saúde, para acabar com educação”

Michel Temer, presidente da República

 

Correio braziliense, n. 19470, 15/09/2016. Política, p. 5