Com 14 governadores ameaçando decretar estado de calamidade a partir da semana que vem, o presidente Michel Temer está sob fogo cruzado. Segundo estimativas não oficiais, serão necessários de R$ 20 bilhões a R$ 24 bilhões para atender ao pleito dos estados do Norte, do Nordeste e do Centro Oeste, além de Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul, que não conseguem honrar os compromissos com a folha de pessoal. O socorro poderá inviabilizar a meta de fechar as contas públicas com deficit de, no máximo, R$ 170,5 bilhões neste ano. Caso isso ocorra, Temer perderá definitivamente a credibilidade perante o mercado, avisam analistas.
Se não atender aos estados, porém, o presidente corre o risco de não conseguir a aprovação do Congresso às propostas de reforma fiscal, já que os governadores poderão pressionar as bancadas para travar votações de matérias fundamentais, como a emenda constitucional que limita o crescimento dos gastos do governo. “Temer está entre o fogo e a caldeira. Se agradar um determinado grupo, vai desagradar o outro. Qualquer escolha implicará desgaste”, resumiu o professor de sociologia e política do Insper Carlos Melo. Para ele, o governo criou um precedente com o socorro emergencial de R$ 2,9 bilhões ao Rio, no mês passado, para a realização da Olimpíada. “Agora, a percepção de todos é que se apertar um pouco, o governo cede”, pontuou.
A secretária do Tesouro Nacional, Ana Paula Vescovi, sinalizou que não haverá socorro imediato aos estados e garantiu que “o governo vai cumprir a meta” fiscal. “Estamos pedindo aos governadores que esperem até outubro, quando começará a repatriação de ativos do exterior, pois uma parte do dinheiro será destinada ao Fundo de Participação dos Estados”, disse ela. Ana Paula destacou que a crise que corrói as receitas da União e impede o crescimento da economia é o descontrole fiscal, “principalmente no governo federal”.
Risco moral
Na avaliação do economista Thiago Biscuola, da RC Consultores, se ceder às pressões dos governadores, o Planalto dará um péssimo sinal ao mercado. “Faria muito mal à credibilidade do governo federal, porque abriria um precedente. É uma espécie de “moral hazard” (risco moral), que põe em xeque a necessidade de arrumar as contas, já que a União vai socorrer quando for preciso”, criticou.
Herança maldita
Em café da manhã ontem, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, e o presidente da Câmara, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), afinaram o discurso e classificaram o descontrole fiscal como uma “herança maldita” do governo anterior. Meirelles não precisou quando enviará ao Congresso a reforma da Previdência, mas defendeu a aprovação da PEC do teto dos gastos “o mais rápido possível”.
Correio braziliense, n. 19470, 15/09/2016. Economia, p. 9