Mercado aposta em deficit maior em 2017

 
16/09/2016
Rosana Hessel

 

Começa a ganhar corpo a desconfiança dos agentes econômicos e do mercado sobre a capacidade de o presidente Michel Temer de reequilibrar as contas públicas. Após o fim da interinidade do governo, as previsões para o desempenho fiscal estão cada vez mais pessimistas, o que abre caminho para uma piora das expectativas macroeconômicas, principalmente, a de inflação. Isso porque crescem as chances de a equipe econômica não conseguir avançar com as reformas no Congresso Nacional neste ano, causando uma explosão da dívida pública para cobrir os gastos acima da receita.

O Prisma Fiscal — levantamento elaborado pelo Ministério da Fazenda, com expectativas do mercado — registrou piora nas estimativas para o resultado primário do governo central (Tesouro Nacional, Banco Central e Previdência Social) deste ano e do próximo. A mediana das estimativas  prevê estouro da meta fiscal, de deficit de R$ 139 bilhões, estipulada pela Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017. Em julho, o deficit primário (diferença entre a receita líquida e a despesa) esperado para o ano que vem era de R$ 138,6 bilhões. Em agosto, passou para R$ 140,1 bilhões.

Os mais pessimistas, no entanto, preveem que o rombo chegará a R$ 200 bilhões, como é caso do economista-chefe da Gradual Investimentos, André Perfeito. A mediana das expectativas para o deficit primário de 2016 também aumentou. Passou de R$ 158,8 bilhões para R$ 160,4 bilhões, mas ficou abaixo da meta fiscal, de um rombo de até R$ 170,5 bilhões. “Agora que o impeachment (da ex-presidente Dilma Rousseff) foi confirmado, está começando a cair a ficha no mercado de que o ajuste fiscal não vai acontecer”.

Para ele, quando os analistas começarem a incluir essa piora nas contas públicas em seus modelos, certamente, as projeções de inflação vão voltar a subir. Isso, segundo ele, deve ocorrer no fim deste ano, justamente quando o Banco Central terá que decidir se cortará ou não os juros. Perfeito demonstrou preocupação com o otimismo da equipe econômica estampado no Orçamento de 2017, enviado ao Congresso no último dia 31.

Na peça orçamentária, o governo espera crescimento de 1,6% no Produto Interno Bruto (PIB) no ano que vem, e, com isso, a receita deverá crescer pelo menos o dobro dessa taxa. Enquanto o governo prevê inflação de 7,2% neste ano, há quem acredite que a carestia vai demorar para ceder, ficando em 9%, pelas estimativas da Capital Economics. A consultoria estima que a dívida pública bruta chegará a 85% do PIB, no ano que vem, e a 90% do PIB, em 2018. Já o governo prevê taxas de 75,8% e 77,2%, respectivamente.

O economista da Gradual Investimento não acredita que a economia conseguirá atingir uma expansão superior a 1% no ano que vem e, por isso, a receita prevista no Orçamento com base em um crescimento de 1,6% está superestimada. “Não consigo enxergar de onde vem esse crescimento de receita porque a demanda pelo consumo ainda não vai crescer, devido ao desemprego elevado.

O relator do Orçamento, o senador Eduardo Braga (PMBD-AM) também demonstrou preocupação com as projeções enviadas pelo governo, principalmente, a que prevê aumento de 2,4% para 7,4% na massa salarial entre 2016 e 2017. “Esse é o dado que mais me deixou intrigado, achei um pouco superestimado”, disse.

Na avaliação do economista Thiago Biscuola, da RC Consultores, essa massa salarial está superestimada e distorce a previsão de receita. “Para a massa salarial crescer mais de 7%, é preciso um salto muito forte na população ocupada, algo muito difícil na conjuntura atual. Ainda vai demorar para a economia crescer de forma acelerada capaz de suportar um aumento dessa magnitude”, pontuou.

 

Correio braziliense, n. 19471, 16/09/2016. Economia, p. 9