Temer articula reunião; Cármen Lúcia recusa

Tânia Monteiro / Carla Araújo

26/10/2016

Fracassou ontem a tentativa do presidente Michel Temer de promover uma conciliação entre os presidentes do Supremo Tribunal Federal, ministra Cármen Lúcia, e do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), em encontro que desejava realizar hoje no Palácio do Planalto.

O presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia (DEM-RJ), também havia sido convidado para o encontro, que não será mais realizado, depois de Cármen Lúcia não confirmar sua presença a Temer.

A presidente do Supremo rebateu ontem as críticas feitas por Renan ao juiz de primeira instância Vallisney de Souza Oliveira, responsável pela Operação Métis, que prendeu integrantes da Polícia Legislativa do Senado na sexta-feira passada.

À tarde, o presidente do Senado disse que “faltou uma condenação de usurpação da competência do Supremo por um juiz de primeira instância”.

O convite do presidente da República a Cármen Lúcia foi feito por telefone. Temer estava com Renan em seu gabinete e, com a concordância do presidente do Senado, teve a iniciativa de ligar para a presidente do Supremo, a fim de convencê-la de que o encontro seria benéfico, já que poderia selar a harmonia entre os Poderes.

Cármen Lúcia, de imediato, não recusou o convite, mas afirmou que estava com “dificuldades de agenda” e que daria uma resposta mais tarde. Ontem, pelo terceiro dia consecutivo, Renan esteve com Temer.

Temer quer evitar que a crise possa atrapalhar seus planos e colocar em risco a agenda econômica no Congresso. Além da negativa de Cármen Lúcia, Temer tem um outro problema a administrar: Renan já avisou que não se senta à mesma mesa que o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Originalmente, a reunião entre a cúpula dos Três Poderes estava marcada para a próxima sexta-feira, no Itamaraty, e a pauta seria segurança pública, ou seja, obrigatoriamente teria a presença de Moraes. Com isso, as duas primeiras possibilidades de encontro entre os chefes dos Poderes foram enterradas.

 

Governo. A ordem no Palácio do Planalto é de minimizar a crise. Mesmo após novos ataques de Renan a Moraes, os assessores do presidente da República avisaram ao ministro da Justiça que era para ele não revidar e tentaram colocar “panos quentes” na situação.

Moraes, que foi chamado por Renan de “chefete de polícia”, tem protagonizado polêmicas.

No entanto, o presidente não está discutindo, neste momento, a possibilidade de substituí-lo, até mesmo pela dificuldade relatada de encontrar um nome para a pasta. Além disso, uma troca poderia criar uma nova “marola” em um momento importante de votação no Congresso.

Apesar de a reunião de hoje ter sido cancelada, Renan pode voltar a se encontrar com Temer no Planalto. Embora o governo esteja satisfeito com a proximidade de Renan do Planalto – pois precisa dele para acelerar e aprovar o PEC que limita os gastos públicos –, interlocutores de Temer demonstram receio com o comportamento considerado intempestivo do presidente do Senado.

Alguns chegam a comparar a postura de Renan à adotada pelo ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que abriu diversas frentes de guerra e acabou preso na Operação Lava Jato. Renan é investigado em 11 inquéritos no Supremo.

Para assessores palacianos, a estratégia de confrontar o Judiciário poderá não ser boa para o presidente do Senado.

Tensão

“Enquanto o juiz de primeiro grau usurpar a prerrogativa do STF, não dá para chamá-lo no aumentativo.”

 

O Estado de São Paulo, n. 44934, 26/10/2016. Política, p. A5