Valor econômico, v. 17, n. 4116, 21/10/2016. Empresas, p. B4

MPF denuncia 21 pessoas no caso Samarco

Entre os denunciados por homicídio estão ex-presidente, Vescovi, e executivos de Vale e BHP

Por: Marcos de Moura e Souza

 
 

O Ministério Público Federal denunciou 21 pessoas por homicídio no caso da tragédia da mineradora Samarco, ocorrida há quase um ano. Entre os denunciados estão o ex-presidente da companhia Ricardo Vescovi, além de funcionários da Vale e da BHP Billiton, proprietárias da Samarco. Eles também foram acusados de crimes de inundação, desabamento e lesões corporais graves, todos com dolo eventual e por crimes ambientais.

Caso a Justiça aceite a denúncia, elas poderão ser condenados a até 54 anos de prisão. Samarco, Vale e BHP foram denunciadas por 12 tipos de crimes ambientais.

Em 5 novembro de 2015, uma das barragens de rejeito de minério de ferro da Samarco, em Mariana (MG), se rompeu provocando 19 mortes além de um enorme desastre ambiental.

Procuradores do MPF de Minas Gerais e do Espírito Santo já haviam ingressado com um pedido para que as mineradoras arquem com R$ 155 bilhões em ações de recuperação dos danos provocados pela tragédia. A Justiça ainda não decidiu se aceita ou não o pedido.

Na denúncia de homicídio, divulgada ontem, os procuradores apontaram que na época do acidente, funcionários e executivos denunciados tinham ciência dos riscos do desmoronamento da barragem de Fundão. O texto diz que os "os denunciados optaram por uma política empresarial de priorização de resultados econômicos em detrimento de práticas de segurança para o meio ambiente e para as pessoas potencialmente afetadas, assumindo todos os riscos da causação das mortes".

Em entrevista à imprensa em Belo Horizonte, José Adércio Leite Sampaio, procurador e coordenador da força-tarefa do MPF que trata do caso, afirmou que os depoimentos colhidos na investigação indicaram que a segurança foi relegada. "O aumento da produção da Samarco procurou compensar a queda do valor do minério de modo a não só se manter, mas também a aumentar o lucro e os dividendos das suas acionistas Vale e BHP", disse ele, segundo nota do MPF de Minas Gerais.

Os procuradores também acusaram a Samarco de ter desrespeitado um manual de operações, revisado em 2012, com procedimentos que a empresa deveria seguir.

"Ainda que obsoletas por não ter havido atualização desde 2012, algumas premissas que permaneciam válidas no Manual foram desrespeitadas pela empresa, configuradas falhas operacionais graves que concorreram para o rompimento da barragem em 2015", afirmou Adércio.

A Samarco foi obrigada a interromper suas atividades logo depois do acidente com a barragem de Fundão e está parada até hoje. A empresa tenta reaver licenças para voltar a operar.

Recentemente, um estudo independente feito por especialistas estrangeiros - contratados por Vale e BHP - apontou que o rompimento de Fundão foi resultado de uma sucessão de problemas na barragem que começaram a aparecer em 2009. Os especialistas não apontaram responsáveis pelo rompimento.

Além de Ricardo Vescovi, foram denunciados pelo MPF o então diretor de Operações e Infraestrutura da Samarco, Kleber Luiz de Mendonça Terra. Estão na lista também três gerentes operacionais e 11 integrantes do Conselho de Administração da empresa. Há ainda mais cinco representantes de Vale e BHP Billiton.

Engenheiros da VOGBR Recursos Hídricos e Geotecnia, empresa que prestava serviços para a Samarco, foram denunciado e acusados de terem falseado um laudo ambiental no qual atestavam a estabilidade de barragem.

A Samarco disse que não tinha "qualquer conhecimento prévio de riscos" de que Fundão pudesse ruir. Disse também que o MPF desconsiderou sua defesa. "A barragem de Fundão era regularmente fiscalizada, não só pelas autoridades como também por consultores internacionais independentes", disse a empresa.

A Vale também disse que os procuradores desprezaram provas que, segundo a companhia, "evidenciaram a inexistência de qualquer conhecimento prévio de riscos reais à barragem de Fundão pela Vale por seus executivos e empregados". A BHP disse apenas que tomou conhecimento do anúncio da denúncia.