Pf detém policiais do Senado e cresce tensão no Congresso

22/10/2016

A Polícia Federal prendeu ontem quatro policiais legislativos do Senado, suspeitos de atuar para atrapalhar investigações da Lava Jato e de outras operações contra senadores e ex-senadores. Os agentes são acusados de fazer varreduras para identificar eventuais escutas ambientais e telefônicas instaladas pela PF nos imóveis dos políticos.

A ação provocou reação imediata do presidente da Casa, Renan Calheiros (PMDB-AL), que defendeu a legalidade das atividades (mais informações na pág. A6). No fim do dia, Renan e o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, trocaram farpas por causa da operação.

A operação ocorreu no momento em que o Senado se prepara para retomar o debate sobre o projeto que altera a lei de abuso de autoridade – a proposta que pune agentes públicos é alvo de questionamentos por investigadores e entidades do Ministério Público e Judiciário.

As investigações mostraram que a Polícia Legislativa fez inspeção nas casas dos senadores Fernando Collor (PTC-AL) e Gleisi Hoffmann (PT-PR), em dias após os imóveis serem alvo de mandados de busca e apreensão da PF na Lava Jato. O motivo seria a “insegurança” dos congressistas com a possível presença de dispositivos de captação de áudio e imagens.

Também houve “pente-fino” em endereços do ex-senador José Sarney (PMDB-AP), que já não tem mais vínculo com o Senado, e até de terceiros. Os policiais legislativos fizeram rastreamento em endereço de Brasília descrito no inquérito como “escritório de lobby” de Sarney. Ele próprio pediu a ação.

Estiveram ainda em salas e na casa do então senador Edison Lobão Filho (PMDB-MA), entre julho e agosto de 2014, em Brasília e em São Luís. Naquele período, ele concorria ao governo do Maranhão e era investigado pela PF. Em setembro, o avião em que o congressista fazia campanha chegou a ser alvo de mandado de busca e apreensão. Conforme as investigações, em São Luís, os policiais legislativos fizeram varredura até na casa do genro do então candidato, Marcos Regada. Lobão Filho é filho do senador Edison Lobão (PMDB-MA), também investigado na Lava Jato.

“A deliberada utilização de um equipamento sofisticado, de propriedade do Senado, utilizando recursos públicos, passagens aéreas custeadas pelo erário e servidores concursados, em escritórios ou residências particulares, não possui outro objetivo senão o de embaraçar a investigação de infração penal que envolve organização criminosa”, afirmou o procurador Frederico Paiva.

Varreduras. A investigação foi aberta depois que três agentes do Senado desconfiaram que ações rotineiras de contrainteligência, normalmente usadas para detectar escutas clandestinas e equipamentos de vídeo em gabinetes, estavam sendo ordenadas para dificultar a apuração de casos de corrupção. Segundo eles, em meados de 2014 o diretor da Polícia Legislativa, Pedro Ricardo Araújo de Carvalho, passou a solicitar varreduras não apenas nas dependências do Senado, mas em imóveis oficiais e particulares e escritórios políticos de senadores.

Além de Pedro Ricardo, apontado como chefe da organização criminosa, foram presos temporariamente Everton Taborda, Antonio Tavares e Geraldo Cesar de Deus Oliveira. Por decisão do juiz Vallisney de Souza Oliveira, eles podem ser soltos antes. Ontem, até a conclusão desta edição, Oliveira, Taborda e Tavares já haviam sido liberados após prestar depoimentos. O juiz confirmou que os pedidos partiam de autoridades do Senado. / FÁBIO FABRINI, FABIO SERAPIÃO, ERICH DECAT, JULIA LINDNER, JULIA AFFONSO, MATEUS COUTINHO e FAUSTO MACEDO

 

PARA ENTENDER

Criada em 1950 como secretaria

Criada em 1950 como um Serviço de Segurança, a Polícia Legislativa do Senado ganhou caráter de Secretaria em 2002. Mas foi durante a gestão José Sarney (PMDB-AP) e Renan Calheiros (PMDB-AL) que a secretaria cresceu e ganhou departamentos que vão além da segurança do patrimônio do prédio. Segundo uma resolução da Mesa Diretora do Senado, a Polícia Legislativa deve prover a segurança do presidente da Casa, em qualquer território nacional e do exterior, e dos demais senadores nas dependências “sob responsabilidade do Senado”. O salário inicial de um policial legislativo é de R$ 16.014,16.

 

OPERAÇÃO MÉTIS

● Quatro policiais legislativos foram presos ontem durante operação da PF por suspeita de atrapalhar as investigações da Operação Lava Jato

 

Crimes investigados

● Associação criminosa armada

● Corrupção privilegiada

● Embaraço à investigação de infração penal que envolva organização criminosa

 

Presos

Segundo a PF, “foram obtidas provas de que o grupo, liderado pelo diretor da polícia do Senado, tinha a finalidade de criar embaraços às ações investigativas da Polícia Federal de senadores e ex-senadores, utilizando-se de equipamentos de inteligência”

 

Pedro Ricardo A. Carvalho

diretor da polícia do Senado

 

Geraldo Cesar de Deus Oliveira*

Policial legislativo

 

Everton Taborda*

Policial legislativo

 

Antonio Tavares*

Policial legislativo

 

Delator

Um policial legislativo afirmou, em delação premiada, que servidores públicos – utilizando equipamentos do Senado – fizeram varreduras em imóveis particulares e funcionais ligados a três senadores e a um ex-parlamentar – todos investigados na Lava Jato:

 

Políticos citados

Segundo o delator, o objetivo era fazer a chamada contrainteligência: localizar e destruir eventuais sistemas utilizados para escutas telefônicas e ambientes; de acordo com ele, políticos teriam sido beneficiados pela ação do grupo

Fernando Collor (PTC-AL) senador,  Lobão Filho (PMDB-MA) ex-senador , Gleisi Hoffmann (PT-PR) senadora, José Sarney (PMDB-AP) ex-senador

 

 

O Estado de São Paulo, n. 44930, 22/10/2016. Política, p. A4