Medidas contra violência

 
20/09/2016
Natália Lambert

 

O Ministério da Justiça tem até o fim do mês para apresentar ao Tribunal de Contas da União (TCU) o plano de ação referente à implementação do Programa Nacional de Redução de Homicídios. Em uma tentativa de colaborar com a proposta, o Fórum Brasileiro de Segurança Pública reuniu ideias que vêm sendo debatidas por especialistas desde a década de 1990 e traçou sete medidas emergenciais para reduzir a violência letal no país. A proposta será apresentada, na sexta-feira, durante o 10º encontro anual do fórum, em Brasília.

O pacto, apresentado pelo então ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, no fim do ano passado, assumia o compromisso de reduzir em pelo menos 5% o número de assassinatos no Brasil. Ao ser cobrado pelo TCU, o novo ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, chegou a afirmar que ação não dizia respeito a este governo, mas, em 27 de julho, o TCU determinou 60 dias para o MJ enviar uma proposta “em virtude da elevada taxa de homicídios no Brasil”, segundo o relatório do ministro José Múcio Monteiro.

De acordo com o vice-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, o TCU definiu dois critérios: o plano precisa ter medidas factíveis e é preciso fazer uma maior racionalização da gestão. “A área da saúde, por exemplo, tem na legislação o que é um gasto com saúde. Está claro e determinado o que pode e não pode. Na segurança pública, não existe esse gasto, até porque não é uma verba vinculada. O próprio TCU reconhece que, para se trabalhar com critérios claros, é preciso dizer o que é um gasto com segurança”, comenta Lima.

O sociólogo e pesquisador da FGV comenta que um dos principais problemas é a pulverização de ações, em que cada unidade da Federação faz de um jeito. Para Lima, a ideia das sete medidas é padronizar a segurança pública no país, para que seja feito um projeto de estado, de governo. “Fizemos uma grande análise do que funciona hoje em dia e reunimos as ideias.. Um exemplo é que todos os programas estaduais que deram certo tiveram o tema como prioridade assumido pelo gestor. Ele não delegou, assumiu o problema.”

Entre as medidas sugeridas pelo fórum estão: o aumento do diálogo entre as polícias com um trabalho de áreas integradas e a fixação de metas; a resolução de problemas operacionais, como a compra de armamentos e coletes à prova de balas; a atualização dos currículos nas academias de polícia; a revisão dos sistemas de controle de armas; a valorização do policial; a obrigação de que os estados compartilhem os dados de violência com a União; e a desburocratização para a liberação de recursos financeiros.

 

Crise

De acordo com levantamento feito pelo Fórum Nacional de Segurança Pública, o governo federal, nos últimos 14 anos, gastou R$ 7,38 bilhões no Fundo Nacional de Segurança Pública. A média anual é de R$ 300 milhões por ano, cerca de metade para o custeio e metade para investimento. Lima destaca que, com a crise econômica, a verba, que já é pouca, diminuiu. Para isso, a proposta é “criatividade”, por meio de empréstimos com bancos internacionais. “A ideia é fazer um fundo emergencial. O dinheiro do governo federal não vai fazer muita diferença na prática, mas, se ele funcionar como contrapartida de empréstimos, podemos multiplicar esse valor por 10, chegando a R$ 3 bilhões em um único ano. É uma grande operação casada para que cheguemos a esse recurso emergencialmente.”

 

Duas perguntas para

Renato Sérgio de Lima, vice-presidente do Fórum Nacional de Segurança Pública

 

Por que o foco em violência letal?

Para a polícia, quando falamos em homicídio, é só homicídio doloso, mas existe uma série de outros tipos penais, as sem intenção, as mortes decorrentes de confrontos com a polícia. Então, chegamos a conclusão que a discussão é violência letal. Se é crime ou não, é uma questão que cabe ao Judiciário definir. Temos que olhar para o problema de uma forma global.

 

Está para ser apreciada na Câmara a revogação do Estatuto do Desarmamento. O que o senhor pensa sobre o projeto?

Muitas das críticas que os especialistas do ‘rearmamento’ fazem, na verdade, não são críticas à legislação. São críticas à forma como está sendo implementada a legislação. A falta de gestão e de controle. Antes de ir para a discussão, a revogação do Estatuto, vale uma enorme discussão sobre como o Estado brasileiro está exercendo o controle. Se já é difícil fazer hoje só com dois órgãos, o Exército e Polícia Federal, imagina voltar para as polícias estaduais. Se o projeto for aprovado com a realidade que temos hoje, só vai piorar. E a população que acha que vai se sentir mais protegida, na verdade, estará quase em um faroeste, onde o lema é salve-se quem puder.

 

Correio braziliense, n. 19475, 20/09/2016. Brasil, p. 6