Embraer admite esquema de suborno e fecha acordo de US$ 206 milhões
Victor Aguiar
25/10/2016
Corrupção. Valor é referente a penalidades impostas por autoridades dos EUA e do Brasil por causa de pagamentos ilegais feitos para garantir contratos de aeronaves em quatro países; práticas anticorrupção da fabricante ainda serão monitoradas por três anos.
A fabricante brasileira de aeronaves Embraer admitiu ter montado um esquema internacional de pagamento de propinas e concordou em pagar US$ 206 milhões a autoridades dos Estados Unidos e do Brasil, em acordo anunciado ontem. As investigações apuraram o pagamento de vantagens indevidas a autoridades de países como República Dominicana, Arábia Saudita, Índia e Moçambique para garantir a escolha de aeronaves da marca em compras governamentais.
Nos quatro países em que foi investigada, a companhia teria pago cerca de US$ 9,5 milhões em subornos. O primeiro caso apurado foi na República Dominicana.
Oito funcionários da Embraer teriam organizado um suborno de US$ 3,5 milhões para obter um contrato de US$ 92 milhões no país. As estimativas da investigação são de que, ao descumprir regras e autorizar pagamentos ilegais, a Embraer tenha aferido lucro irregular superior a US$ 83 milhões.
A chefe da divisão de execuções da SEC, Kara N. Brockmeyer, disse que o caso de corrupção da Embraer “se espalhou por múltiplos continentes e exigiu ação conjunta de vários reguladores internacionais e órgãos de investigação para desvendar os complexos sistemas de suborno da companhia”. Ontem, a Embraer disse que “reconhece responsabilidade pelos atos de seus funcionários e agentes, conforme os fatos apurados” e afirmou que “lamenta profundamente o ocorrido”.
Nos Estados Unidos, o acordo foi fechado com o Departamento de Justiça (DoJ) e com a SEC, órgão equivalente à Comissão de Valores Mobiliários (CVM); no Brasil, com o Ministério Público Federal (MPF) e a CVM. A Embraer se comprometeu a pagar US$ 98,2 milhões à SEC e outros US$ 107,3 milhões ao DoJ. A penalidade no Brasil será de R$ 64 milhões – em caso de pagamento integral deste montante, um valor de US$ 20 milhões será abatido das multas americanas.
Além de arcar com as penalidades, a empresa concordou com um período de três anos para ser considerada totalmente isenta de culpa – uma espécie de “condicional”. Durante este período, a companhia terá de contratar uma auditoria externa independente que avaliará se a empresa passou a cumprir à risca as normas anticorrupção.
Apesar de a Embraer já ter provisionado o pagamento das multas em seu mais recente balanço, as ações da fabricante de aeronaves fecharam em queda de 0,64% no pregão de ontem da BM&FBovespa, cotadas a R$ 15,56, na mínima do dia.
Reações. A agência de classificação de risco Standard & Poor’s informou ontem que as notas da empresa não serão afetadas pelo acordo com as autoridades brasileiras e americanas.
O valor de US$ 206 milhões, segundo a agência, não compromete a saúde financeira da fabricante de aeronaves.
Em relatório, a S&P disse acreditar que a Embraer melhorou sua governança corporativa e controles internos desde que as investigações começaram, mas lembra que a empresa continuará sob escrutínio por mais três anos. A agência ainda destacou o caixa “robusto” da companhia e os níveis historicamente bons de liquidez.
O analista Stephen Trent, do Citi, avaliou, em relatório, que os acordos parecem encerrar definitivamente as investigações internacionais de corrupção envolvendo a fabricante de aeronaves. Além disso, Trent destaca que as penalidades vieram em linha com o que a empresa já havia previsto.
“É uma notícia positiva por retirar um risco muito alto no curto prazo”, avalia a analista-chefe da corretora Coinvalores, Sandra Peres. Para ela, havia o temor no mercado de que os montantes a serem pagos pela companhia poderiam ser muito maiores que os provisionados.
Pagamentos ilegais
“A Embraer arrecadou receitas relevantes ao usar terceiros para mascarar subornos pagos a membros do governo com influência nas decisões sobre contratos que disputava.”
Andrew J. Ceresney
DIRETOR DA SEC
ENTENDA O CASO
Influência
A Embraer identificava membros do governo com poder para influenciar os contratos de compra de aeronaves que a empresa estava disputando
Pagamentos
Os subornos somam quase US$ 9,5 milhões: US$ 1,65 milhão na Arábia Saudita, US$ 800 mil em Moçambique, US$ 3,52 milhões na República Dominicana e US$ 5,76 milhões na Índia
Vantagens
Os contratos ilegais podem ter rendido vantagens de cerca de US$ 83 milhões à companhia, de acordo com a SEC
Penalidade
A multa aplicada à companhia será de US$ 205,5 milhões, no Brasil e nos EUA; a Embraer terá ainda acompanhamento de consultoria por três anos.
O Estado de São Paulo, n. 44933, 25/10/2016. Negócios, p.B9