Valor econômico, v. 17, n. 4105, 05/10/2016. Brasil, p. A5

PEC do teto para gastos pode estender a DRU até 2036

Parecer do relator Darcísio Perondi deve ser votado amanhã na comissão especial da Câmara

Por: Fabio Graner e Thiago Resende

 

O relatório da Proposta de Emenda Constitucional (PEC) 241, que limita o crescimento da despesa pública pela inflação, foi apresentado ontem na Comissão Especial da Câmara dos Deputados. O texto do deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS) amplia e endurece as sanções em caso de descumprimento do teto de gastos e promove inovações ao texto do Novo Regime Fiscal, como a extensão do prazo de vigência da Desvinculação de Receitas da União (DRU), que confere mais flexibilidade à gestão orçamentária, até 2036 e a autorização para a exclusão do pagamento de restos a pagar gerados até 2015 do cálculo do teto, se não comprometer a meta fiscal.

A oposição fez barulho, tumultuou a primeira parte da sessão e tentou adiar a leitura, mas conseguiu apenas atrasar um pouco o processo, sem maiores consequências. A previsão é que seja votado amanhã na mesma comissão. Os parlamentares podem mudar o projeto tanto na comissão quanto no plenário, cuja previsão da base aliada é examinar a matéria na semana que vem.

Perondi confirmou a fórmula para o piso de gastos com saúde, que terá como referência o ano de 2017, e não mais 2016, além do índice de 15% da Receita Corrente Líquida (RCL), que, pela "Emenda 86" (que regula o piso da saúde), estava previsto para vigorar só em 2020. Com isso, o piso da área deve ficar em torno de R$ 112 bilhões, conforme antecipou o Valor PRO, serviço de informação em tempo real do Valor, na segunda-feira, montante superior aos R$ 103,9 bilhões que os cálculos do governo indicavam para 2017, considerando-se 13,7% da RCL previsto na "Emenda 86". "Adotar o ano de 2016 como base de cálculo para as aplicações mínimas em ações e serviços públicos de saúde causaria imensa perda para o setor", relatou.

A partir de 2018, esse montante de R$ 112 bilhões será corrigido pelo IPCA (o índice oficial de inflação), assim como o mínimo a ser gasto com educação, cuja base também será a receita de 2017.

Perondi manteve inalterado o prazo de 10 anos para que possa ser proposta uma nova regra de correção do teto das despesas em substituição ao IPCA. Ele confirmou que, a partir deste prazo, será permitida uma alteração a cada mandato presidencial, mas dificultou o processo ao determinar que a alteração na regra só possa ser feita por lei complementar e não ordinária.

O relatório estabelece que, em caso de descumprimento do limite de gastos, as vedações impostas, como a proibição a reajustes de funcionários públicos, serão aplicadas não só no ano seguinte, mas enquanto a unidade estiver acima do teto. "Os órgãos e Poderes devem ser induzidos a manter uma postura responsável ao longo do tempo, sem depositar expectativas num retorno à normalidade que independa de sua conduta", diz.

Se o teto for superado, fica proibida a concessão de reajustes reais do salário mínimo e a criação de novas despesas obrigatórias. Outra vedação é para a aplicação da revisão geral anual dos salários dos servidores, que normalmente repõe a inflação nos salários dos funcionários públicos.

Também ficam proibidas concessões de aumentos e vantagens para quaisquer membros das áreas que descumprirem a regra e não só para os servidores, ou seja, caso o Legislativo supere o teto, os parlamentares também não poderão ter reajustes ou incremento de benefícios.

Enquanto apertou as sanções em caso de violação do teto, Perondi, por outro lado, deu um certo alívio, ao prever que, nos três primeiros anos da vigência do Novo Regime Fiscal, o Executivo poderá compensar eventual excesso de despesas de demais Poderes. O relator admitiu que a medida visa acomodar os reajustes a funcionários públicos que foram concedidos neste ano. Segundo ele, caberá ao Executivo, "voluntária e transitoriamente", reduzir ainda mais o próprio teto em até 0,25% para permitir que o Legislativo ou Judiciário gaste além do máximo determinado no período.

Para dar previsibilidade ao cálculo do teto, o índice de inflação que irá corrigir o limite será o apurado em 12 meses até junho de cada ano. Por exemplo, ao elaborar o Orçamento de 2018, a equipe econômica terá que aumentar o teto de gastos com base no IPCA acumulado nos últimos 12 meses encerrados em junho de 2017. No entanto, para o Orçamento do próximo ano, o índice já foi estabelecido. Será de 7,2%. Essa taxa já está prevista na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2017 e "reflete as previsões tanto do Poder Executivo quanto do mercado".

O relatório da PEC dos Gastos alterou também as regras para o valor mínimo a ser destinado a emendas parlamentares de execução obrigatórias na saúde. Pela norma atual, no Orçamento do próximo ano está previsto que 1,2% da Receita Corrente Líquida (RCL) de 2016 seja usado para pagar essas emendas, sendo metade para ações e serviços de saúde. Na nova versão da PEC, esses desembolsos passariam a ter um teto: o valor a ser gasto em 2017 e que será corrigido pelo IPCA.

A nova versão coloca na Constituição regra determinando que projetos que criam despesas obrigatórias ou retiram receitas deverão apresentar estimativa do impacto orçamentário e financeiro. E estabelece que poderão ficar suspensos no Congresso Nacional por até 20 dias caso haja um requerimento com apoio de um quinto dos membros da Casa.

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Parecer do relator flexibiliza teto para quitar restos a pagar

Por: Ribamar Oliveira

 

A pedido da área econômica do governo, o relator da proposta de emenda constitucional (PEC) que cria um teto para o gasto da União, deputado Darcísio Perondi (PMDB-RS), flexibilizou o texto original. Incluiu em seu substitutivo, lido ontem na Comissão Especial que discute o assunto, um dispositivo que permite quitar os restos a pagar acumulados até o dia 31 de dezembro de 2015 sem que essa despesa seja considerada no cálculo do limite do gasto.

Pelo substitutivo, se o governo fizer um resultado primário no exercício melhor do que a meta que foi estipulada na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), a diferença poderá ser usada para quitar os restos a pagar que foram acumulados até 31 de dezembro. Esse gasto não será considerado para o cálculo do limite de despesa anual estabelecido nos termos da PEC.

Para 2017, por exemplo, a LDO fixou a meta de déficit de R$ 142 bilhões para o governo federal (incluindo as estatais federais). Se o governo conseguir receita suficiente para reduzir esse "rombo" para R$ 120 bilhões, ele poderá usar R$ 22 bilhões (R$ 142 bilhões menos R$ 120 bilhões) para quitar restos a pagar. E essa despesa não será computada no teto.

O montante de restos a pagar que foi inscrito pelo governo até o dia 31 de dezembro supera R$ 170 bilhões. Desse total, parte considerável é de restos a pagar de investimentos. A maioria, no entanto, é de gasto de custeio, principalmente nas áreas da saúde, da educação e de subsídios, cujo pagamento é quase obrigatório.

"O substitutivo criou uma válvula de escape para quitar o passado, o que vai reduzir a pressão sobre o teto nos próximos anos", explicou uma fonte. Se fosse "pagar o passado" nos termos do texto original da PEC, o governo teria que cortar outros gastos, de forma a preservar o teto. "Isso seria impossível", admitiu um assessor da área econômica. A mudança feita por Perondi representa, portanto, uma flexibilização da PEC.

Os restos a pagar cresceram muito no governo da ex-presidente Dilma Rousseff, principalmente durante a gestão do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega e do ex-secretário do Tesouro Arno Augustin. Com o aumento, a quitação dos restos a pagar praticamente inviabilizava a execução do Orçamento do exercício.

O relator da PEC, no entanto, fez algumas alterações que aumentam o rigor no controle orçamentário. Ele propôs dois dispositivos que acabam com as chamadas "pautas bomba" - propostas que criam despesas sem especificar as receitas que irão pagá-las.

Pelo substitutivo, todas as propostas que aumentem despesas obrigatórias ou que resultem em renúncia de receita deverão ser acompanhadas da estimativa do impacto orçamentário e financeiro. Ao mesmo tempo, um quinto dos deputados ou dos senadores poderá paralisar a tramitação da proposta que aumenta a despesa ou reduz a receita para a análise de sua compatibilidade com o teto do gasto.

Atualmente, os projetos de lei precisam passar por uma análise de estimativa de seus impactos orçamentário e financeiro. Mas essa análise não se aplicava a propostas de emendas à Constituição.

Como antecipou o Valor em sua edição de ontem, o substitutivo do relator proíbe a abertura de crédito suplementar ou especial que amplie o montante total da despesa primária. Outra decisão de Perondi que permite um maior controle da despesa é o dispositivo que compatibiliza a programação orçamentária à programação financeira, o que impedirá o aumento de restos a pagar.

O substitutivo também estendeu o prazo de validade da Desvinculação das Receitas da União (DRU) para 2036, ou seja, até o último ano do novo regime fiscal. Mas a medida foi apenas para atender uma preocupação dos técnicos de Orçamento com a atuação do Tribunal de Contas da União (TCU), que é muito rigoroso no controle do uso de recursos das contribuições sociais em despesas fora da seguridade social.

A preocupação agora do governo é "reduzir os estragos" na PEC, mesmo com a certeza que a proposta será aprovada, pois a base governista tem maioria na Comissão Especial da Câmara.