Empolgado com a expressiva votação que obteve na aprovação, em primeiro turno, da emenda constitucional que limita os gastos da União, o Palácio do Planalto terá de enfrentar os partidos aliados se quiser, de fato, punir os infiéis. Em um primeiro momento, o chefe da Casa Civil, Eliseu Padilha, chegou a chamar esses deputados de “traidores” e disse que o presidente Michel Temer conversaria pessoalmente com eles. O tom foi diminuindo ao longo da semana e a opção passou a ser deixar para os comandos partidários a decisão sobre o que fazer com os próprios rebeldes.
O tom pode ter arrefecido, mas o desejo de uma ação concreta não. Auxiliares do governo afirmam que o tratamento dado aos parlamentares que votaram contra a PEC deverá ser o mesmo que eles deram ao governo. “Serão tratados com o mesmo carinho”, ironizou um interlocutor palaciano. A avaliação no Planalto é que nenhum deputado ou senador é obrigado a votar com o governo.
Mas ressaltam que toda ação gera consequência. Não ratificar no voto o desejo do governo significa menos boa vontade na hora da distribuição dos espaços ainda vagos na administração federal. Se os ministérios estão definidos, segundo e terceiro escalões permanecem vagos, com cargos no setor elétrico, nos bancos públicos e em alguns órgãos e autarquias que funcionam nos estados.
O Planalto, contudo, sabe que precisa dosar a força. Por isso, a estratégia dividiu-se em duas partes. A primeira é esperar, por uma questão de prudência, a votação do segundo turno da PEC, para que a matéria seja concluída rapidamente na Câmara e siga para o Senado. O presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB-AL), prometeu concluir a apreciação da matéria até o fim do ano. É tudo o que o governo quer para dar um sinal positivo ao mercado. O Planalto espera aprovar a matéria por 370 votos — quatro a mais do que o obtido na primeira rodada de escrutínio.
A segunda parte do planejamento é deixar os partidos — e não o presidente Temer, diretamente, ou seus ministros mais próximos — com a incumbência de conversar com os dissidentes. “Vocês têm que tomar uma atitude em relação aos traidores”, foi a orientação repassada aos parlamentares. Nesse sentido, o PR deu largada ao processo de expulsão da deputada Clarisse Garotinho (RJ). Embora a própria legenda admita que esse é um processo demorado, ela, desde já, está proibida de participar de comissões ou de representar o partido. A mesma regra vale para a deputada Zenaide Maia (RN). Silas Freire (PI) se absteve. Alguns parlamentares também veriam seus apadrinhados no governo demitidos, caso já tenham sido contemplados com cargos. Com o terreno mais tranquilo, Temer entraria em campo para reaglutinar a base.
Impaciência
Orientados pelo Planalto, os partidos estão adotando caminhos diferentes. Titular do Ministério das Comunicações, o PSD, de Gilberto Kassab, teve um voto contrário à PEC dos gastos: Expedito Neto (RO). “A direção do partido vai decidir o procedimento a ser adotado”, limitou-se a dizer o líder do partido na Câmara, Rogério Rosso (DF). Como Kassab está licenciado do posto, a tarefa caberá ao presidente em exercício, Alfredo Cotait Neto.
Bem mais irritado está o líder do DEM na Câmara, Pauderney Avelino (AM). A divergente na bancada foi a deputada professora Dorinha Seabra Rezende (TO). “A questão é que ela sempre fez sua carreira na área de educação e está caindo nessa bobagem do PT e de outras pessoas de que a PEC vai tirar recursos do setor”, criticou Pauderney. Ele disse que não ligou para a deputada após a votação. “Conversei muito com ela antes, mostrei que a gritaria não fazia sentido. Preciso conversar com ela de novo”. Questionado se Dorinha tem cargos no Executivo, ele demostrou mais impaciência ainda. “Ela me garantiu que não. Tenho que acreditar”, afirmou.
Já o líder do PTB na Câmara, Jovair Arantes (GO), demonstrou mais compreensão com o deputado Arnaldo Faria de Sá (SP). “Essa é a bandeira dele: defender aposentados e servidores públicos. Acho que se a mãe dele fosse presidente e apresentasse essa proposta, ele (Arnaldo) votaria contra”, brincou Jovair. No caso do PP, o único voto contrário foi de Marcelo Belinati (PR), recém-eleito prefeito de Londrina. “Eu sei que, quem é governo, precisa votar com o governo. Esperávamos 100% de adesão. Um votinho perdido não é tão dramático”, ponderou.
Os traidores
Quem é base e foi contra a PEC do teto de gastos
Com ministérios
PPS Ministério da Defesa
Arnaldo Jordy (PA)
Carmen Zanotto (SC)
Eliziane Gama (MA)
PTB Ministério do Trabalho
Arnaldo Faria de Sá (SP)
PSB Minas e Energia
César Messias (AC)
Danilo Cabral (PE)
Gonzaga Patriota (PE)
Heitor Schuch (RS)
Janete Capiberibe (AP)
JHC (AL)
João Fernando Coutinho (PE)
Jose Stédile (RS)
Júlio Delgado (MG)
Tadeu Alencar (PE)
PR Transportes
Clarissa Garotinho (RJ)
Zenaide Maia (RN)
PSD Comunicações
Expedito Netto (RO)
PP Ministério da Saúde
Marcelo Belinati (PR)
DEM Ministério da Educação
Professora Dorinha Seabra Rezende (TO)
Sem ministérios
Pros
George Hilton (MG)
Odorico Monteiro (CE)
Bosco Costa (SE)
Solidariedade
Major Olimpio (SP)
PTdoB
Cabo Daciolo (RJ)
PEN
Walney Rocha (RJ)
PMB
Weliton Prado (MG)
Correio braziliense, n. 19500, 15/10/2016. Política, p. 2