Valor econômico, v. 17, n. 4109, 12/10/2016. Política, p. A6

Acordo com Fazenda sobre repatriação desagrada Estados

Por: Raphael Di Cunto, Fabio Graner, Thiago Resende e Carolina Oms

 

Pressionado por deputados da base para facilitar as negociações com a oposição, o Ministério da Fazenda aceitou dividir a multa da Lei de Repatriação com os governadores, mas defendia um modelo que deixaria poucos recursos para os Estados. A proposta até o começo da noite de ontem era compartilhar o que excedesse o montante de R$ 35 bilhões - o relator, deputado Alexandre Baldy (PTN-GO), porém, defendia R$ 25 bilhões.

Nesse formato, quando a arrecadação com a multa (de 15% sobre o valor regularizado) ultrapassasse o valor combinado, 21,5% do excedente passariam a ser compartilhados com os Estados. Como a multa representa metade da arrecadação (a outra metade é de Imposto de Renda), seria necessário arrecadar mais de R$ 50 bilhões, na versão dos deputados, ou R$ 70 bilhões, na versão da Fazenda para começar a dividir a multa.

A Fazenda informou que, nesse modelo, não abria mão da receita: "O que tínhamos até agora era uma previsão de [arrecadar] até R$ 50 bilhões. Estamos revisando essa projeção para saber se mantemos isso ou aumentamos. Qualquer mudança de critério será para valores eventualmente arrecadados acima da nossa previsão."

Autor da emenda para compartilhar a multa, o PT rejeitava essa tratativa e queria dividir todo o valor arrecadado em troca de apoiar a medida ou, pelo menos, não obstruir a votação.

Insatisfeitos, governadores se reunirão de manhã com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ). A votação acabou adiada para tentar um acordo. Os governadores já estão contrários ao projeto por causa da prorrogação do prazo de adesão em 16 dias, atrasando a entrada de recursos nos cofres estaduais.

Outro impasse entre deputados e governo é um desconto de 25% caso o dinheiro seja trazido para o Brasil. O benefício, incluído pelo relator de última hora para atender a um senador, não tinha o apoio do governo. Esse "bônus" chegou a ser cogitado na época em que se discutia o projeto original, mas a Fazenda rejeitou daquela vez pelo mesmo motivo de agora: significaria queda na arrecadação.

Baldy, por sua vez, disse que a proposta não reduz a receita inicial. O sonegador pagaria o imposto e multa e depois faria um encontro de contas com a Receita ao longo de três anos, comprovando que repatriou. Ele receberia créditos pecuniários se utilizasse o dinheiro "para movimentar a economia real", o que, afirmou, teria regras claras no parecer, que era mantido sob sigilo até o fechamento desta edição.

A Fazenda já era contra o texto, formulado para limitar o poder da Receita de cobrar os sonegadores, mas aceitou não trabalhar contra para não atrapalhar a discussão da PEC do teto de gastos. Segundo o relatório, o imposto e multa serão calculados apenas sobre o saldo no dia 31 de dezembro de 2014 - ou do ano imediatamente anterior, caso o saldo esteja zerado. A Receita queria cobrar sobre toda a movimentação financeira de 2010 a 2014.

Em resposta à ação de inconstitucionalidade impetrada pelo Solidariedade no Supremo Tribunal Federal (STF) para permitir que políticos possam aderir à repatriação, o Senado defendeu a exclusão e afirmou que a Corte deve se conter ao revisar e interpretar os atos legislativos, "sob o risco de se investir de um suprapoder, desnaturando o pacto constituinte fundado na harmonia e na independência entre os Poderes".