Valor econômico, v. 17, n. 4106, 06/10/2016. Política, p. A8

STF mantém prisão após segunda instância

Placar em julgamento de ações da OAB e do Partido Ecológico Nacional foi de seis votos a cinco

Por: Joice Bacelo e Adriana Aguiar

 

O Supremo Tribunal Federal (STF) manteve posicionamento que permite a prisão de réus condenados em segunda instância - quando ainda há possibilidade de recursos. O placar, na sessão plenária de ontem, foi quase o mesmo do julgamento de um habeas corpus em fevereiro, quando o tribunal mudou jurisprudência que vinha sendo seguida desde 2009.

Desta vez, a decisão tem mais força por ter sido dada em pedidos de liminares em ações declaratórias de constitucionalidade (ADCs). Se confirmado no mérito, o entendimento terá efeito para todos os casos.

Uma das ações foi apresentada pelo Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e a outra pelo Partido Ecológico Nacional (PEN). Ambas solicitavam a declaração de constitucionalidade do artigo 283 do Código de Processo Penal (CPP), que, segundo interpretação defendida, afasta o cumprimento da pena antes do trânsito em julgado.

Somente o ministro Dias Toffoli mudou de posicionamento. Na sessão de fevereiro, ele havia se manifestado em favor da possibilidade da prisão já após decisão de segunda instância e, desta vez, votou contra. O resultado final foi de seis votos a favor e cinco contrários.

Pela possibilidade da prisão, posicionaram-se os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux, Teori Zavascki, Gilmar Mendes e a presidente do tribunal, Cármen Lúcia. Foram contrários, o relator Marco Aurélio Mello, Rosa Weber, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e, agora, Dias Toffoli.

Relator do caso, o ministro Marco Aurélio Mello, que já havia votado no dia 1º de setembro - quando as duas ações foram levadas a plenário pela primeira vez -, manteve posição contrária à prisão em segunda instância. Ele sugeriu também que, caso o plenário decidisse manter o entendimento de fevereiro, se estabelecesse ao menos a necessidade de que a ação fosse concluída no Superior Tribunal de Justiça (STJ) e não somente na segunda instância.

Acompanharam o relator, na íntegra, os ministros Celso de Mello, Ricardo Lewandowski e Rosa Weber. Eles entendem que a Constituição Federal, no inciso 57 do artigo 5º, vincula a prisão a uma condenação transitada em julgado. "Eu não vejo como chegar a uma interpretação diversa", afirmou Rosa Weber. Já Dias Toffoli concordou em parte. Para ele, é preciso definir com clareza o momento em que se tem a certeza da culpa e quando, exatamente, ocorre o trânsito em julgado.

Lewandowski apresentou um levantamento do STJ que mostra a quantidade de recursos aceitos - ou seja, em favor do réu. Segundo ele, somam 32,13% somente em habeas corpus. Já recursos especiais representam 17,97% do total julgado. "É um número impressionante, que não permite a manutenção da prisão após julgamento somente pela segunda instância", sustentou.

Já os ministros que se manifestaram de forma favorável à prisão após decisão de segunda instância sustentaram que os recursos especiais ao STF e ao STJ não têm efeito suspensivo. Eles entenderam ainda que caberia uma interpretação mais adequada ao artigo 283 do Código de Processo Penal do que a que foi dada pelos autores das duas ações. Para ele, deve-se levar em conta o inciso 61 do artigo 5º da Constituição Federal. O dispositivo estabelece que "ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente", sem tratar sobre trânsito em julgado.

Sobre a presunção da inocência, também prevista na Constituição Federal, argumentaram que trata-se de princípio e não de regra. "É ponderável com outros valores do sistema. Entre eles, a efetividade do sistema penal. Estamos falando de um conjunto de direitos fundamentais, como a proteção à vida", afirmou o ministro Luís Roberto Barroso. "O princípio tem de ser ponderado e ponderar é atribuir peso. Quando começa o processo tem peso elevadíssimo, mas na segunda instância a presunção da inocência tem peso mais leve, menos relevante em contraste com o interesse estatal de que os culpados cumpram a pena", acrescentou.

O ministro Gilmar Mendes seguiu a mesma linha. Ele afirmou existir uma espécie de sistema progressivo de presunção de inocência. "Uma coisa é termos alguém como investigado, outra denunciado e outra com condenação e agora com condenação em segundo grau."

Os magistrados que se posicionaram de forma favorável à prisão levaram em conta ainda a demora para uma decisão definitiva - que gera sentimento de impunidade à sociedade. Edson Fachin, que abriu a divergência, afirmou que a morosidade judicial em apresentar soluções levou, inclusive, à condenação do Brasil pela Corte Internacional de Direitos Humanos.