Valor econômico, v. 17, n. 4104, 04/10/2016. Finanças, p. C1

Receita já arrecadou R$ 8,5 bi com repatriação

Por: Vinícius Pinheiro

 

O patrimônio no exterior declarado por contribuintes brasileiros dentro do programa de repatriação de recursos atingiu R$ 28,5 bilhões até a última sexta-feira, dia 30. A informação é de Paulo Ricardo de Souza Cardoso, secretário-adjunto da Receita Federal. Um total de 3,5 mil contribuintes apresentou a declaração, com tributos e multas relacionados de R$ 8,5 bilhões. "A expectativa da administração tributária é que o programa vai atingir o objetivo plenamente", afirmou Cardoso, em evento ontem na sede da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp).

A Receita já prepara uma grande operação de fiscalização aos contribuintes com recursos não declarados no exterior assim que acabar o prazo do programa, no fim deste mês. Cardoso disse não se tratar de uma ameaça aos que ainda não aderiram à repatriação, e que a ação imediata é necessária em relação ao curto prazo que a Receita tem para atuar. "Vamos fazer nosso trabalho a partir de 1º de novembro de 2016", afirmou.

O cerco tende a aumentar a partir do ano que vem, quando o Brasil começará a receber informações sobre a movimentação financeira de contribuintes vindas de uma série de países.

O secretário-adjunto da Receita não comentou possíveis mudanças com efeito penal na lei em discussão no Congresso, mas reiterou o posicionamento contrário a alterações de ordem tributária, inclusive o prazo para a adesão. "Eventuais mudanças trariam apenas insegurança jurídica", afirmou.

Para Cardoso, eventuais alterações na norma poderiam reduzir o volume de arrecadação previsto nos orçamentos da União, Estados e municípios, incluindo os recursos que já foram declarados, que poderiam passar por declarações retificadoras.

Ele defendeu que a incidência do imposto seja feita sobre o "filme curta-metragem", ou seja, considerando os recursos no exterior entre o início de 2011 e o fim de 2014. Neste caso, o tratamento seria o mesmo tanto para o contribuinte que enviou recursos para o exterior em 2011 e os manteve até 2014 como para aquele que gastou o dinheiro nesse período.

Para o secretário-adjunto da Receita, seria injusto que a cobrança ocorresse apenas em relação à última "foto", ou seja, do saldo de recursos do contribuinte no fim de 2014, ou ao que chamou de "álbum de fotos", proposta na qual o imposto incidiria na "melhor foto" - com o menor volume de recursos entre 2011 e 2014.

A expectativa da Receita é que a adesão ao programa aumente nos próximos dias, a exemplo do que ocorre todos os anos na declaração anual do Imposto de Renda da Pessoa Física (IRPF), que apresenta, em média, 62% entregas nas últimas duas semanas.

O programa de repatriação será a última oportunidade para o contribuinte resolver a situação de dinheiro de origem lícita não declarado fora do país, segundo o tributarista Heleno Taveira Torres, professor de direito financeiro da Universidade de São Paulo (USP) e um dos responsáveis pelo projeto de lei em vigor.

A estimativa é que o saldo de recursos brasileiros no exterior chegue a US$ 600 bilhões. Apenas US$ 190 bilhões, contudo, são de origem legal e poderiam ser repatriados, segundo o professor. "Quando acabar a eficácia da lei, haverá a presunção que os recursos de quem não declarou têm algum vício de origem, o que pode ser muito perigoso", afirmou.

Como exemplo da mudança em curso, ele destacou que, entre 2005 e 2014, apenas US$ 14 milhões de recursos de brasileiros foram repatriados. No ano passado, com o avanço da Operação Lava-Jato, esse número subiu para US$ 125 milhões.