Medida antigreve do GDF causa revolta de servidores
 
08/10/2016
Alessandra Azevedo
Ana Viriato

 

O impasse entre Executivo e Legislativo locais e servidores públicos atingiu o ápice. Ameaçado pelo indicativo de greve geral de 32 categorias, Rodrigo Rollemberg (PSB) editou, ontem, decreto que prevê corte de ponto, processos administrativos e até demissão dos funcionários que aderirem à paralisação. A norma revoltou os sindicalistas, que ocuparam a Praça do Buriti e bloquearam o Eixo Monumental, e despertou a atenção da Câmara Legislativa. Grupo de parlamentares deseja neutralizar os efeitos da medida do governador por meio de projetos de decreto legislativo, cujos conteúdos têm o poder de suspender a determinação de Rollemberg.
Publicado em edição extra do Diário Oficial do Distrito Federal, o Decreto nº 37.692 determina que, em casos de greve, má prestação ou retardamento da realização de atividades públicas, secretários de Estado e dirigentes das entidades deverão definir descontos na folha de pagamento dos servidores. A regulamentação define, ainda, que, caso o Judiciário considere a paralisação ilegal, cabe aos órgãos governamentais instaurar procedimentos administrativo-disciplinares para a apuração de faltas e aplicar penalidades.
A resolução, segundo o chefe da Casa Civil do DF, Sérgio Sampaio, objetiva “avisar as regras do jogo para, depois, o servidor não dizer que não sabia”. Ele ressaltou, ainda, que, “do mesmo modo que o funcionário não está obrigado a prestar o serviço, o empregador também não é obrigado a remunerar por execuções não prestadas”.
Os sindicalistas reivindicam a quitação da última parcela do reajuste salarial até novembro, concedida durante a gestão anterior — a data limite será definida em assembleia prevista para 26 de outubro. Ao assumir o Executivo local, em 2015, Rollemberg alegou que, devido ao rombo nas contas brasilienses e por estar no limite prudencial da Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), o pagamento do débito seria inviável. Assim, estabeleceu como prazo a folha de pagamento de outubro deste ano. Caso o acordo não seja honrado, 153 mil servidores públicos serão afetados.

Contra-ataque

Diante disso, deputados distritais articulam o contra-ataque. Celina Leão (PPS) e Raimundo Ribeiro (PPS) protocolaram, ontem, na Câmara Legislativa, um dos projetos de decreto legislativo com poder de anular a medida de Rollemberg. O mesmo fez a bancada do PT na Casa: Wasny de Roure, Chico Vigilante e Ricardo Vale. O consultor legislativo da Câmara, José Willemann, alega que, hierarquicamente, ambas as resoluções são equivalentes. Porém, neste caso, a jogada do Legislativo local é viável. “Não existe uma lei que regulamente a matéria de paralisações. Assim, o governador, cuja função é implementar as adequações, não pode determinar artigos referentes ao tema. Ao sancionar o decreto, o chefe do Executivo criou uma lei. Essa responsabilidade, segundo a Lei Orgânica, é restrita ao Legislativo. Dessa forma, os distritais podem sustar os efeitos de ações do Palácio do Buriti que exorbitem o campo de ação”, detalhou.
O especialista acrescentou que Rollemberg não poderia cortar o ponto dos servidores em casos de má prestação ou retardamento da realização de atividades, “porque a forma de execução do serviço de cada funcionário depende das condições em que trabalha”.
Celina Leão reforçou que a implementação do projeto de decreto deve-se à postura do Executivo local. “A medida é uma tentativa de coagir o servidor. A ação não é algo saudável. Rollemberg teria de reestabelecer o diálogo, e, não, ameaçá-los”, argumentou. Raimundo Ribeiro alegou que o documento é “mais uma contribuição que a Casa dará para corrigir as besteiras produzidas pelo Palácio do Buriti”. A votação da medida está prevista para a próxima terça-feira. Em nota, a bancada petista declarou que “visa assegurar os direitos dos trabalhadores do serviço público local”.

Saúde

As horas extras realizadas pelos servidores da Secretaria de Saúde entre maio e junho serão pagas na próxima semana, garantiu ontem o secretário da pasta, Humberto Fonseca. Os prazos são até segunda-feira, para as dívidas de maio; e sexta-feira, para as de junho. O valor devido no período ultrapassa R$ 20 milhões.
O pagamento da dívida é uma das principais reivindicações do Sindicato dos Servidores da Saúde (SindSaúde). A entidade argumenta que cerca de 10 mil funcionários não receberam os adicionais. O receio é de que o GDF dê um calote, possibilidade negada pelo secretário. “Estamos empenhados em conseguir fazer esse pagamento”, afirmou Humberto.
As horas extras de julho, no entanto, ainda estão pendentes. “Com certeza, serão pagas. Ainda não foram por falta de recursos, não por ineficiência do governo”, concluiu o secretário, que não estimou uma data para o pagamento.


À espera de ollemberg

O pagamento da terceira parcela do reajuste dos servidores públicos é só um dos problemas de Rodrigo Rollemberg com o funcionalismo. Em setembro de 2015, o governador autorizou que o Instituto de Previdência dos Servidores do DF (Iprev-DF) revertesse parte do superavit do Fundo Previdenciário do DF para que a verba fosse usada pelo Buriti. Com a transferência entre setores, os cofres brasilienses receberam cerca de R$ 1,2 bilhão. A medida garantiu o pagamento de funcionários em dia e permitiu que o GDF voltasse, no último quadrimestre de 2015, ao limite prudencial da LRF. A recomposição, porém, deveria ser feita em 180 dias. Mas a destinação de verbas aos fundos não ocorreu. Caso Rollemberg não realize a restituição até 24 de novembro, o DF pode perder o Certificado de Regularidade Previdenciária (CRP), emitido pelo Ministério da Previdência Social, ficando impedido de receber repasses da União.

 

Correio braziliense, n. 19493, 08/10/2016. Cidades, p. 19