Meirelles reforça discurso da confiança

Rolf Kuntz

 07/10/2016

 

 

Em maratona de reuniões com investidores americanos e no FMI, ministro tenta vender a imagem de um governo empenhado no ajuste. 

O ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, desembarcou na capital dos EUA com a missão de contar ao mundo, e especialmente aos investidores americanos, como o governo pretende consertar o buraco de suas contas e criar condições para o Brasil voltar a crescer.

Sua agenda prevê, até a próxima quarta-feira, 15 seminários e encontros com profissionais do mercado financeiro, incluídos dirigentes de grandes instituições privadas, como o Citigroup e o Goldman Sachs, em Washington e em Nova York.

Eventos no Fundo Monetário Internacional (FMI) e encontros com autoridades consumirão parte de seu tempo até o fim desta semana. Pelo menos o endosso da diretora-gerente do FMI, Christine Lagarde, ele parece já ter conseguido.

O Brasil, disse ela ontem, numa entrevista coletiva, está entrando em território positivo, depois de uma fase de contração.

A diretora também citou como bons sinais as discussões sobre mudanças nas contas públicas e reformas com potencial para levar o País à estabilidade e à prosperidade.

O governo, disse o ministro num encontro com jornalistas, deve equilibrar até 2019 seu saldo primário – sem a conta juros, portanto. O resultado neste ano deve ficar, explicou, em torno de zero, pouco acima ou abaixo. A projeção é compatível com as divulgadas pelo Fundo nesta semana.

Pelas estimativas do FMI, o governo geral deve fechar 2019 com déficit primário de 0,5% do Produto Interno Bruto (PIB) e alcançar um pequeno superávit – de 0,3% – no ano seguinte. Mas pelo menos até 2021 a dívida oficial continuará em alta, porque o resultado ainda será insuficiente para cobrir os juros.

O ministro poderá apresentar aos investidores pelo menos um roteiro com números de ajuste progressivo das finanças públicas. De acordo com o plano, o déficit primário deve passar de R$ 170,5 bilhões neste ano para R$ 139 bilhões em 2017 e R$ 60 bilhões em 2018, com perspectiva de equilíbrio, ou quase, no ano seguinte.

Se os investidores comprarem a mensagem, poderão contribuir para um crescimento econômico maior e, portanto, para uma superação mais fácil dos problemas financeiros do governo, porque a arrecadação subirá mais velozmente. 

Aperto. Por enquanto, o caminho para o crescimento passa por um aperto severo da gestão orçamentária. Afrouxar a política na esperança de estimular a atividade produziria efeito contrário ao desejado, disse o ministro no encontro com jornalistas. Quando a dívida pública se aproxima de 70% do PIB, o aumento do gasto deixa de ser estimulante e passa a atrapalhar, porque diminui a confiança na ação do governo, argumentou Meirelles, citando estudos especializados.

Confiança tem sido um tema explorado nos comentários de técnicos e dirigentes do Fundo MI quando se referem aos programas do governo.

É um dos pressupostos embutidos na previsão, divulgada há poucos dias, de crescimento econômico de 0,5% em 2017. Esse pressuposto é condicional: a boa vontade poderá sumir, se o presidente e sua equipe falharem na demonstração de firmeza em seus compromissos.

Se o Brasil conseguir arrumar suas contas, mostrar disciplina e reconquistar a estabilidade, já prestará um serviço à América Latina, havia dito de manhã a diretora-gerente do FMI. A economia latino-americana deve recuar 0,6% neste ano e isso se deve, acrescentou, ao desempenho de alguns países, “como Brasil e Venezuela”. 

Protecionismo

“Um recuo na globalização e no multilateralismo é um sério risco em um tempo em que a cooperação e coordenação internacional são mais necessárias do que nunca”

Christine Lagarde

DIRETORA-GERENTE DO FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL (FMI).

 

O Estado de São Paulo, n. 44915, 07/10/2016. Economia, p.B6