Tabus acirram disputa Crivella-Freixo
Luciana Nunes Leal
04/10/2016
Candidatos a prefeito do Rio têm visões opostas sobre drogas, família e direitos LGBT; estrategistas reconhecem peso dos temas no 2º turno.
A disputa entre os candidatos Marcelo Crivella (PRB) e Marcelo Freixo (PSOL) no segundo turno do Rio não vai expor apenas as diferenças partidárias e de propostas para a cidade. Será também um confronto sobre costume e comportamento.
Os dois candidatos têm posições opostas sobre temas como drogas, aborto, religião, família e direitos dos cidadãos LGBT. Em reuniões de avaliação e estratégia, os dois lados concordam que esses temas terão peso maior no segundo turno.
De um lado está o senador de tendência conservadora que procurou fazer uma campanha ecumênica, mas é uma das maiores lideranças do PRB, partido ligado à Igreja Universal do Reino de Deus. No outro, o deputado estadual do PSOL que não abre mão de bandeiras como “o direito de a mulher decidir sobre o próprio corpo”, citado no programa de governo, e o conceito de família que inclui casais do mesmo sexo.
No campo político, Crivella é preferido do eleitorado de centro- direita e deverá receber o apoio do candidato derrotado do PSC, Flávio Bolsonaro, filho do deputado federal Jair Bolsonaro (PSC-RJ). Freixo se coloca à esquerda do PT e, no segundo turno, tem a seu lado os candidatos derrotados do PCdoB, Jandira Feghali, e da Rede, Alessandro Molon. O senador foi a favor do impeachment de Dilma Rousseff. O PSOL fez coro à denúncia do “golpe” e ao movimento “Fora, Temer”.
Na disputa pelos votos de candidatos de centro como Pedro Paulo (PMDB), Indio da Costa (PSD) e Carlos Roberto Osório (PSDB), Freixo e Crivella apostam no contato direto com o eleitorado, embora já tenham aberto diálogo com os antigos adversários, à exceção do peemedebista.
Um dos raros pontos em comum entre Freixo e Crivella foi a comemoração por terem derrotado o PMDB e a decisão de não buscar o apoio do partido.
Diálogo. “Nossa avaliação é de que cúpulas partidárias não têm incidência direta sobre o eleitorado.
Nosso programa, nossas propostas envolveram a participação de 5 mil pessoas e finalmente teremos dez minutos por dia (na TV) para apresentálas à população. Freixo está aberto a dialogar, só não dialogamos com Pedro Paulo e os Bolsonaro, porque somos como água é azeite”, disse o deputado federal Chico Alencar (PSOL-RJ).
Sobre temas ligados a comportamento e direitos humanos, o deputado disse que “vai ser bom demarcar posição também nesse campo”. Ele dá um exemplo: “A concepção de família no padrão ocidental e cristão é muito conservadora e não dá conta de uma sociedade como a brasileira e a carioca”.
O vereador reeleito do PRB João Mendes de Jesus, pastor da Universal, disse não ver problemas no debate sobre temas como legalização de droga e aborto. “Os dois candidatos têm posições bem definidas. A população vai decidir. O senador Crivella sustenta suas posições com um grau de conhecimento muito profundo. Mas ele é leve e suave. O que pregamos é que a população fique em paz.” Para o vereador, Crivella terá oportunidade de se apresentar melhor ao eleitorado de classe média que tende a votar em candidatos mais “modernos”.
Jesus afirmou também que, embora o diálogo com a cúpula do PMDB-RJ esteja fechado, acredita que “setores do partido vão caminhar com Crivella”.
“Crivella procurou atacar o PMDB da Lava Jato, mas há um grupo de gente seriíssima.”
Votação
27,8% foi a votação de Marcelo Crivella no primeiro turno.
18,3% foi a votação de Marcelo Freixo.
QUESTÕES
Crivella (PRB)
Estado laico
Bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus (Iurd), Crivella vai nomear religiosos para cargos públicos?
Transportes
O candidato criticou a forma como os BRTs foram criados e fala em licitar o transporte de vans, considerado precário e com domínio de criminosos. Como agiria em relação a essas questões?
Ensino religioso
É ministrado nas escolas públicas da cidade do Rio. Crivella o manteria?
Mulheres
Como seria a relação da prefeitura com as mulheres, que reivindicam mais espaço e direitos?
Câmara
O Legislativo carioca é dominado por vereadores de pouca nitidez ideológica, que se movem por cargos e verbas. O PRB de Crivella tem poucas cadeiras nele. Nesse cenário, como Crivella construiria maioria para seu governo?
Carnaval
É a principal festa popular do Rio, mas é criticada por muitas correntes religiosas. Crivella manteria o apoio da prefeitura ao evento?
LGBT
Como seria a relação do prefeito com essa comunidade, em geral criticada por correntes religiosas fundamentalistas?
Uber
Eduardo Paes sancionou lei contra o aplicativo (cujos motoristas trabalham por decisão da Justiça) e deu mais autonomias para táxis. Crivella manteria essa política?
Guarda municipal
Crivella anunciou que a corporação passaria a ter funções policiais. Como seria essa transição?
Freixo (PSOL)
Governabilidade
O PSOL elegeu apenas seis vereadores e mostra resistência a alianças. Como Freixo daria estabilidade à sua administração?
Vans
O transporte alternativo é importante sobretudo na zona oeste da cidade, mas é, em boa parte, explorado por quadrilhas de milicianos. Como seria a relação da poder público com esses grupos?
Saúde
Paes introduziu as Organizações Sociais, que administram unidades como as Clínicas da Família. Freixo tem se posicionado contra terceirização. O que seria feito?
Camelôs
Com o desemprego, deve crescer a pressão para liberação das ruas para o comércio ambulante. Freixo cederia?
Legado olímpico
Freixo foi um crítico da Olimpíada. O que faria com esse legado?
Movimentos sociais
Freixo tem apoio na área sindical e de movimentos, cujas demandas, muitas vezes, entram em confronto com os limites orçamentários. Esses movimentos participariam do governo?
Governo federal
Freixo diz que o impeachment foi “golpe”. Como conversaria com o presidente Michel Temer?
Professores
A capital fluminense tem um forte movimento sindical de professores públicos, que, com frequência, promovem greves por melhores salários e condições de trabalho. Como Freixo reagiria diante de um movimento desse tipo?
Passarela do samba
Freixo manteria o desfile do Sambódromo sob gestão das escolas, em alguns casos dominadas por bicheiros ou milicianos?
O Estado de São Paulo, n. 44912, 04/10/2016. Política, p.A9