Abstenção é recado a políticos, diz Temer

Rodrigo Cavalheiro e Carla Araújo

04/10/2016

 

 

Em Buenos Aires, presidente comenta sobre resultado de eleição e acrescenta que foi ‘melhor’ para ele ter ‘evitado’ protestos ao votar em SP.

Em sua primeira viagem bilateral a países da América Latina, o presidente Michel Temer afirmou ontem que a abstenção na eleição municipal foi um recado para a classe política em geral. “Não se pode particularizar no partido A ou B. A abstenção foi muito significativa. Portanto, é um recado que se dá à classe política brasileira para que reformule eventuais costumes inadequados”, disse o peemedebista em Buenos Aires, na residência oficial do presidente Mauricio Macri, a quem fez sua primeira visita bilateral desde que assumiu a Presidência.

Sua declaração foi em resposta ao questionamento sobre a possibilidade de a vitória de João Doria (PSDB) em São Paulo fortalecer ou não o projeto presidencial do governador tucano Geraldo Alckmin.

Para Temer, Doria foi ajudado por não se apresentar como político. “O candidato lá de São Paulo foi eleito com uma expressiva margem de votos no primeiro turno, ele dizia a todo momento, com todo o respeito, ‘eu não sou político, sou um empresário, um administrador’. Isso deve ter auxiliado nos votos que obteve.” O presidente ainda avaliou que o País passa por uma crise “a cada 25 ou 30 anos”. “Você até muda a Constituição, cria um novo Estado. No momento, temos uma normalidade democrática e isso não está sendo necessário”, disse ele na coletiva na Quinta de Olivos, residência oficial de Macri.

Segundo o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), a abstenção nas votações de ontem foi de 17,6%, contra os 16,4% registrados em 2012. A maior taxa de não comparecimento às urnas em relação ao tamanho do eleitorado nos últimos 20 anos foi registrada em 1996: 18,3%.

Depois de visitar Macri e antes de decolar para o Paraguai, sua segunda e última agenda na região, Temer disse que o saldo das eleições municipais no Brasil foi “muito positivo para o governo”.

“Os partidos da base do governo tiveram uma vitória esplêndida em todas as capitais, nos municípios todos do Brasil.

Isso fortalece a nossa base parlamentar, especialmente agora que nós temos de aprovar algo que é fundamental para a recuperação do emprego no País, que é a PEC do teto de gastos.” O presidente elogiou a ideia de uma reforma política. 

Participação. Temer comentou que não participou das eleições, justificando que sua base de apoio parlamentar é muito grande e contava com candidatos em várias cidades, sendo que em muitos locais eles concorriam com postulantes do seu partido, o PMDB. “Como presidente, não participei de nenhuma campanha, não saí do meu gabinete, não gravei nenhum vídeo, nem no meu Estado”, afirmou. Já no Paraguai, o presidente voltou a destacar sua “preocupação” com o número de abstenções na eleição de anteontem.

“Acabei de verificar número grande imenso de abstenções, brancos e nulos, o que revela, ouso dizer, a indispensável necessidade de uma reformulação política. Algo que o Congresso vai cuidar com muita propriedade”, disse.

Ao ser indagado se neste novo cenário sua candidatura em 2018 poderia ser cogitada, Temer afirmou que não será candidato.

“(Digo) pela enésima vez.

Minha única preocupação é tentar e colocar o Brasil nos trilhos.Meu sucessor terá mais tranquilidade para conduzir o País.” 

Protestos. O presidente da República foi questionado, na Argentina, sobre se teria fugido de manifestações que estavam programadas contra ele no seu local de votação, em São Paulo. “Realmente há protestos, são naturais numa democracia, principalmente como rescaldo dos últimos acontecimentos que se deram no País. Não me incomodo com eles não. E eu estava programado para votar num determinado horário, mas depois surgiu um compromisso e eu fui votar às 8 horas da manhã.

Mudei o horário. Disseram ‘será que ele quis evitar protestos’? A imprensa estava toda lá, a imprensa registrou. Agora se havia protestos mais tarde e eu evitei, tanto melhor para mim e para a democracia”, afirmou.

Derrotas. O presidente preferiu não comentar o fato de o PMDB ter perdido a eleição no Rio e em São Paulo. “O PMDB tem muita capilaridade”. Seu partido havia conquistado 1.028 prefeituras até a noite de ontem, contra 1.021 na eleição de 2012. Segundo o TSE, faltavam computar ainda resultados de cinco municípios.

Ao lado de Macri, ele comentou que os dois países vizinhos enfrentam problemas parecidos, como o desemprego e o combate à pobreza.

Temer lembrou que o governo enviou ao Congresso a PEC dos gastos e que isso deve dar maior credibilidade ao governo.

“A gente só combate o desemprego com investimento, e quem faz isso é a iniciativa privada.

Temos dito que o poder público não pode fazer tudo por sua conta, se fosse assim, bastaria criar milhões de cargos no serviço público, como parece que aconteceu na Argentina”, comentou em uma crítica velada à antecessora de Macri no cargo, Cristina Kirchner, que é acusada de criar milhões de cargos comissionados na administração pública. 

Comitiva. A comitiva de Temer era integrada pelo ministro das Relações Exteriores, José Serra; da Indústria e Comércio, Marcos Pereira; da Defesa, Raul Julgmann; da Justiça, Alexandre de Moraes; e da Segurança Institucional, Sérgio Etchegoyen. Além deles, também acompanham o presidente quatro parlamentares: os senadores Lasier Martins (PDT-RS) e Zezé Perella (PTBMG) e os deputados Luiz Carlos Heinze (PP-RS) e Roberto Freire (PPS-SP). A chegada de Temer ao Brasil estava prevista para a madrugada de hoje. 

Prefeituras

1.028 prefeituras foram conquistadas pelo PMDB na eleição municipal deste ano no País, até a noite de ontem, contra 1.021 registradas em 2012.

 

O Estado de São Paulo, n. 44912, 04/10/2016. Política, p.A10