Em favor do lobby

 
10/10/2016
Julia Chaib

 

Tema controverso, a prática do lobby ainda não é legalizada no Brasil, por mais que ocorra nos corredores do poder. Recentemente, diferentes iniciativas foram tomadas com o objetivo de regulamentar a atividade, como a retomada da tramitação de um projeto de lei (PL) sobre o tema na Câmara e a apresentação, algumas semanas atrás, de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) pelo senador Romero Jucá (PMDB-RR).

Especialista no assunto, Todd Webster, vice-presidente da Cornerstone Government Affairs, empresa especializada em lobby dos Estados Unidos, defende que a prática “precisa sair das sombras” no Brasil, para que seja possível aprimorar a transparência da política nacional.

“Os cidadãos têm o direito de falar com os que elaboram suas leis. A prática ou o ato de fazer lobby deveriam ser permitidos porque são uma forma de produzir informação e fazer com que ela chegue aos parlamentares. E todo cidadão deveria ter o direito de falar com esse ou aquele deputado”, avalia.

Para Webster, é necessário definir regras para a prática, uma vez que ela já existe, sendo considerada legal ou não. O desafio é chegar a uma normatização que favoreça a transparência, mas não peque pelo excesso de proibições. “Você pode criar muita regulação e forçar os lobistas para as sombras. Não é o que queremos”, adverte. Na medida certa, a regulamentação pode reduzir a corrupção, ao tornar o processo de elaboração das leis mais claro. “Nos Estados Unidos, os lobistas devem dizer quem são os clientes. Pode ser um primeiro passo”, sugere.

Esse é um dos pontos previstos no PL 1202/07, do deputado Carlos Zarattini (PT-SP), uma das propostas de regulamentação do lobby mais debatidas hoje no país. O conteúdo do texto teve sua aprovação recomendada à Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) pela relatora Cristiane Brasil (PTB-RJ), que apresentou um substitutivo ao projeto para eliminar alguns pontos que lhe pareceram conflitantes com a legislação brasileira.

Além do credenciamento dos lobistas, o substitutivo de Brasil prevê medidas como um período de quarentena para que chefes do executivo e servidores públicos possam exercer a função, e a proibição de qualquer tipo de pagamento, doação ou outro tipo de benefício para o legislador.

Além das propostas no parlamento, o governo federal também demonstra interesse no tema. Recentemente, um grupo de trabalho criado pelo ministro da Transparência, Fiscalização e Controle, Torquato Jardim, apresentou um relatório que deve, agora, embasar audiências públicas sobre o assunto.

O estabelecimento de regras para tornar a atividade transparente conta com a simpatia de ministros do Supremo Tribunal Federal (STF). Há algumas semanas, Celso de Mello, o mais antigo membro da Corte, classificou a regulamentação como “necessária”. “A regulamentação legislativa da atividade de lobby representa uma medida extremamente legítima, necessária, porque permite que o desempenho desse ofício se faça à luz do sol, de maneira transparente”, afirmou.

 

Informações

No projeto original, Zarattini, em parte, baseia seus argumentos na experiência de lugares como Inglaterra, México e Estados Unidos. Segundo Webster, há cerca de 10 mil lobistas atuando hoje em Washington, onde a atividade foi regulamentada em 1946 e recebeu atualizações desde então. Segundo ele, esses profissionais são importantes não apenas para defender interesses de determinadas corporações, mas para fornecer informações especializadas sobre certos temas e providenciar aconselhamento e estratégias que facilitem a aprovação de um projeto.

“Como as questões se tornaram muito mais complexas, os formuladores de políticas precisam de especialistas que forneçam informações precisas e confiáveis”, avalia. “É impossível um legislador ser especialista em todos os temas. Ele precisa de mais informações, e uma das fontes são os lobistas”, completa.

 

Correio braziliense, n. 19495, 10/10/2016. Brasil, p. 5