Cardápio econômico no almoço com FHC
 
 
Denise Rothenburg
Julia Chaib
 

Dois dias após a aprovação, em primeiro turno, da proposta de emenda à Constituição (PEC) 241, o presidente Michel Temer foi parabenizado pessoalmente pelo ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, em almoço, ontem, no Palácio do Jaburu. O encontro teve a presença do ministro de Governo, Geddel Vieira Lima, e do presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), Gilmar Mendes. Dominaram a conversa temas como as medidas para recuperar a economia brasileira, a crise, o posicionamento do Brasil na América Latina e a reforma política. FHC também reforçou a necessidade de Temer aprimorar a comunicação do governo.

O almoço durou mais de quatro horas e ocorreu três dias após o Correio publicar uma entrevista exclusiva com FHC, em que o tucano exalta a importância da PEC e aconselha Temer a falar mais sobre as medidas do governo. Inicialmente, Fernando Henrique parabenizou o presidente pela aprovação da emenda constitucional que estipula um teto de crescimento para os gastos públicos atrelado à variação da inflação nos 12 meses anteriores.

FHC aproveitou ainda para alertar o presidente sobre a necessidade de falar muito sobre o que deseja para o país, explicar todos os passos da recuperação econômica. “A população entende quando agimos em prol do bem maior”, disse Fernando Henrique. Eles fizeram ainda uma análise sobre a situação da América Latina, a qual o tucano considera alvissareira, e sobre a necessidade de o Brasil se recuperar economicamente para exercer o papel de liderança do continente. FHC fez ainda uma comparação dos tempos do Plano Real e a situação atual. “Vivi algo semelhante no Real, porém hoje a situação é mais grave, porque mexe com o emprego”, disse Fernando Henrique.

O sistema político também foi tema da conversa. No mesmo dia em que o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, disse em Lisboa que o atual sistema político está “falido”, Temer e Fernando Henrique concluíam que a reforma política é matéria urgente. Sobre o assunto, o presidente do TSE, Gilmar Mendes, fez um balanço das últimas eleições municipais e repetiu a preocupação que já havia manifestado em público, sobre a presença do crime organizado no atual sistema eleitoral. Antes de definir o financiamento das eleições, entretanto, o quarteto considerou que é preciso definir qual será o sistema eleitoral que sairá da reforma política, com ou sem coligações, e voto em lista ou nos candidatos. “Foi uma conversa de velhos amigos”, disse Geddel.

 

“Pinguela”

A conversa foi longa. Na entrevista de domingo, Fernando Henrique lembrou uma frase de Ulysses Guimarães sobre se as conversas haviam sido proveitosas. “Ele sempre dizia que política não se conversa em uma hora”, disse Fernando Henrique ao Correio.

Na entrevista, FHC descreveu o governo como uma “pinguela”, mas ponderou que o Planalto dá passos no sentido de recuperar a confiança até as eleições de 2018. Para o tucano, a aprovação da PEC é justamente um desses passos. O ex-presidente evitou dizer que a medida é igual ao Plano Real adotado em sua época. Para o tucano, a crise econômica enfrentada por Temer é muito pior do que a da época em que chefiava o Estado.

 

Nova moeda

O Plano Real foi lançado em 1994. À época, Fernando Henrique Cardoso era ministro da Fazenda de Itamar Franco, que assumiu após o impeachment de Fernando Collor de Mello. O plano tinha três frentes e visava controlar a inflação exagerada e descontrolada que pairava sobre o Brasil havia 20 anos. Veio a criação do Real e a paridade no câmbio, entre a nova moeda e o dólar, além de cortes de gastos públicos.

 

Correio braziliense, n. 19498, 13/10/2016. Política, p. 2