Valor econômico, v. 17, n. 4142, 30/11/2016. Brasil, p. A4

Votação no STF descriminaliza prática do aborto

Por: Carolina Oms

 

A maioria do ministros da primeira turma do Supremo Tribunal Federal (STF) votou ontem pela descriminalização do aborto ao revogar a prisão preventiva de cinco profissionais de uma clínica ilegal no município de Duque de Caxias, no Estado do Rio de Janeiro. A decisão não é vinculante para casos semelhantes, mas é a primeira vez que o Supremo debate a descriminalização do aborto de maneira abrangente - e não somente em casos de bebê anencéfalos.

Os ministros Roberto Barroso, Rosa Weber e Edson Fachin votaram pela revogação da prisão porque consideraram a criminalização do aborto até o primeiro trimestre incompatível com direitos fundamentais previstos na Constituição.

Segundo Barroso, a criminalização do aborto viola diversos direitos fundamentais da mulher. "Os direitos sexuais e reprodutivos da mulher, que não pode ser obrigada pelo Estado a manter uma gestação indesejada; a autonomia da mulher, que deve conservar o direito de fazer suas escolhas existenciais; a integridade física e psíquica da gestante, que é quem sofre, no seu corpo e no seu psiquismo, os efeitos da gravidez; e a igualdade da mulher, já que homens não engravidam e, portanto, a equiparação plena de gênero depende de se respeitar a vontade da mulher nessa matéria", afirma o voto do ministro Barroso.

Os ministros Marco Aurélio Mello e Luiz Fux votaram somente pela revogação da prisão preventiva com base na ausência de risco para a ordem pública, a ordem econômica, a instrução criminal - sem abordar a questão da criminalização.

Em seu voto, o ministro Barroso afirmou ainda que o impacto da criminalização é maior sobre as mulheres pobres.

"É que o tratamento como crime, dado pela lei penal brasileira, impede que estas mulheres, que não têm acesso a médicos e clínicas privadas, recorram ao sistema público de saúde para se submeterem aos procedimentos cabíveis. Como consequência, multiplicam-se os casos de automutilação, lesões graves e óbitos", disse ele.

A possibilidade de aborto para mulheres infectadas pelo zika deve ser julgada pelo plenário do Supremo, composto por todos os 11 ministros, em dezembro.

A questão foi levada à corte em uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) da Associação Nacional dos Defensores Públicos (Anadep), que questiona as políticas públicas do governo federal na assistência a crianças com microcefalia, malformação provocada pelo vírus.