Valor econômico, v. 17, n. 4136, 22/11/2016. Empresas, p. B5

Estatais seguem onda de montadoras com PDVs

Com crise, desligamento voluntário avança no setor público

Por: Rodrigo Rocha. Colaboraram Edna Simão e Fábio Graner

 

Os programas de desligamento voluntário (PDV) e de incentivo à aposentadoria chegaram com força ao setor público, e prometem levas ainda maiores de demissões na comparação com as que vêm ocorrendo nas montadoras desde 2014. A indústria automobilística chegou a abrir planos para desligar 5,6 mil trabalhadores neste ano. Mas nas negociações fechou 3,3 mil vagas. Entre as estatais, a estimativa é chegar a 56 mil pessoas.

Mesmo considerando a crise que atinge o setor automotivo desde junho de 2014 até outubro a redução da força de trabalho das montadoras beira 30 mil pessoas, segundo dados da Anfavea, quase a metade do alvo dos governos federais e estaduais.

“Nas montadoras, houve o impacto direto da queda de 44,5% na produção de veículos no país entre 2013 e 2015, associado à crise eco- nômica e ao fim dos incentivos de compra”, diz Fernando Mercatto, sócio da GO Associados. “No caso das estatais, tem efeito da crise fiscal, a crise dos Estados tem relação com o aumento de custo de folha. Quando isso estoura, o PDV é uma solução para o problema.”

Desde julho, Petrobras, Eletrobras, Banco do Brasil e Correios, informaram cortes expressivos de pessoal para ajustar suas operações ou lidar com processo de integração das operações. Em alguns casos, até mesmo uma redução da faixa etária do quadro é justificativa para cortes, como defende o comando da Eletrobras.

“Quando uma companhia faz um plano de demissão voluntária, o objetivo é reduzir o custo ao longo do tempo. Como também é natural que a empresa queira ao menos perder menos produtividade em relação ao corte de custos”, afirma Fernando Filho, professor da Fundação Getúlio Vargas.

Os ganhos estimados pelas em- presas variam, mas até mesmo cortes de menor dimensão representam, segundo dizem, economias milionárias. A Cemig, com adesão de 650 funcionários ao PDV, indicou na semana passada que vai evitar R$ 200 milhões em custos em 2017. A Eletrobras estima economia de R$ 1,5 bilhão por ano, com participação de 5,6 mil funcionários, dos 7,5 mil elegíveis para desligamento e aposentadoria. O Banco do Brasil, que vai estimular a aposentadoria de até 18 mil funcionários, prevê ganhos de R$ 3,3 bilhões com a reestruturação.

O governo queria estimular os PDVs para reduzir o número de funcionários e salários nas estatais. Até o início de outubro, a Secretaria de coordenação e Governança das Empresas Estatais (Sest) havia analisado quatro pleitos, sendo um deles já implementado. Outras seis empresas pretendiam fazer pedido à secretaria, de acordo com informações do governo ao Valor .

A intenção é recuperar a capacidade de geração de resultados das estatais como medida para fortalecer o ajuste fiscal. O objetivo não é só ampliar os dividendos a serem distribuídos por essas companhias, mas também evitar necessidade de aportes pelo controlador, o que teria impacto negativo sobre o resultado fiscal.

O custo dos programas também foi um entrave para sua aplicação em momentos anteriores, caso da Infraero, que vem dependendo de apoio do orçamento federal para pagar as indenizações. “Na Infraero, com o processo de concessão dos aeroportos, perdeu-se os maiores geradores de receita, criando um desequilíbrio”, diz Mercatto, da GO.

O professor do departamento de Economia da Universidade de Brasília (UnB), Carlos Alberto Ramos, destaca que apesar do custo alto das indenizações, os PDVs costumam ser vantajosos para as empresas, mas não para a economia. “Do ponto de vista microeconômico isso é interessante. Do ponto de vista macro, o problema é que saem pessoas mais produtivas ou com apetite para o risco.”

Ramos acredita que as empresas perdem mão de obra qualificada nesse tipo de processo, que não será reposta com facilidade na retomada. “Se um engenheiro da Petrobras vai trabalhar em outro lugar a companhia vai ter que formar outro profissional. O impacto é de longo prazo.”

O papel dos sindicatos para adotar os PDVs também é destacado pelos especialistas, devido ao peso político das demissões. Em geral são negociações complica- das ou com risco de greves. Sérgio Nobre, secretário geral da Central Única dos Trabalhadores (CUT), diz que a aplicação de um modelo utilizado na iniciativa privada para empresas com participação governamental é reflexo da mudança de comando no governo federal.

“O setor privado tem volatilidade, tem uma instabilidade muito grande. O setor público não tem oscilação de demanda e quem sai não volta.” O representante sindical criticou o plano divulgado no fim de semana pelo Banco do Brasil, indicando que ele deve precarizar o serviço prestado para a população.