Padilha: Palácio do Planalto é 'local de muita inveja e intriga'

 

01/10/2016
Cristiane Jungblut

 

Em entrevista na capital gaúcha, o ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, disse ontem que o Palácio do Planalto é um local de “inveja e intriga” e que, por isso, o presidente Michel Temer teve de escolher um porta-voz de fora, como o diplomata Alexandre Parola, e não um ministro palaciano. Padilha falou sobre o assunto quando perguntado sobre a comunicação do governo por empresários que participavam de um evento promovido pela revista “Voto”.

Padilha. O ministro disse que críticas à reforma do ensino partem de “privilegiados que não querem largar a boquinha”

— O palácio é um local de muita inveja e intriga. Então, palacianos não podem ser porta-vozes. Temer deu um tiro na mosca (ao escolher um diplomata como porta-voz). Assim, ninguém entrará na área do outro e falará com o presidente antes (de dar declarações públicas). Não tem veto a ninguém, mas ninguém fala do que não é da sua área, ou vai ter bala cruzada — disse Padilha, afirmando que, como ministro da Casa Civil, coordena todas as áreas e assuntos.

 

UNIFICAÇÃO DO DISCURSO

O ministro disse ainda que a adoção de um porta-voz para o governo Temer servirá para “unificar o discurso”. Ao explicar a decisão, Padilha disse que um porta-voz serve para falar as coisas “menos importantes”, e que é o próprio presidente da República quem fala as coisas “importantes”. O governo vem enfrentando problemas de comunicação e há declarações consideradas desastrosas de vários ministros.

— O maior comunicador é o presidente. Ele fala as coisas mais importantes, e as coisas não tão importantes é o porta-voz quem fala. Portanto, teremos alguém que, em nome do governo, vai unificar o discurso na visão do que seja a vontade do presidente — disse Padilha.

Perguntado se a mudança na comunicação do governo significará uma “mordaça” nos ministros depois que o titular da Justiça, Alexandre de Moraes, falou que a Operação Lava-Jato teria novos desdobramentos, Padilha brincou:

— Mordaça? Tanto não tem que estou aqui falando (com os jornalistas).

Apesar de votar em Porto Alegre, Padilha não quis comentar as recentes críticas do candidato a prefeito de seu partido, o PMDB, Sebastião Melo, à edição de uma medida provisória por Temer para tratar da reforma do ensino.

— O governo não tem candidato, tem base de sustentação ampla. O presidente Michel não participou (da campanha), eu também não, com rara exceção apenas para Tramandaí, onde fui prefeito — desconversou Padilha.

O ministro estava à vontade no almoço realizado no British Club. Ao lado de empresários gaúchos que conhece há anos, o ministro falou também sobre a reforma do ensino média, enviada pelo governo para o Congresso através de uma medida provisória, o que gerou críticas.

— Agora tem (a reforma do) o ensino. Está uma gritaria de uns privilegiados que não querem largar a boquinha — disse Padilha.

Em outra passagem, Padilha disse que é papel da oposição ficar “gritando”.

As intrigas dentro do Planalto no início do mandato de Temer têm chamado atenção de quem conhece a cúpula do governo. Participante do núcleo mais próximo do presidente, o secretárioexecutivo do Programa de Concessões, Moreira Franco, estava “escanteado”, fora da Esplanada. Depois de muita intriga de peemedebistas, que o tratavam como se estivesse alijado do poder, Moreira impôs sua presença. Sem o cargo e o status de ministro, mudou-se recentemente de um gabinete distante do Planalto e passou a despachar do gabinete da Vice-Presidência da República, no prédio anexo ao palácio presidencial.

Segundo um auxiliar de Temer, a avaliação de Moreira foi que, sem a mudança, poderia perder espaço cativo para os ministros do palácio, Eliseu Padilha (Casa Civil) e Geddel Vieira Lima (Secretaria de Governo), que também pertencem ao grupo mais próximo do presidente.

Uma das vítimas dos comentários maldosos pelos corredores do Palácio do Planalto é o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes. Em parte porque se tornou muito próximo de Temer, e também porque é considerado arrogante pelos colegas de Esplanada.

Apesar de declarações de Moraes terem desagradado a Temer, o presidente não esconde a simpatia por ele, o que causa certa ciumeira entre os demais ministros. Mais do que respeitar Moraes, que também é advogado, um auxiliar do presidente diz que Temer se vê em Moraes quando era mais jovem.

Outro personagem que se envolveu em intrigas palacianas foi Fábio Medina Osório, que comandou por poucos meses a Advocacia Geral da União (AGU). Insatisfeito com seu desempenho, e também porque Osório teria se deslumbrado com o poder, Temer o demitiu. Antes, fora submetido a fritura interna, o que fez com que saísse do governo acusando Padilha de boicotá-lo.

 

O globo, n. 30371, 01/10/2016. País, p. 18