Efeito Petrobras

Bruno Rosa, Daiane Costa e Juliana Garçon

15/10/2016

 

 

Redução de preços deve aliviar pressão na inflação, e analistas veem corte de juro maior

 

Preços de combustíveis caem pela 1ª vez desde 2009, e ações da estatal sobem até 3,17%. Para ministro da Fazenda, empresa agora tem independência, e tarifas deixaram de ser ‘definidas pelo Executivo’

Diferença pequena. Se reduções forem integralmente repassadas às distribuidoras, Petrobras estima que preços de gasolina e diesel para o consumidor recuem em R$ 0,05

Pela primeira vez em sete anos, a Petrobras anunciou redução de 3,2% no preço da gasolina e de 2,7% no diesel que entrará em vigor hoje. Nas bombas, o valor dos combustíveis deve ficar R$ 0,05 mais baixo. A estatal divulgou também que, na sua nova política, os preços vão variar com mais frequência. Economistas já esperam novas reduções nos próximos meses, já que a gasolina no Brasil ainda está 12% mais cara que no exterior. Com isso, a inflação deve ceder e ficar perto do centro da meta em 2017, que é de 4,5%. E crescem as chances de o BC reduzir a taxa básica de juros na semana que vem. Analistas elogiaram a mudança na estatal, e as ações da empresa subiram até 3,17%. Pela primeira vez em sete anos, a Petrobras anunciou ontem a redução dos preços médios dos combustíveis: de 3,2% para a gasolina e de 2,7% para o diesel. A medida, que entrou em vigor no primeiro minuto de hoje, é reflexo da nova política de preços de combustíveis da estatal. Para alguns economistas, o anúncio reforça as expectativas de um corte, na semana que vem, de 0,5 ponto percentual na taxa básica de juros, a Selic, hoje em 14,25%. Analistas destacam ainda que, como são esperadas novas reduções no preço da gasolina, o índice oficial de inflação do país, medido pelo IPCA, pode convergir para o centro da meta, de 4,5%, no próximo ano.

De acordo com as projeções da Petrobras, se as reduções forem repassadas integralmente ao consumidor pelos revendedores, a queda na bomba será de 1,8% para a gasolina e de 1,4% para o diesel. Em ambos os casos, a estimativa é de um recuo de R$ 0,05 por litro, número que os especialistas do setor consideram pequeno. O presidente da Petrobras, Pedro Parente, explicou ontem, em entrevista coletiva, que a companhia irá avaliar mensalmente os preços dos combustíveis no Brasil, levando em conta as cotações internacionais do petróleo, as margens com a operação, os custos de transporte e a participação de mercado da estatal.

— O objetivo é fazer um ajuste dos preços de forma mais rápida. Vamos ter um comitê que vai avaliar, uma vez por mês, os preços e tomar as decisões para saber se é preciso reduzir ou elevar. Estamos fazendo esse primeiro movimento de redução — explicou Parente.

 

CORTE DE 0,5 PONTO NA SELIC

Carlos Thadeu de Freitas, ex-diretor do Banco Central (BC), acredita que podem ocorrer novos cortes nos preços da gasolina, cujo peso no IPCA, índice oficial de inflação, é de 3,89%. Isso porque, mesmo com a redução anunciada ontem, os preços cobrados pela Petrobras continuarão acima do mercado internacional. Se antes da queda (conforme dados do dia 11, os últimos disponíveis), o valor cobrado da gasolina no país estava 15,9% acima daquele praticado no exterior, agora essa diferença caiu para 12,2%. No caso do diesel, essa margem passou de 28,2% para 24,7%, de acordo com o Centro Brasileiro de Infraestrutura (Cbie). Desde novembro de 2014, os preços no Brasil estão acima dos cobrados lá fora.

— Se considerarmos que esses cortes na gasolina acontecerão, com efeito em outros preços, que as chances de o dólar voltar a se valorizar são menores, devido ao aumento da confiança do mercado sobre a aprovação do ajuste, levando à entrada de mais moeda estrangeira no país, isso alivia a inflação, que já está na boca do gol para ficar em 4,5% ano que vem. Então, está na hora de o Banco Central tirar os olhos do IPCA e colocá-los no crescimento da atividade e da arrecadação. Para isso, não pode insistir em doses homeopáticas, de cortes de 0,25 ponto — disse Freitas, que defende que o BC reduza a Selic em meio ponto percentual nas próximas duas reuniões.

Paulo Gomes, estrategista da gestora Azimut Wealth Management, também passou a ver espaço para um corte de 0,5 ponto percentual no dia 19. Mas ressalta que a redução do preço da gasolina não deve chegar imediatamente às bombas, já que distribuidoras e postos tendem a escoar os estoques pelo custo antigo, mais alto. Outro risco ao repasse imediato do corte de preços ao consumidor é o aumento do álcool anidro, que representa quase um terço (27%) da composição da gasolina, aponta o economista André Braz, responsável pelo monitoramento de preços realizado pelo Ibre/FGV.

— O álcool anidro está em um período de encarecimento por uma questão de safra da canade-açúcar e da valorização do preço do açúcar no mercado internacional, tornando a sua produção mais atraente do que a do álcool. Com menos álcool sendo produzido, ele fica mais caro. Até esses dois efeitos passarem, acredito que só uma parte da redução do preço da gasolina será repassada às bombas. A outra parte pode vir depois — explicou Braz.

Professor do Ibmec e economista da plataforma de investimentos Órama, Alexandre Espírito Santo afirma que a decisão da Petrobras traz a inflação de 2017 para mais perto do centro da meta, de 4,5%. Para a próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), do BC, ele aposta em uma redução de 0,25 ponto percentual da Selic, com um corte de 0,5 ponto percentual em novembro. Para o ano que vem, ele espera uma queda de 3 pontos percentuais nos juros:

— Ajuda na queda dos juros na semana que vem e abre espaço para um IPCA mais próximo do centro da meta em 2017. Gasolina e diesel são importantes, pois afetam frete e transportes.

Alberto Ramos, economista do Goldman Sachs, faz a mesma projeção para a redução da Selic, mas ressalta que a estratégia do BC pode mudar no ano que vem.

— Se os preços continuarem a cair, pode sim dar mais margem para a Selic cair em 2017 — avaliou. — Não vejo isso (a decisão da Petrobras) como uma medida para acelerar o corte da próxima semana para 0,5 ponto percentual.

 

IPCA: PROJEÇÃO PARA 2016 RECUA A 7%

Apesar de alguns analistas associarem o anúncio de ontem da Petrobras à reunião do Copom na próxima semana, Parente fez questão de frisar que a redução dos preços não tem relação com as demandas do governo. Ele citou, por exemplo, a perda de participação no mercado da Petrobras devido ao avanço das importações.

— O objetivo é dar a transparência necessária e que os parceiros entendam que a empresa está operando de acordo com uma liberdade que lhe é assegurada por lei. Não vejo como a redução do preço neste momento, com todas as justificativas, como a questão do market share, possa ser vista como alguma coisa que tenha tido objetivos outros que não o próprio interesse das empresa. Acho que a confiança no acerto dessa politica virá com a sua prática consistente ao longo do tempo — assegurou o presidente da Petrobras.

Parente destacou ainda que não informou o governo sobre a redução.

— Informamos ao Conselho de Administração e ao acionista controlador que estaríamos, proximamente, divulgando uma nova política. E isso foi feito na última reunião do Conselho. Mas, em nenhum dos casos, o valor efetivo da mudança foi informado, nem o percentual nem a direção, se iria aumentar ou cair — acrescentou.

O anúncio da redução do preço da gasolina também reforçou a expectativa de a inflação oficial, medida pelo IPCA, fechar o ano em 7%, segundo Braz, do Ibre/FGV. Ele explica que, a cada 1% de queda no preço da gasolina na bomba, existe um impacto de -0,04 ponto percentual na inflação do mês.

— É um movimento importante e que vai ajudar muito a expectativa de desaceleração da inflação. Antes do IPCA de setembro, que ficou em 0,08%, falávamos de um número perto de 7,5% para o ano. Então, as expectativas recuaram para 7%, e isso reforça ainda mais essa tendência e traz a possibilidade de ficar ainda menor — disse Braz.

 

 

 

O globo, n. 30385, 15/10/2016. Economia, p. 23.